A irrealidade das marcas portuguesas

Por João Pedro Batista, co-fundador da Social Animals

Quem olha para a grande maioria da comunicação das marcas portuguesas em online e offline fica com a ideia de que o maior problema dos 70% dos portugueses que se encontram em casa é o ócio e não o COVID-19. Marketeers e agências (muitas delas por oportunismo, outras por receio de perderem os seus clientes), sentem que os seus conteúdos são a única salvação para manter a saúde física e mental dos portugueses em “alta”.

Esta total irrealidade em que estas marcas vivem, contrasta com o facto de a grande maioria da população portuguesa se encontrar em regime de teletrabalho – com o mesmo horário laboral, sendo que às 8 horas de trabalho se junta o facto de terem de cuidar da família, fazer refeições, limpar a casa e uma infinidade de coisas que qualquer um de nós tem que fazer em confinamento. Como é fácil de entender, no mundo real, as pessoas não têm tempo para consumirem os milhares de lives, desafios diários, dicas e soluções que marcas/influencers publicam diariamente para “aligeirar” esta difícil situação.

Comunicar de uma forma eficiente em tempos de crise é sinónimo de olhar para a situação social e para as necessidades da população pois, acima de tudo, os portugueses precisam de que as marcas voltem a ser marcas. Isto significa que cabe a elas fazer aquilo que as autoridades políticas (independentemente de partidos) têm pedido à população – fazer o país continuar activo. Ou seja, criar soluções para que os níveis de consumo se mantenham, facilitando as compras a partir de casa, ajudando os serviços médicos e tornando bens indispensáveis mais baratos.

Não quer isto dizer que as marcas devam abandonar as estratégias focadas em awareness e apostar unicamente em vendas. O importante é dosear estas duas vertentes da comunicação da mesma forma que o faziam antes. É também óbvio que as estratégias de comunicação devem ser adaptadas à nova realidade física e social em que vivemos, da mesma forma que dicas e conteúdos de entretenimento são bem vindos – só não podem constituir 100% da comunicação das marcas.

Resumindo, aquilo que se pede neste momento é que as estratégias criadas de forma apressada sobre grandes doses de pressão sejam repensadas e que se direccione todos os esforços para criar uma sensação de normalidade junto da opinião pública. Afinal, por muito difícil que seja, esta excepção será a normalidade durante muito tempo.

Por fim, gostava de agradecer ao Edson Athayde – pessoa que desconheço pessoalmente – por ter sido o primeiro a, publicamente, pedir calma às marcas. Ao fim de tantos anos continua a manter a lucidez de comunicação que tanta falta faz à maioria dos actores deste mercado.

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