“Black Lies matter” a exposição que apresenta 32 obras na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro
Tem como objetivo retratar e alertar para temas como a escravatura infantil, a vida das crianças-soldado e dos refugiados, o racismo, a pobreza e a exploração extrativista dos recursos do continente africano, bem como apelar a um diálogo e reflexão coletivos, através de 32 obras do artista Rómulo Santa Rita. Falamos da exposição Black Lies Matter, promovida pela Afrikanizm Art – Plataforma de Arte Contemporânea Africana, que acaba de ser inaugurada na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, no Seixal, onde fica patente até ao dia 6 de abril.
Através de uma fusão de meios e materiais, como a colagem, o spray e o papel reciclado, o artista denuncia “a permanente miséria e o desespero das comunidades africanas e a perpetuação da escravatura infantil, que são frequentemente ignorados pelas partes mais privilegiadas do mundo”, explica João Boavida, CEO da Afrikanizm Art e curador da exposição.
“Black Lies Matter destaca as verdades não escolhidas ou as inverdades bem geridas da nossa sociedade. As obras criticam a falta de empatia e a conversa sobre estas questões sociais e culturais, e enfatizam a importância de reconhecermos e abordarmos estas mesmas questões para acabarmos com uma cultura de subjugação e desigualdade”, destaca o curador.
Das 32 obras patentes na exposição, 12 assentam na técnica de mista sobre papel e 20 são mista sobre saco de serapilheira, sendo estas últimas inspiradas no legado do pintor e ceramista Manuel Cargaleiro, em que Rómulo Santa Rita se deixou influenciar pela repetição característica dos azulejos, pela estética do mosaico e pela força visual criada por padrões contínuos. As 20 peças que recorrem a sacos de serapilheira transportam uma “mensagem poderosa”, uma vez que este é o material utilizado no transporte de cacau e outros recursos naturais, “reforçando a reflexão sobre a exploração das matérias-primas africanas”.
“As obras incorporam ainda representações de marcas de chocolate amplamente reconhecidas, lembrando-nos que a indústria do cacau, apesar de alimentar um mercado global de luxo, continua assente na exploração de trabalhadores, muitas vezes em condições de semi-escravidão, incluindo crianças”, salienta o curador João Boavida, acrescentando que, “ao embarcarmos na visão do artista, somos conduzidos para uma viagem transformadora, onde as verdades profundas emergem e a empatia torna-se o alicerce de um novo entendimento”.
Na base desta coleção estão também os dados divulgados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, que revelam a existência de 300 mil crianças-soldados no mundo, com idades entre os 8 e os 16 anos, das quais 40% são raparigas. Os dados revelam ainda que 40% do cacau mundial é exportado da Costa de Marfim e 60% do cobalto é exportado da República Democrática do Congo, sendo que, dos 16 países do mundo com o maior número de refugiados, oito são africanos.
Patente na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro – projeto arquitetónico da autoria de Siza Vieira que tem por objetivo promover a arte contemporânea -, a exposição Black Lies Matter pode ser visitada de terça-feira a sábado, das 10h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h00, bem como no primeiro e no último domingo de cada mês, no mesmo horário.
Para Paulo Silva, presidente da Câmara Municipal do Seixal, que apoia a exposição, “os trabalhos reunidos neste espaço criam um lugar de denúncia e de reflexão com claras preocupações sociais, políticas e religiosas, e ênfase nas migrações e na necessidade de mão de obra barata, que remete para uma nova ‘escravatura’ a nível global e que parece ser uma condição humana que ainda não encontrou o seu justo término”.
“Com isso, olhamos a vida das crianças-soldado, dos refugiados e a exploração extrativista dos recursos do continente africano e, simultaneamente, dos milhões de explorados e de ‘meninos sem condição’ sobre os quais ‘todos somos responsáveis’. Um trabalho – uma realidade crua e dolorosa que é necessário ver – que pede a ternura do nosso olhar. E a mais urgente reflexão”, conclui o presidente do município.