Nomofobia: não é sentir falta, é medo
Por Rodrigo Oliveira, CEO & founder da Zyrgon Network Group
No-Mo-Fobia. Ou seja, No Mobile Fobia. Ou, ainda, fobia de não ter telemóvel. Soa-lhe familiar? O conceito é, relativamente, recente e refere-se ao medo irracional de não se estar conectado através do smartphone de estimação. Quando, no passado dia 4 de Outubro, o mundo se viu privado de Facebook, Instagram e WhatsApp, durante seis horas, para alguns foi libertador, para outros foi prejudicial para os negócios e para demasiados foram seis longas horas tortuosas vividas em ansiedade. Durante o apagão zuckerbergiano, as palavras “ansiedade” e “descontrole” reverberaram por outras redes sociais on, como o Twitter e o TikTok, denunciando um sentimento colectivo, auscultado, sobretudo, nos utilizadores mais jovens. Sintomas inquietantes que se podem enquadrar no espectro de Nomofobia.
Tem ideia de quantas vezes toca no seu telemóvel ao longo do dia? Especialistas estiveram a contar e dizem que, em média, são 2,617 vezes por dia. O número é impressionante, mas, por si só, não nos torna nomofóbicos. Nem o facto de sentirmos falta do telemóvel quando fica sem carga ou nos esquecemos dele em casa – afinal, é o dispositivo que, diariamente, nos liga aos outros e ao conhecimento sem fim. O conceito é complexo, a sua classificação não consensual e o seu sentido desperta muitas interrogações. O que é esta patologia que, à primeira vista, identificamos um pouco em todos nós?
Nomofobia: a desconexão digital que desconecta da vida
Já alguma vez lhe aconteceu ouvir o seu telemóvel e quando se aproxima dele percebe que não está a tocar? Apresento-lhe o “Toque fantasma”. É uma sensação comum em muitas pessoas causada pela expectativa de receber chamadas e mensagens. Os especialistas dizem que até aqui está tudo bem. Quando esta sensação se repete continuamente ao longo do dia, já se caminha pelo campo da Nomofobia. Mas a repetição do “Toque fantasma” não é o único sintoma de dependência do telemóvel.
Segundo a psicóloga Anna Lucia Spear King, coordenadora no Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora do livro “Nomofobia – Dependência do Computador, Internet, Redes Sociais? Dependência do Telefone Celular?”, quando alguém acorda à noite sem mais nenhum motivo que não o de consultar as notificações do telemóvel e não consegue dormir depois; quando não larga o telemóvel em nenhum momento, levando-o para qualquer lugar, mesmo não havendo necessidade dele; quando a concentração e a sociabilização são prejudicadas pela necessidade de estar sempre a olhar para ecrã do telemóvel são sinais da ansiedade provocada pelo medo de ficar desconectado.
King diz-nos que «em cada 100 pessoas, cerca de 15 são consideradas nomofóbicas, com transtornos associados». No seu estudo, a investigadora revela que quando não têm bateria ou o seu telemóvel bem juntinho a si, as pessoas dos 15% revelam sinais de ansiedade, como nervosismo, gestos repetitivos, dispersão visual agitada.
Um pouco por todo o globo, assiste-se ao crescendo deste transtorno que afecta, sobretudo, os mais jovens, as gerações que nunca conheceram a versão analógica do mundo e que são os reis da actividade nos meios digitais, especialmente, nas redes sociais. Enquanto especialistas de várias geografias alertam para o problema da Nomofobia como um transtorno, outros alertam para o problema de generalizar a fobia, reduzindo-a ao medo de ficar sem telemóvel, e de ser misturada com outros tipos de fobias, vícios comportamentais e doenças mentais.
Nesta contemporaneidade digital, o telemóvel e outros dispositivos são o nosso canivete-suíço da comunicação que representam conexão, pertença, aprendizagem e inclusão. Costumo dizer que ainda estamos na fase primitiva desta era digital, o que nos limita a capacidade de lidar com toda a tecnologia que nos chega às mãos diariamente e de perceber, com a distância necessária, o seu grau de influência no nosso comportamento. Há já muitas bandeiras vermelhas na forma desregrada e irreflectida como nos permitimos ser dominados pelos dispositivos digitais e, sem dúvida, a educação digital é algo cada vez mais indispensável. «Devemos aprender a lidar com as tecnologias como um dia nos ensinaram a sentar à mesa e não comer de boca aberta», diz-nos sabiamente a investigadora King.
Enquanto a educação digital se instala, ao seu ritmo, na nossa cultura, podemos sempre tomar a iniciativa de encontrarmos novos hábitos digitais: não dormir com o telemóvel no quarto, por exemplo, nem comer em família com ele em cima sa mesa e, mais ousado ainda, fazer um “detox” digital durante alguns alguns dias. Fica o desafio.