Criatividade de Arco e Flecha
Por Francisco Sampaio de Moraes, Head of Strategy da NIU
Desde muito jovens que aprendemos o impacto “da forma na função”. Se encontramos num jardim um galho com o comprimento certo e peso perfeito, instantaneamente criamos uma enorme batalha medieval onde o galho se torna uma espada digna de um rei ou de um conto de fadas onde perseguimos uma princesa na nossa vassoura da bruxa má. De um ramo passa a uma ferramenta, de uma “coisa” passa a um momento. Momento onde a forma representa a função e onde a função é pura emoção.
O mercado dos eventos pode ser equiparado a este exemplo. Neste, que é um palco de emoções, experiências e memórias, o conteúdo é o actor que detém uma narrativa. Este é o segredo: as estratégias de marketing não são um abstraccionismo, mas uma identidade. O que é oferecido não é um simples conjunto de informações, mas uma história e não apenas uma transacção comercial, mas experiências e emoções, memórias que nos acompanham. Acima de tudo eventos são criatividade, o ecossistema onde reside a inovação.
É imperativo garantir que se traduzem numa relação que nos torna parte de algo, de um propósito maior. Só isto permitirá garantir a diferenciação. A verdade é que há muito que os eventos são uma estratégia, uma garantia de fidelização do cliente, por isso não podemos cair na tentação de tipificá-los. De facto, não existe uma fórmula única: transformar “coisas” em momentos.
Para isto, pensemos no caso do arquitecto Thomas Heatherwick, criador de projectos como o recente Vessel e a Little Island em NY, os novos autocarros de Londres ou o complexo de habitação 1000 Trees em Shangai. Em 2012 foi desafiado para desenhar o caldeirão onde a chama Olímpica iria arder na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Londres. À partida o processo foi relativamente simples: encontrar relatos, vídeos ou fotografias de todos os 29 Jogos Olímpicos de Verão e os 24 Jogos Olímpicos de Inverno e perceber como criar um novo caminho para um destino claro: ser um momento memorável. Resultados? Em média, nos últimos anos os Jogos Olímpicos são vistos por mais de 3 biliões de pessoas, desde a cerimónia de abertura até à última prova. Mas, o mais interessante no processo de pesquisa foi encontrar alguém que se recorde. Biliões vibram com as Olimpíadas mas não se lembram. Veem, mas não respondem. Até que encontraram uma acção que se tornou numa memória e na qual “uma coisa” virou um momento!
Viajemos no tempo. É 1992 e estamos em Barcelona. Antonio Rebollo, tem um arco e uma flecha. A mais de 70 metros de distância, o atleta paraolímpico dispara uma seta em chamas por cima de milhares de espectadores em direcção a um caldeirão inundado de gás. Especulação. Emoção. Acerta? Acertou! Um galho a arder para dentro de um balde gigante.
Retomamos 2023. Aqui, onde a humanização e as emoções são a chama dos eventos e onde a criatividade desempenha o desafio olímpico de criar, inventar e transformar salas em naves espaciais, stands em palácios, festas em festivais. Aproximar a forma das mensagens das marcas em funções práticas e interactivas, momentos de comunicação onde a forma representa a função e onde a função é pura emoção. O desafio é, ainda que desafiante, relativamente simples: garantir a criatividade dos eventos. Para isto só precisamos de dois ingredientes: um arco e uma flecha.
O perfeito equilíbrio entre precisão na execução e ousar estimular o que é já conhecido que garante a transparência e a vivacidade tão requerida nos eventos. Da próxima vez que presenciar um evento questione-se sobre a narrativa que está a ser construída e de que forma contribui para a criação de uma experiência mais aliciante. Rapidamente perceberá que nada é mais intrinsecamente humano do que a capacidade de criar conexões impactantes nas nossas interacções.