Advertising is what you can get away with?
Por José Godinho Marques, director Criativo da Tux&Gill
“Art is what you can get away with”, dizia o Andy Warhol. De certa forma, noutros tempos, a nossa actividade já terá sido elevada a essa condição de arte. Porque cada peça era mesmo um original, a partir de uma folha branca e uma cabeça limpa, qual aventura num quarto de hotel 5 estrelas imaculado. Não existiam inspirações estratégicas, referências ou outras ajudas para criar uma nova campanha. Existia criatividade e fé na eficácia. Apenas. E não é que às vezes dava certo? Deste processo, gostava de realçar a bravura de quem escrevia os jingles. Sim, uma peça candidata à eternidade, qual tatuagem no pavilhão auricular de cada um de nós. O jingle era bom. E julgo que ainda “É bom, é bom é”.
O jingle transportava-nos para as paisagens das marcas. De pudins ou sabonetes. Paisagens sonoras que nos acompanham até hoje, como a do “Feno de Portugal, aroma da natureza”. Ou outros aromas que diziam “Olá, cá estou eu, o Brise Contínuo”, na voz do Herman. O comediante não-hipster, do barbeado perfeito: “Sentes-te bem, estás sempre bem, queres ganhar. Vamos te ajudar, até à perfeição. De pai para filho, é a nossa tradição.” Deve usar Gillettes, esse Herman que deu novas cores ao humor nacional. Provavelmente, usou “Stucomat, uma grande tinta, Stucomat é Robbialac” (tive o enorme prazer de trabalhar com o autor deste jingle, o João Taveira).
E, por falar em tinta, quantos jingles não terão saído de uma “bic laranja da escrita fina” ou de uma “bic cristal da escrita normal?”. Muitos e bons, neste bom sabor da selva de agências onde surgiram. Quem não gosta de trautear um “ananás-alperce-e-manga, laranja-maçã-goiaba, banana-maracujá, imagina o que isto dá”? Sempre que ouvimos um bom jingle, “a vida sorri” (acabámos de criar uma comemoração para os 60 anos desta marca do coração, a Olá, na minha agência).
Million dollar question: e coragem para voltarmos a criar jingles que resistam ao tempo? Impermeáveis a rugas ou anti-corpos? Trauteáveis daqui a 20 anos? Todos fazemos campanhas bonitas, com clichés hipsterizados, a reboque da tendência e da referência. Ganhámos medo. Da rima, do piroso bonito, do amor na costura da palavra. Eu sinto saudades desse escape. Dessa arte pop. E, vocês, sentem?