A insustentabilidade da sustentabilidade
Por João Pedro Reis, head of Commercial Development da Sogrape, estudante programa doutoral Marketing e Estratégia U. Aveiro, U. Minho e U. Beira Interior
Estudos dos últimos 10 anos junto de consumidores de vinhos demonstram repetidamente os mesmos resultados: os consumidores aparentam estar disponíveis para pagar um premium por produtos mais sustentáveis. Uma pesquisa de 2024, com consumidores portugueses, revela a mesma oportunidade. Existe, no entanto, um enorme problema: como é que um consumidor identifica o que é ou não é sustentável?
Uma pesquisa rápida de eco-labels ou logos de sustentabilidade resulta num rol sem fim de diferentes nomenclaturas, ícones, muitos deles alegando superioridade sobre outras certificações. De tal forma que é até possível encontrar uma “tabela periódica” da sustentabilidade que inclui ícones tão distintos como a certificação vegan, passando pela flor ecológica da União Europeia (de 1992), o símbolo do orgânico (de 2010) e ainda o “pouco consumer-friendly” ISO 14001 e o robusto cradle-to-cradle (fonte: The Sustainability Agency).
Haver entidades que exploram vertentes alternativas do que é ser sustentável é um sinal positivo de que abordagens distintas são desenvolvidas e comparadas. A própria noção de sustentabilidade evoluiu muito nas últimas décadas. No mundo dos vinhos, por exemplo, até 2010, ser sustentável era “sinónimo” de ser biológico na União Europeia e fair labour em países em desenvolvimento por conta da justa remuneração dos trabalhadores. Hoje, sabe-se que o biológico, sendo uma alternativa importante, não tem o melhor dos impactos em muitas regiões, porque o cobre em excesso contamina as águas e deixa vilas inteiras sem água potável e é na União Europeia que os agricultores (não só da viticultura) reclamam remuneração justa e concorrência leal com outras regiões.
No caso do vinho, a sua prateleira já é das mais complexas para consumidores. Inúmeras opções, designações, estilos, castas, regiões que até a maioria dos ditos connoisseurs desconhece. Quão sustentável é que, em cima disso, se acrescente a complexidade de dezenas de logos de sustentabilidade, todos eles advogando ser a “última bolacha do planeta”?
As soluções
Portugal fez um importante esforço, ainda que com quase três décadas de atraso quando comparado com a Nova Zelândia, ao lançar, em 2023, a sua certificação de sustentabilidade nacional, que envolve não só a vertente ambiental, mas também a vertente social, económica e a de melhoria contínua. Este esforço vai concorrer contra outras certificações no mercado, como a certificação dos Vinhos do Alentejo, do vinho biológico, do vinho natural ou até a da agricultura regenerativa, uma tendência recente. Porque não enquadrar, dentro da certificação de sustentabilidade nacional, diferentes abordagens? Por exemplo: Certificação Sustentável – Abordagem Biológica ou Certificação Sustentável – Abordagem Natural. Isto permitiria tanto ao consumidor menos conhecedor como ao mais informado ter a informação necessária para a sua decisão de compra.
Produtores, retalhistas e decisores políticos podem e devem atuar. No lado dos produtores, qual será a primeira região de vinhos portuguesa a ter a coragem de exigir aos seus produtores e depois afirmar que todos os vinhos com a sua designação de origem têm certificação sustentável, facilitando a vida ao consumidor e utilizando esse argumento na promoção dos seus produtos? No lado dos retalhistas, porque não criar secções de vinhos sustentáveis, expandido algumas prateleiras que já incluem algumas das categorias mencionadas (biológico, natural) para terem a uma definição mais holística?
E no lado dos decisores políticos, porque não ir um passo mais além: regular no sentido de que os produtores que não tenham certificação de sustentabilidade (constantes de uma lista que poderá ser curada com associações de cariz ambiental e social) incluam nos seus rótulos: produtor ou produto sem certificação de sustentabilidade.
O investimento das empresas que implementam práticas mais sustentáveis e monitorizam o seu impacto representa o “custo da sustentabilidade” e tende a pesar cada vez mais nas contas e carga de recursos. Os dados indicam que pode haver um “premium” que compense total ou parcialmente esse custo. Mas é fundamental que as empresas que não se certificam tenham um “custo da insustentabilidade” e isso seja evidente para o consumidor na hora da decisão. Porque um planeta mais sustentável constrói-se nas pequenas decisões, todos os dias.
Dados adicionais
Numa pesquisa no âmbito do Programa Doutoral em Marketing e Estratégia, 150 consumidores portugueses de vinho branco consultados acerca de alternativas de claims de sustentabilidade em várias opções de preços diferentes, resultaram os seguintes insights:
- Em 44% das ocasiões, os consumidores preferiram opções mais caras (entre 20-50%) devido a um claim de sustentabilidade mais atrativo;
- Dessas, em mais de 66% indicaram como melhor um de três: “Certificado Sustentável”, “Natural” e “Orgânico”;
- Dessas, em mais de 60% indicaram como pior um de três: “Garrafa Pesada”, “Garrafa Leve” e “Fair Trade”.