Fazer diferente e apelar à emoção são duas das estratégias que as seguradoras precisam de abraçar como suas, para que as marcas de seguros deixem de ser todas muito iguais aos olhos do cliente. Só assim conseguirão construir marca.
Confirma-se que o ano de 2025 corre de feição às empresas a actuar na área dos seguros e as últimas semanas do ano não deverão alterar a tendência de bons resultados que os meses que as antecederam ditaram.
No entanto, não faltam desafios àqueles que diariamente saltitam entre ramos vida e não vida, procurando ajudar clientes a mitigar riscos. Por exemplo, no sector automóvel há desafios inegáveis que advêm do grande aumento de intensidade e de frequência. «Há um aumento de custos na mão-de-obra e nos custos das peças. Há a questão logística, sobretudo com algumas marcas automóveis, que não têm representação no País, para se conseguir ter as peças. Isso leva a aumentos dos tempos de reparação», escuta-se à mesa do mais recente pequeno-almoço sectorial de seguros, no Hotel Vila Galé Ópera, onde estiveram Inês Simões (Ageas), João Gama (Mapfre), Nazaré Carvalho (Generali Tranquilidade), Raquel Almeida (CA Vida), Rita Leotte (Mudum Seguros) e Sofia Mendes (Verlingue). Situação que leva a que haja impactos que estão a obrigar as seguradoras a fazer alguns acertos nas tarifas, de maneira a tentar garantir a rentabilidade desta área em específico. «Vamos ter de continuar a fazer esse caminho. Para prestarmos um serviço de qualidade aos clientes, temos de garantir gestões equilibradas. E o ramo automóvel é uma âncora do mercado», comentam.
Daí que seja fundamental continuar o trabalho de eficiência que as companhias têm vindo a fazer nos últimos anos, nomeadamente com a utilização de IA. A par disso, importa melhorar a comunicação com os clientes, o que também favorece a regularização. Outra via passa por alargar certos serviços, levando- -os para dentro das companhias, de que podem ser exemplos a criação de ecossistemas com controlo, qualidade… «Isso ajuda a melhorar a proposta de valor para o cliente e para os fornecedores », garante-se no pequeno-almoço.
Nos seguros auto existe a particularidade da existência das seguradoras directas. Em geral são marcas que atraem clientes pelo preço, mas são também as que têm mais rotatividade. «São pessoas que estão sempre à procura de preço.» Aí sabem que não dependem de ninguém, que contratam directamente e que é fácil fazê-lo sem ajuda. «Quando há um sinistro é que podem sentir essa necessidade e, por vezes, é nessas alturas que reconhecem o valor de ter um mediador», escuta-se entre os participantes.
E se, à partida, se poderia supor que eram as gerações mais novas (que não querem gastar muito dinheiro) aquelas que vão às directas, a realidade mostra que nem sempre são os targets mais jovens os que procuram as directas, havendo muitos clientes na casa dos 40 anos também a procurá-las.
«Em seguros onde não é necessário grande aconselhamento, as directas têm maior facilidade de entrar, independentemente da faixa etária.» Aliás, basta ver que a Joana Marques, que será uma jovem na casa dos 40 anos, está associada à Logo.
Mas, no mercado, não faltam vozes a antecipar o fim das seguradoras directas, uma vez que as que não se apresentam como directas permitem, hoje, toda a autonomia a que as primeiras habituaram os clientes no passado. Qualquer cliente pode ir a uma seguradora e subscrever um produto de forma directa, sem precisar de ter um mediador. Hoje, todas as seguradoras estão no mercado de forma directa. Será que basta que um dos grupos seguradores assuma o caminho de fechar a marca da seguradora directa para que os restantes o sigam? O futuro o dirá.
Certo é que há uma diferença entre os ramos vida e não vida no que aos mediadores diz respeito. Dentro do não vida, o automóvel é aquele que as pessoas acham que é mais simples de tratar.
Quanto a outros produtos, muitas vezes os clientes recorrem aos comparadores e ao Doutor Finanças, que os aconselham. São consultores que lhes dão esse aconselhamento relativamente a poupanças e a fundos. Mas os mediadores estão longe de estar fora da equação com as gerações mais novas a procurar os mediadores através da família. «Há um avô ou um pai que tem um mediador e faz o acompanhamento da família.»
INCENTIVAR A POUPANÇA
Entre os participantes neste pequeno-almoço não restam dúvidas de que é de grande importância incentivar a poupança em Portugal, nomeadamente com produtos como os PPR.
Este é o grande desafio do ramo vida para o próximo ano, à semelhança do que já aconteceu em 2025, sendo que, para o alcançar, há que conseguir chegar cada vez mais às pessoas. «No ramo vida é difícil, porque as pessoas não procuram por si, ou seja, não sentem a necessidade. Só pensam que deviam ter contratado quando a coisa já aconteceu», lamentam. Acreditam que o caminho poderá passar por tentar chegar às pessoas de uma forma mais emocional, menos comercial. O eixo será mostrar a importância (e a existência da necessidade) da prevenção, sem estar a vender nada. «Não é fácil, sem ser comercial, fazer esta abordagem», garantem.
As seguradoras precisam, deste modo, de encontrar formas de contacto mais regulares com o cliente actual que têm («estamos a trabalhar muito nessa relação com o cliente») e chegar a potenciais clientes, sendo mais emocionais e apostando muito na literacia.
Aliás, o próprio Estado tem agora um projecto de literacia financeira nas escolas. Mas é preciso fazer muito mais em diversas faixas etárias. Por exemplo, nas universidades ninguém ajuda ninguém a tomar decisões financeiras.
Em abono da verdade, é importante reconhecer que as seguradoras, todas elas, de forma independente, têm um papel bastante activo na literacia. Mas não seria tempo de trabalharem todas juntas nesta causa? Porque, apesar de a APS ter vindo a fazer acções pontuais, deveria haver uma estratégia concertada enquanto sector. Entretanto, continuamos a estar entre os países com a mais baixa literacia financeira. Mas nos seguros, mais do que literacia financeira, devíamos chamar-lhe literacia de risco.
O que as pessoas não percebem é que, actualmente, quem hoje tem depósitos a prazo perde dinheiro. Mas os que têm noção disso perguntam-se: quais é que são as alternativas?
Os responsáveis do sector segurador sublinham que há que procurar pessoas que entendam de produtos financeiros e que os ajudem a fazer investimentos, a diversificar em vários produtos para ter maior rentabilidade. E admitem: «Temos de trabalhar com os nossos mediadores para lhes dar mais know-how e aconselharem, sem receio de se meterem nesse caminho.» Até porque a aposta na formação dos mediadores é uma constante.
E se é verdade que a queda da reputação da banca não terá ajudado a este receio de investimento, é também inegável que, antes dessas derrocadas, os portugueses eram já muito conservadores em termos de investimento. «Os portugueses sempre foram conservadores em termos de investimento. Mas a questão da banca levou as pessoas a retraírem-se ainda mais.»
Mas também os produtos são diferentes, comentando-se entre os presentes que, no passado, havia muitos seguros de capitalização, havendo actualmente muitíssimo menos. «E os que aparecem, rapidamente desaparecem, apesar de as taxas não serem nem de perto as que eram no passado.»
CHEGAR ÀS PESSOAS
Para conseguir chegar às pessoas, as seguradoras têm de perceber que não chega ter só um canal de comunicação. «Temos que ser multidisciplinares, multicanais, ou seja, estar em vários sítios e onde as pessoas estão.» E sim, as pessoas estão em todo o lado, por isso quem quiser chegar a elas tem de estar na rádio, na televisão, nas redes sociais (porque as pessoas estão lá a todas as horas), em festivais (não basta investir num evento, há também que o comunicar)… Ter investimento para isso tudo é que nem sempre é fácil e há que ir gerindo prioridades.
Mas há que colocar o elefante no meio da sala: as seguradoras andam todas a dizer o mesmo, da mesma maneira, e isso faz com que nenhuma se destaque ou mesmo diferencie no momento da procura. Ou seja, a marca acaba por não ser um factor de decisão.
No encontro dos responsáveis de marketing acredita-se que, se conseguirem trabalhar a vertente mais emocional, conseguirão fazer a diferença. «Porque nos seguros estamos a mexer com a vida das pessoas. Tratamos de família, saúde…» Há quem defenda que as seguradoras ainda não conseguiram fazer o twist e transformar-se em lovebrands. «Estamos muito presos a chavões e àqueles que são os objectivos de venda. Temos de conseguir transformar a história de outra forma, trazer uma narrativa e um lado emocional.»
E numa sociedade muito consumista, como aquela em que vivemos, há que perceber que é diferente comunicar estes produtos, que são comprados numa perspectiva de futuro, e outros, mais tangíveis, que são comprados e fazem a pessoa feliz naquele momento.
Mas admitem que estão numa fase em que estão a ser muito desafiados em termos de orçamentos e em que o foco das administrações é vender. «Portanto, é natural que sejamos mais pressionados a fazer acções com resultados imediatos, ou seja, de conversão, em vez de trabalhar a marca a longo prazo, que não dá resultados hoje.» E esse é o tema. Os players dos seguros que estão a trabalhar marca estão a fazê-lo no eixo da urgência e na tentativa de mudar mentalidades e empurrar as pessoas para a acção.
COMUNICAR NAS REDES SOCIAIS
A receita parece ser comum a todas as marcas. Nas redes sociais usa-se o Instagram para chegar aos jovens até aos 50 anos e o Facebook para os que estão entre os 50 e os 80 anos.
Mas há que não esquecer os restantes canais de comunicação. E fazer a comunicação diferente em vários canais representa capacidade de investimento e de ter a comunicação adaptada para cada um desses públicos.
Daí que haja quem tenha colocado grande parte das fichas no futebol, abrangendo as diferentes faixas etárias e ambos os géneros (no passado era muito masculino, hoje já não é assim), estando num ambiente onde se vive emoção e proximidade.
Entre as seguradoras há também as que estão a fazer o caminho da aposta na cultura e nos jovens talentos em diversas artes, como audiovisual, teatro, música, artes circenses, dança… fazendo uma ligação com impacto social.
Seja qual for o caminho, importa ir acompanhando a rentabilidade e resultados com a disponibilidade para conseguir investir em visibilidade e notoriedade de marca, ao mesmo tempo que se fazem outros investimentos em áreas em que as seguradoras não podem deixar de os fazer, como tecnologia e processos.
Até porque, no final do dia, são vários os factores que levam o cliente à decisão de escolha de uma seguradora em detreimento das remanescentes. Até certo ponto a marca influencia, até para o cliente perceber que marcas, das que estão no mercado, vai auscultar. Umas são associadas a serviço, outras a preço… e numa primeira triagem a marca influencia. Mas é inegável que os clientes jogam nessa decisão muito com o factor preço e com outros serviços de conforto que as seguradoras oferecem.
Entre os participantes, lembra-se que quando se escolhe um telemóvel existe uma experiência diária, um histórico; o mesmo acontece quando se escolhe um PC, quando se bebe um café ou quando se vai a um banco (homebanking). Mas, quando se escolhe um seguro, muitas vezes não se tem qualquer referência. E depois, questionam-se, quantas vezes ao longo da anuidade é que a companhia consegue falar/interagir com o cliente de uma forma construtiva e com interesse para o cliente? «Esse é o grande desafio que nós temos.»
Há o momento do sinistro, mas esse é, sempre, um mau momento para o cliente. São raras as marcas que apostam na relação ao longo do ano. Há momentos que poderiam estar a ser trabalhados, de forma personalizada com cada cliente, como dentro do seguro automóvel lembrar a data de pagamento do IUC, dentro do de animais lembrar o pagamento da licença ou uma vacina… E quem procura fazer esse contacto não se tem saído mal com taxas baixíssimas de opt outs e taxas de abertura interessantes.
A questão para não haver mais aposta nessas acções prende- se com os ciclos comerciais das seguradoras. Há objectivos de negócio e de vendas, por ramo. Portanto, há que fazer essas comunicações para clientes e futuros clientes. «Além disso, o mindset interno não está alinhado para aí», confirmam. Está alinhado para os objectivos de negócio. E no final da linha é questionado se não se está a aborrecer o cliente com mais acções. «Estamos todos os meses a comunicar com o cliente que, às tantas, já nem nos pode ouvir. Se pusermos tudo do lado dele – desde a parte de produto, à de literacia e às experiências – é avassalador», desabafa uma das vozes. E acrescenta: «O desafio é encontrar este equilíbrio, alinhar o mindset e conseguir um planeamento que faça sentido na perspectiva do cliente.»
UMA OFERTA ADAPTADA
Criar uma estratégia de posicionamento que envolva produto, serviço, comunicação e eventos pode ser um dos caminhos para acompanhar as alterações sociais que têm vindo a ser sentidas, nomeadamente no que respeita à longevidade. Olhando para a diversidade de produtos para o target acima dos 55 anos e para a diversidade de serviços que eles, se calhar, valorizam mais do que outros targets, há que agregá-los numa oferta de proposta de valor e levá-los, dessa forma, com uma abordagem integrada para a rede de distribuição a apresentar ao cliente actual e a potenciais novos clientes. Esse trabalho, claro está, tem de ser feito em colaboração entre as áreas de marketing e comercial.
Aqui podem ser trabalhados os próprios clientes acima de 55 anos – que são ainda muito quem tomam as decisões sem a interferência dos filhos – ou os filhos que, em casos de pessoas mais velhas, os poderão ajudar a tomar as decisões a este nível. «É também uma questão de literacia, começar nas camadas anteriores e que estas pessoas consigam ter uma influência positiva nos pais e nos irmãos mais velhos.»
A questão das faixas etárias mais velhas não é tanto de comunicação, mas da proposta de valor e da oferta, da adaptação dos modelos de negócio aos negócios existentes e aos novos que estão a surgir. «O nosso desafio, como companhias de seguros, é encontrar as soluções para proteger os novos nichos que estão a aparecer, os novos negócios.» E não esquecer que continua a haver seguros com idade limite à entrada e tempo de permanência. «Temos de os adaptar», admitem.
Um dos produtos que importa desmistificar é o das hipotecas reversas. Não se pode esquecer os desafios que as entidades financeiras e as seguradoras têm nestes produtos. «Quando se começou a falar das hipotecas reversas na Suíça, há 30 anos, as pessoas não viviam 90 anos, como hoje. Financeiramente, agora, fazer os cálculos é muito mais complicado. Antigamente, os cálculos eram para uma perspectiva de 75 anos, agora é de 90», explica uma das vozes à mesa. E acrescenta que o que isso vai fazer é depreciar o valor que a pessoa pode receber ao longo daqueles anos. Mas, em Portugal, ainda há um outro caminho a percorrer antes de chegar aqui, porque a mentalidade reinante continua a ser a de que a casa passa de pais para filhos.
Este artigo faz parte do Caderno Especial “Seguros”, publicado na edição de Novembro (n.º 352) da Marketeer.














