Sabe o que acontece sempre que usa um filtro? Dove lança campanha contra a manipulação digital

Duas em cada três raparigas, em Portugal, tentam editar pelo menos um aspecto do seu corpo antes de publicarem uma fotografia nas redes sociais. O número é apontado pela Dove na sua mais recente campanha, através da qual apela a uma beleza sem manipulação digital em mais de 30 países.

Ao contrário do que acontecia há cerca de uma década, a manipulação digital – através do Photoshop, por exemplo – já não é exclusiva do mundo profissional e das grandes indústrias. Com a ascensão das redes sociais, passou a estar ao alcance de qualquer pessoa e a proliferação de imagens vistas como perfeitas aumenta a pressão, especialmente junto dos mais jovens.

A nova campanha, sob o mote “Selfie Invertida” em Portugal, coloca o foco nesta mudança de paradigma e alerta para as consequências negativas que os filtros, por exemplo, podem ter na autoestima dos utilizadores das redes sociais: um estudo realizado no mercado português mostra que 76% das raparigas com 13 anos usa filtros ou recorre a aplicações para mudar a sua aparência nas fotografias. Em média, têm 12 anos quando usam este tipo de funcionalidades pela primeira vez.

Com isto em mente, a Dove criou o guia “Crescer com Confiança”, destinado a pais e educadores para que possam ajudar os jovens a desenvolver o amor próprio necessário para atingirem o seu máximo potencial. Elaborado em parceria com o Center for Appearance Research da University of West England, está validado a nível académico, segundo adianta a Dove, e tem efeitos comprovados.

Sofia Bargiela, responsável de Dove Portugal, conta à Marketeer que é importante que os adultos estejam envolvidos, «pois são, por norma, as referências dos mais novos». Quando os próprios pais recriminam determinados tipos de beleza ou optam por manipular a sua imagem, «deverão ter consciência de que essas referências serão absorvidas pelos mais novos, que reproduzirão o discurso e os comportamentos».

Acompanhe a entrevista a Sofia Bargiela:

A beleza real tem sido um pilar da comunicação da Dove. Estava na hora de falar também sobre o tema em termos digitais?

A Beleza Real está no ADN de Dove desde 2004. O nosso propósito é que todas as mulheres tenham uma experiência de beleza positiva, o que passa por a beleza ser uma fonte de confiança e não de ansiedade. Somos uma marca que não recorre à distorção digital nas suas campanhas e há 15 anos fomos pioneiros na chamada de atenção para o uso excessivo de ferramentas de edição de imagem (como o Photoshop) no mundo da moda e da publicidade, quando lançámos a campanha “Evolution”. Nessa altura, as redes sociais ainda não faziam parte das nossas vidas, por isso, o apelo era sobretudo direccionado às grandes indústrias, para que tomassem consciência da sua responsabilidade na construção de ideais de beleza estereotipados e pouco realistas, transmitidos nas suas comunicações em revistas, televisão, outdoors, etc.

Hoje, o debate é mais alargado, precisamente porque se estende às redes sociais. Actualmente, para manipularmos a nossa imagem, já não precisamos de saber utilizar o Photoshop, pois estão disponíveis aplicações muito intuitivas, que qualquer pessoa aprende facilmente a manusear. As próprias redes sociais colocam-nos à disposição um sem número de filtros que nos permitem esconder todas as nossas imperfeições e até melhorar a nossa aparência: alisamos a pele, aumentamos os lábios, esticamos as pestanas, afinamos o nariz ou modificamos o cabelo. Tudo isto acontece no digital, por isso, é claro que os temas da autoestima e da beleza surgem associados a esse canal.

Além disso, se pensarmos: onde estão os jovens? A resposta conduz-nos, uma vez mais, ao digital. As novas gerações nasceram envolvidas no universo do Instagram, Facebook, TikTok e YouTube, que são palco da sua expressão, e a pandemia veio aumentar o tempo passado nas redes sociais. Sabemos que 86% das raparigas em Portugal utiliza as redes sociais, e que 70% passa ainda mais tempo nestas plataformas devido à pandemia. Por isso, além dos temas que temos vindo a abordar com o Projecto pela Autoestima de Dove, que tem como missão que as próximas gerações cresçam com uma relação positiva com o seu corpo para atingirem o seu máximo potencial, vamos agora abordar esta temática, cujo impacto na autoestima das próximas gerações pode ser tão prejudicial.

Na nova campanha, colocam o foco nos mais jovens. São os mais afectados? Como olham para este tema em relação às restantes gerações?

A nossa autoestima e autoconfiança vão-se construindo ao longo da vida e a adolescência é uma fase de grandes mudanças, em que é fundamental que os jovens cresçam com as ferramentas certas para se tornarem adultos confiantes. Um jovem com baixa autoestima facilmente se converte num adulto com baixa autoestima. Efectivamente, através de um estudo que realizámos em 2019, descobrimos que 73% das raparigas dos 10 aos 17 anos não tem autoestima elevada, sendo este valor de 71% nas mulheres dos 18 aos 64 anos. Por isso, existe naturalmente uma correlação entre estas realidades.

Sobre as redes sociais, o nosso mais recente estudo mostra-nos o impacto que a sua utilização pelas jovens, muitas vezes com recurso a manipulação digital da imagem, tem nos comportamentos e quotidiano. Se, por um lado, as redes sociais são um espaço que fomenta a autoexpressão e a criatividade dos jovens; por outro, a utilização excessiva de filtros para corresponder a padrões de beleza irrealistas, deturpam a realidade e criam uma falsa autoconfiança, que poderá levar a problemas de autoestima. Efectivamente, duas em cada três raparigas tentam editar ou esconder pelo menos uma característica do seu corpo antes de publicarem uma fotografia de si mesmas.

Sabemos ainda que 67% das raparigas gostaria que a beleza fosse retratada de uma forma mais representativa nas redes sociais e que, se assim o fosse, levaria a que se sentissem menos julgadas (63%) e preocupadas (64%) com a sua aparência.

É importante que os pais e educadores tenham esta consciência, pois são, por norma, as referências dos mais novos. Ao terem comportamentos de autocrítica em relação ao próprio corpo, utilizarem filtros de manipulação de imagem, ou recriminarem determinados tipos de beleza, deverão ter consciência de que essas referências serão absorvidas pelos mais novos, que reproduzirão o discurso e os comportamentos.

Por isso, desenvolvemos uma série de conteúdos para que pais e educadores trabalhem com os filhos ou jovens estas e outras questões, que são tão importantes na construção de autoestima, tais como as pressões sociais, o impacto dos media, o bullying, ou a utilização de redes sociais de forma mais saudável e positiva.

Em que consistirá a campanha “Selfie Invertida” a nível global? E que expressão terá em Portugal?

O vídeo de lançamento da campanha retrata o processo de uma jovem ao tirar uma selfie, desde a sua preparação à sua publicação. Mostra-nos este processo levado a um extremo, precisamente para sensibilizar para a realidade. Através do nosso mais recente estudo, “Detoxify Beauty”, sabemos que as jovens portuguesas entre os 10 e os 17 anos tiram, em média, nove fotografias antes de publicarem e que 45% demora mais de 10 minutos a preparar-se para a fotografia. Parte da preparação inclui arranjarem o cabelo, maquilharem-se ou vestirem um outfit específico. Uma vez escolhida a fotografia, normalmente com a aprovação prévia de uma amiga, 64% das raparigas tenta modificar pelo menos uma parte do corpo antes de publicar, normalmente a cara, o cabelo, a pele, a barriga ou o nariz.

A campanha “Reverse Selfie” – ou, em português, “Selfie Invertida” – será hoje anunciada a nível global, no Dove Summit: #BehindTheFilter, um evento digital que acontecerá simultaneamente em mais de 30 países. Para este evento convidámos jornalistas e influenciadores digitais para assistirem a uma série de talks relevantes e inspiradoras e que servirão para lançar o debate de como estão as redes sociais, através dos padrões irrealistas de beleza, a afectar a autoestima das próximas gerações, bem como as pressões sociais sobre as mulheres. Contaremos com oradoras de renome internacional, como Shonda Rhimes, produtora de televisão mundialmente conhecida pelas séries “Anatomia de Grey”, “Scandal” ou “Bridgerton”; Megan Crabbe, voz activa do empoderamento feminino e influenciadora; e, ainda, Nyome Nicholas-Williams, modelo plus-size.

A campanha viverá em vários canais: televisão, digital, incluindo redes sociais, e nos pontos de venda. Além disso, desenvolvemos um kit para influenciadoras, em parceria com a Fujifilm, marca que convidámos a juntar-se à nossa causa, dado o alinhamento do seu produto com a nossa mensagem: ao contrário das câmaras fotográficas dos telemóveis, as máquinas analógicas da Instax não permitem a manipulação digital e são um meio para capturarmos momentos reais e sem filtros. Organicamente, cerca de 30 influenciadoras já começaram a dar eco à campanha.

Mas vêm aí mais novidades: a psicóloga Filipa Jardim da Silva, especialista na temática do empoderamento feminino, será a mediadora de um conjunto de lives no Instagram, estando à conversa com algumas influenciadoras sobre o impacto dos filtros na autoestima, com o objectivo de incentivar a conversação em tempo real com a sua comunidade de seguidores. O estudo “Detoxify Beauty” mostrou-nos que 59% das jovens gostava que as influenciadoras publicassem fotografias mais representativas da beleza feminina e que fossem as primeiras a dar o exemplo, por isso acreditamos que faz todo o sentido incluí-las no debate.

Além disso, vamos também chegar às agências de influenciadores através de um manifesto por uma #BelezaSemFiltros e #SemManipulaçãoDigital. O nosso objectivo é dar o pontapé de saída para um verdadeiro movimento orgânico nas redes sociais, em particular no Instagram, incentivando a publicação de fotografias sem manipulação. Para isso, foi inclusivamente criado um filtro próprio da campanha que será disponibilizado em breve e que, naturalmente, não terá nenhum efeito de distorção.

Esta nova campanha, “Selfie Invertida”, é uma iniciativa do Projecto pela Autoestima de Dove e inclui um novo guia “Crescer com Confiança”, para que pais e educadores possam ajudar os jovens a desenvolver a autoestima necessária para que possam atingir o seu máximo potencial.

Este guia foi criado em parceria com o Center for Appearance Research da University of West England e está validado academicamente com efeitos comprovados na melhoria da autoestima dos jovens. O objectivo do Projecto pela Autoestima de Dove é educar 250 milhões de crianças para a autoestima em todo o mundo até 2030, por isso, estão disponíveis gratuitamente online uma série de ferramentas pedagógicas para que educadores possam trabalhar estas questões junto dos jovens. Estas incluem artigos, workshops e actividades didácticas, que ajudam as crianças e jovens a abordar várias questões pertinentes na adolescência, tais como as pressões sociais, o impacto dos media, provocações e bullying, bem como a utilizarem as redes sociais de forma mais saudável e positiva.

Quais são as principais dificuldades em abordar um tema como este?

Todos os temas que envolvem uma mudança de mentalidade e atitude são sempre altamente desafiantes. Nas últimas décadas, dos meios de comunicação às agências de publicidade, criaram-se conceitos de beleza irrealistas e o Photoshop substituiu a beleza real. Mas se há uns anos este era um problema criado pela indústria, actualmente é fomentado e alimentado por todos nós e, apesar de a maioria das pessoas concordar com os perigos associados a este tema e a urgência de os travar, muitas delas continua a recorrer a estes filtros e aplicações de edição de imagem. Mais do que consciencializar, é importante agir, e, como todos sabemos, não há nada mais desafiante do que alterar padrões de comportamento.

É preciso que tanto a indústria como, individualmente, cada um de nós, reflicta sobre estas questões, compreenda o impacto que os nossos comportamentos têm, não só em nós, como nos outros, e, sobretudo, nas gerações mais novas.

Qual é o retorno esperado da campanha?

Em Portugal, o programa estreou-se em 2020, tendo sido já impactados cerca de 50 mil jovens, dos quais 10 mil em escolas, através da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Este ano, Dove pretende chegar a mais de 100.000 jovens em Portugal, através, não só do workshop escolar, como também divulgando e disponibilizando nas nossas plataformas online os conteúdos referidos para pais e educadores.

Além disso, teremos uma campanha no ponto de venda, em que disponibilizaremos mini livros com actividades para fazer entre pais e filhos, com o objectivo de melhorar a sua autoestima. Até agora, Dove impactou positivamente a vida de mais de 69 milhões de jovens em 150 países, de todo o mundo.

Texto de Filipa Almeida

Artigos relacionados