Do metaverso

Tiago Viegas
Partner da The Hotel
tiago.viegas@thehotel.pt

Os mais atentos saberão que o metaverso – ou metaverse, no original, nome sonante e ligeiramente pedante, mais ainda se lido com um sotaque very british – é a nova buzzword do métier.

Obviamente, não é o meu caso. Mas acontece que este ano fui, pela primeira vez, ao Web Summit (sim, sou muito provinciano e demorei três anos até decidir passar por lá), e não se falava noutra coisa. Pelo que, inspiradíssimo, achei por bem variar um pouco e, em vez de passar dois mil e tal caracteres a dizer mal das coisas como elas são, decidi antes dizer mal das coisas como elas hão-de (em princípio) ser.

Sempre inova qualquer coisa, apesar de tudo.

Enfim, antes que me esqueça e para os mais desatentos: o metaverso é o brinquedo novo do Facebook (desculpem, daquela meta em que o Facebook agora se tornou), que fica ali algures entre o Second Life, os personagens do Wii Sports e o Kinect da Xbox, mas tudo com um complexo de Zoom mal resolvido. Não?

Experimentem assim: é uma sala de conferências virtual, num universo gráfico alternativo, habitado por avatares animados com detecção de movimentos – excepto as pernas, que não percebi bem porquê.

Uma espécie de Ready Player One paraplégico, mas em mau.

Também não?

Bom, é ir ao Google, que eu estou a ficar sem referências e tenho mais que escrever, apesar de tudo.

Feitas as apresentações, importa dizer que não tenho nenhum problema de maior com o metaverso propriamente dito: para já, parece-me meio inútil e relativamente mal parecido, mas não me admirava se daqui a seis meses não soubesse viver sem aquilo.

Tenho um problema, isso sim, com tudo aquilo que está por detrás (e à volta, e à frente) do metaverso: que é como quem diz, as inteligências artificiais, as ferramentas de automatização, os content managers responsivos e todos os demais automatismos que, mais tarde ou mais cedo, ditarão a morte das agências como as conhecemos hoje e, claro está, dos criativos que nelas habitam.

E digo que tenho um problema não por achar, como a maioria dos meus pares, que uma boa ideia terá sempre mercado, e que as máquinas nunca conseguirão contar histórias como nós, e mais todas as coisas que os velhos (e novos) do Restelo adoram repetir sempre que se juntam para fazer festinhas aos egos um dos outros (vulgo, festivais) – mas antes por ter, cada vez mais, a convicção de que, mesmo que com menor qualidade criativa (um conceito muito discutível, mas ainda assim), o futuro passa, mesmo, por aí.

E se acham que estou a exagerar, olhem para os anúncios que andámos todos a escrever durante o confinamento e digam lá se não podia ter sido uma máquina a escrevê-los e editá-los.

Aqui há uns tempos (não muitos), houve uma agência de meios que me apresentou um metaverso qualquer, no caso um software/plataforma/algoritmo que conseguia, em tempo real, reeditar um anúncio por forma a ir optimizando o impacto da sequência de imagens junto dos consumidores.

Pronto, não podia ter diálogo, não convinha ter uma narrativa e não podia ter uma cronologia, senão não funcionava. Mas, de resto, lá estava ele.

E pese embora os anúncios que dali saíam fossem todos – enfim – uma meta, a verdade é que, bem ou mal, lá acabavam por vender.

Sem agências. Sem mais custos. E sem chatices (as agências são muito chatas, dizem – por mim falo, de resto, que sou um chato do caraças).

Sem grande força e sem ideias, é certo, mas também sem o risco que essas ideias representam (quem nunca fez um anúncio que mais parecia dinheiro deitado à rua, que atire a primeira pedra).

É, se quiserem, uma questão de custo- benefício, na qual o benefício acaba sempre por ganhar. Por pouco, tipo o Sporting do Rúben Amorim, mas a ganhar.

Notem que não estou a dizer que este é um mundo melhor, pelo contrário – é um mundo muito mais aborrecido e onde eu não tenho emprego. Mas basta um passeio pelo Web Summit para perceber que, entre automatismos, algoritmos e conteúdos que já são, eles próprios, ferramentas de marketing (cortando assim o intermediário entre as marcas e os consumidores – vulgo, os anúncios), é para lá que caminhamos.

O que, no fim do dia, é uma bela meta. Mas é o que é.

Artigo publicado na edição n.º 304 de Novembro de 2021

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