António Mexia «Por que é que a EDP apoia a cultura?»

Não são só números que espelham a performance de uma companhia. Na EDP acredita-se que o investimento na promoção da arte e cultura também melhora a sua imagem e reputação. Contundente, António Mexia defende que esta é mesmo uma das vias para a elevação de todo um País.

Texto de M.ª João Vieira Pinto, em Londres

Esta não é uma entrevista sobre performance financeira ou alinhamento empresarial. É uma entrevista de estratégia. Ou de ambição! Da relação da EDP com as artes, com a cultura.

Num momento em que a energética portuguesa se prepara para enfrentar um dos seus piores anos dos últimos tempos, o seu CEO António Mexia mantém-se indelével no apoio a diferentes manifestações culturais. Acredita que é importante um cruzamento entre negócios, ciência e cultura para energizar a sociedade, Portugal e os portugueses.

«Estamos a ajudar a mostrar que também temos, de facto, alguns nomes que são referência na arte, na arquitectura, no design. E isso é relevante para a nossa própria marca», confessa António Mexia, que não esconde o facto de ser um dos principais impulsionadores das diferentes iniciativas que a companhia tem em curso. Desde a contratação dos arquitectos Siza Vieira e Souto Moura para projectos em barragens – além de outros Pritzker Prizes -, até ao apoio a Joana Vasconcelos para expor em Versailles, ou a Pedro Cabrita Reis na londrina Tate Gallery. Passando, ainda, pelo Prémio Jovens Artistas, ou pela iniciativa de arte pública em barragens. «A EDP tem uma visão global de apoio à cultura. Acreditamos que é uma das formas de poder tornar as coisas melhores», esclarece.

E este será um trabalho que se irá pautar, sempre, por uma fasquia elevada. Uma das vias, acredita António Mexia, de elevar a sociedade. É que, conforme advoga o CEO da EDP, «o principal risco que Portugal corre é o da mediocridade», pelo que «é preciso que se passe este conceito, que é o de controlar o nosso próprio destino. O que implica que saibamos que isso se consegue com trabalho, com poupança, com investimento, criação de riqueza e energia».

Uma entrevista em Londres, depois da apresentação a jornalistas, stakeholders, investidores e artistas, de todo o projecto da EDP para as artes e, em particular, do apoio à exposição de Pedro Cabrita Reis, que estará patente numa sala da Tate Gallery ao longo do próximo ano.

Há um ano a EDP teve a sua marca no Louvre. Em Julho apoiou a exposição de Joana Vasconcelos em Versailles. Agora apresenta-se como mecenas da exposição de Pedro Cabrita Reis na Tate, em Londres. Pode-se falar num percurso de humanização da marca?

A EDP é a marca portuguesa mais valiosa e das companhias portuguesas com melhor reputação, não só em Portugal como a nível mundial, e temos a consciência de que a nossa dimensão e liderança nos dão a responsabilidade de fazer ainda mais e melhor. Eu, pessoalmente, e a instituição como um todo compreendemos esta obrigação de relacionar a economia, a sociedade, a cultura, a arte, a ciência… É nessa mistura que conseguimos ajudar a tornar as instituições e as sociedades mais inteligentes.

A exposição de Pedro Cabrita Reis na Tate, que tem o nosso apoio, tem a duração de ano e meio. E estamos a falar de alguém que hoje é indiscutivelmente reconhecido a nível internacional.

Aconteceu o mesmo em Versailles, com o nosso apoio a Joana Vasconcelos, que foi a primeira mulher portuguesa de um universo muito restrito a ser convidada.

Mas acontece ainda o mesmo quando somos a única empresa do mundo a fazer um circuito de arte pública em barragens. Ou quando somos a primeira empresa que decidiu fazer as casas de máquinas das novas barragens só com Pritzker Prizes. Portugal tem dois – Siza Vieira e Souto Moura – e vamos convidar outros que não são portugueses.

Porquê? Porque um investimento deste género muda por completo a qualidade do projecto e a sua perenidade. Isto são coisas que irão perdurar, pelo que é importante que este seja um legado relevante do ponto de vista económico, que seja uma referência na engenharia, que contribua para uma economia mais competitiva, mas que também tenha a vertente de qualificação do território.

Em que âmbito surge toda esta estratégia de apoio à cultura?

Surge de alguns inputs e da relação próxima entre a empresa e a fundação. Quisemos descobrir projectos que marcassem a diferença. No caso da Tate fomos abordados pela galeria e pelo próprio artista mas, o que é facto, é que a exposição excedeu as nossas expectativas – pelo impacto, pela localização no próprio museu e por estar patente durante um ano e meio.

Mas é verdade que temos sempre tentado o nível mais elevado. Não queremos nunca fazer nada que seja mediano. Aliás, o principal risco que Portugal corre é o da mediocridade.

É preciso que se passe este conceito, que é o de controlar o nosso próprio destino. O que implica que saibamos que isso se consegue com trabalho, poupança, investimento, criação de riqueza e energia.

Não receia ser mal compreendido?

Não receio de todo. A nossa determinação sobre aquilo que é fundamental é grande…

… mas todos estes projectos implicam um investimento relevante!

Mas estes investimentos têm um enorme retorno e o que deve ser conhecido é que é um investimento feito pelos accionistas da EDP, que não tem nada a ver com os clientes EDP.

São os accionistas que permitem à companhia ter esta abordagem ambiciosa e holística, e não tenhamos dúvidas que o principal benefício é para a sociedade portuguesa. É importante para Portugal ter um Mourinho ou ter um Ronaldo, mas também é importante ter um Siza Vieira ou um Souto Moura, um Cabrita Reis ou uma Joana Vasconcelos. São, todos eles, activos portugueses e é bom que saibamos dar-lhes visibilidade.

Os outros países fazem-no. Outras companhias que não são portuguesas fazem-no. Seria uma irresponsabilidade não o fazer.

Já disse que no próximo ano a EDP vai cortar alguns investimentos. Não será então nesta área?

Portugal como um todo tem que fazer mais com menos. E tudo isto tem que ver com a forma como se desenvolvem ideias. As melhores ideias são, por vezes, as que conseguem um maior impacto com menos dinheiro, menos investimento.

A eficiência na gestão de custos é fundamental. Tem que se conseguir alavancar o que se vai fazendo e torná-lo visível. É tempo de juntar pragmatismo e ambição…

Ambição nunca lhe faltou!

Isso é verdade. O que me faltou foi pragmatismo. O equilíbrio entre ambição e pragmatismo em doses adequadas e ajustadas aos recursos é que faz avançar a gestão.

Estar parado não serve para nada.

E ambição era algo que tinha para a marca EDP. Já conseguiu elevar a marca ao patamar que pretendia?

Na exposição de Pedro Cabrita Reis, na Tate, conseguimos reunir accionistas, investidores, artistas. Isso mostra que as pessoas percebem que conseguimos ter uma visão de valor a prazo de forma sustentável. Hoje, a EDP é reconhecida em todo o mundo, mesmo onde não temos projectos.

Quando desenvolvemos um projecto para as Nações Unidas, com energias renováveis no campo de refugiados de Kakuma, no Quénia, fomos parceiros de um mesmo nível que uma Microsoft. Isso, sendo algo distintivo, é bom para Portugal.

Com os projectos das barragens conseguimos que, em pequenas terras, se crie esperança com empreendedorismo social. No último ano em Alfândega da Fé houve mais projectos, com o apoio da EDP, do que nos últimos 15.

Tudo isto cria mais oportunidades, mais opções. A obrigação das empresas e das instituições é criar mais riqueza, mais oportunidades e é isso que temos vindo a fazer.

Todas as outras áreas que a EDP tem vindo a patrocinar, como a música, vão-se manter? Não se irá mexer nos patrocínios?

Hoje em dia, por exemplo, é fundamental o Ciclo de Piano que temos na Casa da Música. Neste momento não haveria bailado em Portugal se não fosse o apoio da EDP. O prémio Jovens Artistas manter-se-á; o prémio Consagração de Artistas, que muitas vezes consagra carreiras menos óbvias, também. Tal como se mantém o apoio a tudo o que sejam projectos com qualidade.

A única coisa que revemos sempre é o nível de qualidade.

Se percebemos que aquilo que apoiámos não tinha qualidade ou que não teve o efeito que queríamos, saímos. Porque é esse o nível de exigência que nos impõem e que nós exigimos para todas as áreas.

É expectável ver a EDP a ajudar a exportar artistas portugueses para os diferentes mercados onde está?

Tal como somos a primeira companhia portuguesa a fazer um road show na China e no Brasil com os nossos parceiros industriais, também queremos dar visibilidade internacional a artistas portugueses. E, nomeadamente, já apresentámos à China Three Gorges o projecto da fundação, dos museus, dos artistas e a reacção é interessante.

2013 vai ser um ano difícil para a EDP. Mantém as previsões adiantadas em Maio?

Desde 2006-2007, será eventualmente o nosso ano mais exigente. Devido à junção de várias coisas, como a alteração da regulação, uma maior carga fiscal… O esforço adicional que é pedido às grandes companhias fará com que seja um ano difícil. Além disso, os grandes projectos que estamos a fazer ainda não entrarão para o ano mas provavelmente só em 2014 ou 2015. Para já, as previsões mantêm-se!

(Recorde-se que a EDP admitiu vir a rever em baixa o plano de negócios em curso, ao ponto de cortar o investimento previsto de dois mil milhões de euros por ano até 2015, dependendo muito da forma como correr 2013 em termos de redução da dívida e do défice tarifário.)

Que mudanças serão introduzidas para enfrentar essa dificuldade?

Em Maio apresentámos o nosso plano até 2015. Os números são claros, os objectivos estão traçados. Houve uma grande clarificação das regras de jogo e uma mudança muito clara no nosso acesso ao mercado de capitais. Nos últimos três meses conseguimos levantar no mercado mais de 3 mil milhões de euros, o que muda radicalmente a capacidade de execução desse plano. Ou seja, queremos regras mais claras em Portugal, Espanha, Brasil. E visibilidade em entregar em tempo e em custos os nossos projectos.

Nos últimos três anos fomos provavelmente a utility eléctrica europeia que melhor entregou, do ponto de vista daquilo que eram as expectativas, e muitas vezes excedemos mesmo as perspectivas do consenso do mercado.

Houve muita gente que nos últimos anos reviu em baixa as suas previsões de 2010 para 2011 em 40, 50 ou 60%. Nós estamos apenas 2-3% abaixo daquilo que se previa há dois anos.

Somos um caso único!

Um percurso recheado

Licenciado em Economia pela Universidade de Genève (1980), onde foi assistente do Departamento de Economia, António Mexia foi professor no curso de Pós-Graduação em Estudos Europeus na Universidade Católica e regente na Universidade Nova e na Universidade Católica, que administrou entre 1982 e 1995. Foi adjunto do secretário de Estado do Comércio Externo, entre 1986 e 1988, e, entre 1988 e 1990, vice-presidente do CA do ICEP – Instituto do Comércio Externo. Entre 1990 e 1998 foi administrador do Banco Espírito Santo de Investimentos e, em 1998, nomeado presidente do CA da Gás de Portugal e da Transgás. Em 2000 integrou a Galp Energia como vice-presidente do CA e em 2001 e 2004 assumiu funções de presidente executivo da Galp Energia e presidente dos CA da Petrogal, Gás de Portugal, Transgás e Transgás-Atlântico.

Já em 2004 foi nomeado ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações do XVI Governo Constitucional. Foi ainda presidente da APE – Associação Portuguesa de Energia (1999-2002), membro da Comissão Trilateral (1992-1998), vice-presidente da AIP – Associação Industrial Portuguesa, presidente do Conselho-Geral da Ambelis, bem como representante do Governo português junto da União Europeia no grupo de trabalho para o desenvolvimento das redes transeuropeias.

É presidente do Conselho de Administração da EDP desde 2005.

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