As Ideias dos Outros

Por Marcelo Lourenço, fundador e director Criativo da Coming Soon

Sempre me espanta a leviandade com que dizem esta frase perigosíssima: “Precisamos de uma campanha de rebrand.”

Claro, há marcas que realmente precisam se renovar – porque o negócio mudou, porque o público evoluiu, porque perderam relevância e precisam mesmo comunicar de outra maneira.

O que me corta o coração é ver marcas com história, com uma relação emocional com o público, com slogans que fazem parte da cultura popular e, de repente, o novo CEO, o departamento de Marketing ou simplesmente alguém muito chato e muito preocupado em mostrar serviço convence toda a gente que está tudo errado com a marca.

E deixamos cair clássicos da nossa publicidade e os substituímos pelo tipo de letra da moda, pelas cores que toda a gente está a usar este ano ou pelo logotipo que “funciona muito melhor no digital”.

Isso não acontece com a Coca-Cola.

Não acontece com a Nike.

Ou com o Ikea.

E quando acontece com o Burger King é para fazer um retro rebranding e voltar ao logotipo dos anos 60 – que era melhor do que todos os rebrands que vieram a seguir.

Não sei quantas vezes recebi uma sala cheia de olhares de lado quando fiz a mais simples das perguntas: “Querem mesmo matar essa assinatura? Mas ela é óptima.”

Há uma cena na série “After Life” que me ajudou a perceber porque passo a vida a defender assinaturas criadas por outros publicitários. Na série, o personagem interpretado por Ricky Gervais é um viúvo que está sempre a visitar a campa da sua falecida mulher. Lá, acaba ficando amigo de uma senhora, também viúva que, numa das suas muitas conversas, diz-lhe algo sensacional: a felicidade é uma coisa maravilhosa – é tão maravilhosa que nem precisa ser a sua.

Penso a mesma coisa sobre um grande slogan: é uma coisa tão maravilhosa que nem precisa ter sido criado por mim. E é meu dever sagrado tentar defendê-lo. E entristece-me ver tantas marcas e tantas assinaturas geniais deitadas ao lixo simplesmente porque “precisamos de algo mais fresco”.

O meu cartoon na revista Marketeer deste mês era sobre isso e este texto também o seria. Então li a notícia de que a WPP decidiu acabar com as marcas JWT e Y&R – ícones da nossa indústria – e fundi-las sob a sigla VLM (que eu ainda nem aprendi a pronunciar).

O que é ironicamente triste: se nós, agências, não conseguimos perceber o valor das nossas próprias marcas, como é que vamos convencer os clientes a dar o devido valor às marcas deles?

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