Amazon diz ter atingido objectivo climático 7 anos antes do previsto. Será mesmo assim?

A Amazon divulgou que toda a electricidade que usou no ano passado provinha de fontes que não produziam emissões de gases com efeito de estufa. Contudo, há quem critique o método utilizado pela empresa para fazer essa determinação, considerando-o demasiado brando.

Na divulgação, a Amazon avança ter atingido o seu objectivo de 100% de energia limpa sete anos antes do previsto. A empresa afirmou ter investido milhares de milhões de dólares em mais de 500 projectos solares e eólicos, cuja energia gerada é equivalente à electricidade consumida pelos centros de dados, edifícios corporativos, mercearias e centros de distribuição da empresa em 27 países. Mas como nem todos os parques solares e eólicos alimentam directamente as operações da Amazon – a maior parte dessa energia é enviada para as redes de electricidade que servem muitas empresas e residências -, alguns críticos dizem que os cálculos da empresa podem criar uma impressão enganadora do seu efeito no clima.

Segundo a empresa, os projectos de energia limpa em que a Amazon investiu podem produzir electricidade suficiente para abastecer o equivalente a 7,6 milhões de casas nos EUA. A Amazon pretende atingir emissões líquidas, zero de carbono, em todas as suas operações, incluindo as carrinhas de entrega, aviões e outros meios de transporte, até 2040.

“Estamos muito entusiasmados, obviamente, com o objectivo que estabelecemos há cinco anos e com o facto de o termos alcançado sete anos antes”, assume Kara Hurst, vice-presidente de sustentabilidade mundial da Amazon, citada pelo The New York Times.

Há muito tempo que a Amazon, e outras empresas tecnológicas, afirmam pretender eliminar o efeito de aquecimento do planeta das suas operações. Porém, recentemente, essas promessas foram postas em causa pelas decisões da indústria em investir fortemente na inteligência artificial. Tudo porque esta ferramenta consome grandes quantidades de energia através da utilização de centros de dados.

Os ambientalistas receiam que o aumento da procura de electricidade por parte dos centros de dados, dos automóveis eléctricos e das bombas de calor possa levar as empresas do sector a dependerem mais das centrais eléctricas a gás natural. Deste modo, não conseguirão construir fontes de energia limpa, linhas de transmissão e outras infra-estruturas com a rapidez necessária.

Um grande centro de dados pode consumir tanta energia como a produzida por uma pequena central eléctrica que serve cerca de 100 mil casas.

De acordo com o The New York Times, as empresas tecnológicas afirmam que estão a trabalhar para aumentar a utilização de energias renováveis, de modo a dar resposta às necessidades energéticas da inteligência artificial. No mês passado, a Google afirmou que tinha celebrado um acordo com a empresa de serviços públicos Berkshire Hathaway, no Nevada, para alimentar os seus centros de dados com energia geotérmica. O gigante da tecnologia disse, no último relatório ambiental, que as suas emissões de gases com efeito de estufa aumentaram 13%, em 2023, em relação ao ano anterior, com o aumento das exigências da I.A.

Os especialistas revelam que o acordo da Google com a Berkshire Hathaway e os investimentos da Microsoft, Amazon e outras empresas em novos projectos de energia renovável serão necessários para reduzir a dependência mundial de gás natural e outros combustíveis fósseis.

A Amazon recebeu uma nota “B” do CDP, um grupo sem fins lucrativos que gere um sistema global de divulgação para investidores, empresas, cidades, estados e regiões gerirem o seu impacto ambiental. Já a Google e a Microsoft receberam a classificação “A” e foram elogiadas pelo empenho na energia limpa e por serem transparentes quanto à forma como estão a trabalhar para atingir os objectivos climáticos.

Um grupo que se intitula Amazon Employees for Climate Justice criticou a empresa por aquilo que os seus membros consideram ser a utilização da contabilidade e do marketing para fazer boa figura. Numa carta de 2019 para Jeff Bezos, presidente executivo da empresa, e durante um protesto no ano passado fora da sede da Amazon, o grupo, composto por milhares de funcionários da Amazon, já tinha levantado preocupações à empresa sobre as suas políticas climáticas.

“Como funcionários da Amazon, estamos frustrados porque a liderança da Amazon está a enganar o público ao distorcer a verdade sobre suas reivindicações de energia renovável”, disse o grupo num comunicado sobre o anúncio da empresa na quarta-feira. “A Amazon quer que pensemos nos seus centros de dados como estando rodeados por parques eólicos e solares, mas a realidade é que a empresa está a investir fortemente em expansões de centros de dados alimentados por carvão, da Virgínia Ocidental, petróleo, a Arábia Saudita e gás fraccionado canadiano”.

Nenhuma empresa ligada a uma rede eléctrica pode saber com certeza que utiliza apenas energia limpa, se alguma das centrais eléctricas da rede queimar combustíveis fósseis. As empresas podem tentar orientar a sua utilização quando recursos, como a energia solar ou eólica, fornecem grande parte da electricidade da rede em determinadas alturas do dia, como ao meio-dia ou à noite.

Consequentemente, para atingir 100% de energia limpa – pelo menos no papel – as empresas compram frequentemente os chamados certificados de energia renovável a um proprietário de um parque solar ou eólico. Ao comprar créditos suficientes para igualar ou exceder a energia que as suas operações utilizam, uma empresa pode afirmar que a sua actividade é inteiramente alimentada por energia limpa.

Num relatório publicado pelo grupo de funcionários da Amazon após o anúncio da empresa, os trabalhadores afirmaram que a sua investigação concluiu que, após deduzir a utilização de créditos por parte da empresa, o investimento real em energia limpa era apenas uma fracção do que foi publicitado.

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