Tudo na vida é um concurso

susanaalbuquerque2Na abertura da época, e como presidente do Clube de Criativos, tenho que confessar que tenho uma relação de amor/ódio com os festivais.

No seu pior, um Festival de Publicidade é uma feira de vaidades, um íman para criativos egocêntricos, capazes de manipular e inventar trabalho que não existe, subvertendo o negócio para ganhar cinco minutos de palco e uma promoção na carreira. Mas, no seu melhor, um Festival de Publicidade é uma feira de talentos e de mérito, cheio de gente que gosta do que faz e tem orgulho na profissão que escolheu. Detesto tanto os bicos dos pés como a vergonha profissional.

Mas nos festivais, entre jurados, premiados, palestrantes e público, encontro sobretudo gente que não desiste, curiosa e talentosa, inquieta por natureza e insatisfeita por vocação, nerds que, quando muitos dizem que já está bem, acham que ainda se pode fazer melhor. Gente que acha que o trabalho não é só uma coisa chata que nos obriga a ir para o mesmo sítio todos os dias, mas também um entusiasmo que nos pode levar a lugares diferentes em quase todos os projectos.

Os Festivais de Publicidade são os nossos simpósios da ambição criativa. Nas fichas de inscrição, só se preenche o que se conseguiu, não há espaço para preencher o que ficou pelo caminho ou para atribuir responsabilidades aos outros. Não há conferências sobre o queixume, só há apresentações de quem faz e como consegue fazer.

Não há misericórdia com os perdedores, eles tendem a ser invisíveis, o que é uma péssima sensação, a invisibilidade (mais ainda do que não ganhar um prémio). Se ganhas estás em alta, se não ganhas é como se não existisses. Esta awards way of life é orientada para o sucesso (felizmente dura poucos dias por ano), e quando assim é, sabe melhor estar do lado vencedor da barricada. Mesmo assim, até quando regressamos de mãos a abanar, somos contagiados pelos melhores e trazemos para casa uma dose de optimismo e a sensação de que “para o ano sou eu”.

Às vezes zangamo-nos com os festivais porque não concordamos com os critérios, porque não escolheram os nossos trabalhos, porque não reconhecemos o júri, porque é só um negócio, porque não reflectem a realidade do (mau) trabalho que anda na rua, ou apenas porque estamos sem dinheiro para as inscrições. Mas qualquer festival tem o objectivo de premiar o mérito e promover a excelência e esse é um objectivo obviamente bom, mesmo havendo muita gente que não está nem aí para este campeonato. E é um objectivo bom para Portugal. Destes festivais também saem contactos, convites para mostrar e promover o trabalho de cada um noutros países.

Dos festivais de publicidade saem prémios e orgulho próprio, mas também reputação e potencial de negócio. É assim em qualquer país, embora seja mais para uns países do que para outros.

Vim a pensar nisto no regresso de Istambul, onde aconteceu o Festival Intercontinental de Publicidade – The Cup, um festival sem fins lucrativos que agrega o melhor dos melhores no FIAP (ibero-americano), no ADC/E (Art Directors Club of Europe), no Golden Drum (o festival da nova Europa) e no Adfest (o festival da Ásia Pacífico).

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Portugal esteve representado pelos This is Pacifica, vencedores no Festival do CCP e depois no ADC/E. Não saímos de Istambul com prémios, mas que isso não nos faça desistir de ganhar. Somos sempre confrontados com a grandiosidade dos ingleses, franceses, japoneses, alemães e brasileiros, que nos fazem sentir pequeninos.

Mas todos os anos vemos boas ideias de mercados iguais aos nossos serem premiadas pela relevância, pela frescura e pela excelência da execução.

Temos muita gente em Portugal que não desiste, tão boa como os melhores em qualquer parte do mundo, gente que faz bem, relevante e diferente. Temos “uma pequena demonstração” do Escritório para a Microsoft, as janelas de 19 caracteres da TBWA, o Inverno psicológico da JWT para a Sumol, o QR code de calçada portuguesa da Partners, a carta ao Papa da BAR para a Jason, a aldeia global da Havas para a Optimus, a exposição que não deveria existir e o IndieLisboa da Leo Burnett, só para dar exemplos dos últimos meses.

Temos tudo o que é preciso, só nos falta algum dinheiro e vontade de estar ao lado dos melhores do mundo. Como diz e bem a campanha deste ano do FIAP, “Todo en la vida es un concurso. El que no participa, no gana”.

Texto Susana Albuquerque, Creative director da Lintas

Fotografia  Paulo Alexandrino

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