Não existe nada pior do que sentir que não pertencemos
Por João Cardoso, Brand strategist no erb’s creative studio
A História levou-nos da época das características técnicas à das experiências de utilização e benefícios emocionais. É importante que olhemos para essas épocas não como períodos passageiros, mas como marcos na evolução da disciplina que hoje reconhecemos como branding.
As especificações técnicas de um produto continuam a ser relevantes, elas desempenham um papel importante para que o consumidor não se sinta defraudado com a compra. As experiências de utilização envolvem o consumidor no meio onde foram aplicadas e os benefícios emocionais despertam emoções que nos ligam a momentos e criam memórias. Quer queiramos, quer não, estes pontos continuarão a ser utilizados como argumentos concorrenciais e não tem mal nenhum, mas o consumidor de hoje procura mais.
Invertemos o curso da História na decisão de compra. As características técnicas são agora um ponto secundário ou até terciário no processo de tomada de decisão.
Valorizamos mais a forma como o produto ou a marca nos faz sentir do que propriamente se está na vanguarda em termos técnicos. Se tivéssemos uma marca que conseguisse unir os dois seria perfeito, mas isso é um tema para outra hora.
A relação da marca com o consumidor está, para o autor Kevin Keller, no topo da pirâmide de Brand Equity. Este é um dos pontos mais cobiçados, o ex-libris da marca, onde entra a lealdade e a comunidade que tanto ambicionamos. Onde falamos de amor, envolvimento activo e, mais importante, sentimento de pertença.
O início de uma relação começa pelo reconhecimento, passa para o envolvimento numa determinada experiência, para um despertar de sensações e emoções e, inevitavelmente, acabaremos por sentir alguma coisa. De uma forma básica, esse sentimento pode ser amor, repulsa ou indiferença.
Analisando os três com mais pormenor, o amor é o sentimento mais valioso e, portanto, o mais difícil de alcançar. As marcas que o conseguirem atingir e mantiverem arrisco-me a dizer que é provável que venham para ficar, mas não devemos esquecer é que até o melhor casamento pode acabar e, por isso, é preciso que este sentimento seja alimentado. A repulsa é relativamente simples e rápida de conseguir. Por consequência, também é o sentimento que ninguém quer.
E a indiferença é o mais perigoso de todos! Resulta da inabilidade de alcançarmos um dos outros dois. Como diria a professora Julia Cameron, é aquele que leva o nosso sensor interior a dizer-nos que somos tão maus que não chegámos sequer a chatear alguém. Não é esse o sentimento que queremos, de todo!
É de notar que, para a maioria dos consumidores, a hierarquia das necessidades de Maslow está muito próxima de ser totalmente preenchida. Muitas vezes, o elemento que falta é um intangível sentimento de pertença. E é isso que as nossas marcas têm de procurar proporcionar. É esse sentimento que vai comprar às marcas o que John Hegarty, fundador de uma agência que recruta ovelhas negras, diz ser a peça de imobiliário mais valiosa do mundo: um lugar na mente do consumidor (para entender o contexto desta ovelha negra, pode querer visitar bartleboglehegarty.com).
O despertar deste sentimento não é da responsabilidade da força de vendas, muito menos da tradicional equipa de marketing. É algo que tem de ser verdadeiro e de certa forma perpetuado, portanto não pode nascer apenas de disciplinas que se focam maioritariamente em dados objectivos, resultados imediatos e que olham para os consumidores como um target em vez de pessoas com desejos, necessidades e vidas reais.
Recorrendo a Neumeier para explicar este ponto, qualquer esforço para captar clientes é marketing e qualquer esforço para captar clientes e mantê-los é branding. E, como diria Simon Sinek, esse é o caminho para as empresas com uma visão infinita. Precisamos de incentivar uma participação activa.
Os consumidores precisam de sentir que pertencem a um grupo, a uma tribo, uma família onde a marca é o brasão, o símbolo que os une e os identifica.
Se preferir resumir este texto e um bom bocado da história das marcas, P.J. Pereira, Creative chairman na Pereira & O’Dell, diz-nos para pensarmos como um marketeer, nos comportarmos como um entertainer e nos movermos como uma startup tecnológica.
Poderá ser esta uma boa chave no caminho para o sucesso das nossas marcas? A óptica de um marketeer dá-nos força de venda, a de um entertainer cria uma ligação emocional com o nosso público e a de uma startup tecnológica obriga-nos a crescer rápido e a não parar de inovar.
Não sei quanto a si, mas a mim parece-me bem!
Terminamos assim. Sabe aqueles amigos do WhatsApp que nunca lhe respondem às mensagens e fazem com que queira sair do grupo por não ser ouvido? A si nem faz muito mal, mas a sua marca não pode fazê-lo ao consumidor.