A importância da música no desenvolvimento das crianças
Helena Lima, assessora da direcção da Escola de Música do Conservatório e coordenadora executiva da Orquestra Geração, explica a importância da música no desenvolvimento cognitivo das crianças e os seus principais benefícios.
A música influencia o desenvolvimento cognitivo das crianças? Se sim, de que forma?
Sim, sem dúvida. A música desenvolve elevadas competências cognitivas e há imensos estudos que o comprovam. A audição de música, e em especial a prática musical, activa múltiplas áreas cerebrais em simultâneo, em especial o córtex motor, visual e auditivo, criando ligações entre os dois hemisférios de uma forma muito mais rápida. Estimula assim o desenvolvimento linguístico, matemático, mas também motor, criativo e emocional de forma integrada, com benefícios para todas as áreas da aprendizagem, pelo que quanto mais cedo essa prática tiver lugar, maiores e mais sustentáveis serão esses benefícios.
A audição é o primeiro sentido a desenvolver- se, por volta do quarto mês de gestação, sendo o primeiro a ligar-nos ao mundo exterior – o bater do coração da mãe, a sua voz, os seus sons fisiológicos que se alteram ao longo do dia. John Blacking, um distinto etnomusicólogo, já falecido, dizia uma frase lindíssima – “antes de os homens organizarem os sons, já os sons organizavam os homens” – que resume brilhantemente os fundamentos sociais e biológicos da música.
Quais os benefícios que a música traz à criança?
Uma formação integrada, que estimula o desenvolvimento cognitivo, motor, relacional, social e emocional. Favorece também a concentração e a auto-regulação, para além do sentido crítico e do pensamento divergente, essenciais a uma adaptação cada vez mais exigente ao mundo actual em veloz transformação. A música é um acontecimento universal – está presente em todas as culturas e, se é verdade que é contextual, também existem padrões que são comuns a todas elas, ultrapassando contextos religiosos, geográficos e culturais. Isto diz muito da importância que a música desempenha ao longo de séculos na formulação das culturas humanas. A música liga gerações, é uma ponte fundamental na comunicação humana ultrapassando barreiras de todos os tipos.
Em particular, a música de conjunto sincroniza as nossas acções e emoções, torna-nos parte de um contexto, faz-nos ouvir os outros e sermos ouvidos, contribui para a coesão social, integra-nos e acolhe- nos, um sentimento essencial ao desenvolvimento de qualquer criança e que contribui enormemente para o seu crescimento e bem-estar, físico e emocional.
Qual o impacto que a música tem na sua coordenação motora e consciência corporal?
Ritmo é movimento. Movimento é orientação e deslocação no espaço, é tomar consciência do meu espaço e do espaço do outro, do meu corpo e do corpo do outro. Daí que a formação musical nunca deve, nem pode ser separada do movimento, pois são entidades integradas e inseparáveis, que se “auto-informam”. E não há música que não promova movimento corporal, desde um bater do pé, o movimentar de diferentes partes do corpo, de forma mais marcada ou mais fluida, numa relação constante de equilíbrio e desequilíbrio.
Mas a música também provém da acção de corpos em movimento – das cordas vocais do vibrar do ar por acção dos lábios num instrumento de sopro, do batimento entre duas superfícies sólidas ou no friccionar, percutir ou beliscar umas cordas. Tocar um instrumento implica assim o desenvolvimento de uma coordenação motora exigente e de uma motricidade fina, que se afina ao longo de todo o processo de aprendizagem.consciência do meu espaço e do espaço do outro, do meu corpo e do corpo do outro. Daí que a formação musical nunca deve, nem pode ser separada do movimento, pois são entidades integradas e inseparáveis, que se “auto-informam”. E não há música que não promova movimento corporal, desde um bater do pé, o movimentar de diferentes partes do corpo, de forma mais marcada ou mais fluida, numa relação constante de equilíbrio e desequilíbrio. Mas a música também provém da acção de corpos em movimento – das cordas vocais do vibrar do ar por acção dos lábios num instrumento de sopro, do batimento entre duas superfícies sólidas ou no friccionar, percutir ou beliscar umas cordas. Tocar um instrumento implica assim o desenvolvimento de uma coordenação motora exigente e de uma motricidade fina, que se afina ao longo de todo o processo de aprendizagem.
Qual a idade ideal para a criança aprender a tocar um instrumento musical e porquê?
Nunca é tarde para aprender a tocar um instrumento. Temos crianças no projecto com 6 anos, que estão no 1.º ano de escolaridade, mas recebemos sempre de braços abertos crianças e jovens de qualquer idade escolar. Ainda assim, no ano passado expandimos a nossa área de actuação e chegámos aos jardins de infância com o projecto “Orquestra de Afetos”, um projecto, um projecto Partis com o apoio da Fundação Gulbenkian, que pretende contribuir para a melhoria da comunicação e integração no contexto escolar destas crianças. A entrada no jardim de infância é a porta para uma escolaridade mais auspiciosa, sendo uma fase essencial do desenvolvimento da personalidade, que tem de ser ancorada em sentimentos de acolhimento, para se sentirem amadas e protegidas e a música ajuda muito neste processo. São usadas canções, lengalengas, muitos padrões musicais associados ao movimento, bem como objectos sonoros e é ainda proporcionada a audição de música instrumental, ao vivo e gravada, de várias origens e estilos. A presença das educadoras e auxiliares educativas é um aspecto-chave para a sustentabilidade dos resultados, bem como para o sentido de grupo e de partilha – tanto de música como de afectos.
De que forma a música influencia as suas competências sociais e de comunicação?
Mesmo quando feita a solo, a música nunca é uma prática isolada – é sempre música de seres humanos para seres humanos e, no caso da música em conjunto, é ouvirmo-nos uns aos outros e interagirmos, comunicarmos, conectarmo-nos, sermos capazes de nos sincronizar para levar a bom porto a execução de uma peça orquestral. É uma prática cultural, o que significa uma prática social, para levar a bom porto uma sociedade mais livre e plural. Como referi acima, é uma ponte na comunicação: entre avós e netos, pais e filhos, nacionais e estrangeiros. É cidadania em acção, com tudo o que a cidadania implica – viver, crescer e enriquecer-se com e nas diferenças.
Com a educação musical implementada nas escolas, no futuro teremos crianças mais musicais?
Acreditamos que sim, no sentido mais lato mas também mais estrito do termo. Embora a Orquestra Geração não seja uma escola de música, temos casos de alunos que decidiram seguir a música como ramo profissional, receberam bolsas de estudo e estão a estudar em escolas profissionais de música e no ensino superior, estando alguns a terminar já o nível de mestrado.