Opinião de Rita Pinho Branco (Associação Mutualista Montepio): A propósito do Propósito… e do seu contrário
Por Rita Pinho Branco, directora de Comunicação, Marketing e Digital da Associação Mutualista Montepio
Uma das muitas alterações que o passado recente trouxe, sobretudo durante e após a pandemia de Covid-19, foi a maior atenção dedicada por profissionais de comunicação e marketing à questão do Propósito – a “estrela polar” na estratégia de uma organização, o que define e singulariza uma marca ou uma instituição em termos tão distintivos que, para lá de uma táctica de marketing, as mensagens, a identidade e a actuação possam ser absorvidas pela nossa experiência até se transformarem em sentimentos.
O tema sobressalta os profissionais e adensa-se quando constatamos que tudo começa na necessidade individual de um propósito. É indiscutível que todos desejamos fazer parte de algo maior que nós próprios (um propósito), algo susceptível de gerar sentido e impacto nos outros. E esta necessidade, indissociável da natureza humana, conduz à constante procura de “âncoras de sentido”.
Nas organizações, a realidade é idêntica, o que se confirma quando observamos que é através do envolvimento e do investimento na geração de impacto social que se revela o seu “carácter”, se materializam a sua responsabilidade, a sua autenticidade, a sua ética, os seus valores e o seu contributo para a sociedade. Do impacto positivo gerado na vida das pessoas, e no mundo em termos gerais, resulta o reconhecimento e, no passo seguinte, a energia que “fecha” o círculo virtuoso mais desejado: atrair, conquistar e fidelizar.
O compromisso que marcas e instituições assumem, ao declararem o propósito que as move e as singulariza, torna-se determinante. E é quando o propósito se transforma num statement inigualável em significado que a confiança e a afinidade se instalam, permitindo a conquista de uma posição cimeira na esfera da construção de sentido.
Mas este caminho não é linear e questionamo-nos sobre o que fazer quando tudo muda, quando o Propósito se confronta com a sua própria negação, quando a ética é questionada, quando nos confrontamos com a inconsistência e quando o discurso e a prática chocam frontalmente. Onde ficam os ideais, o compromisso e a singularidade do Propósito?
Um dos caminhos seguros será garantir que o propósito anda de mãos dadas com a consistência e a sustentabilidade. E, sobretudo, com a capacidade de antecipar o futuro e de responder aos desafios da humanidade, sejam eles a fome e a pobreza extrema, as alterações climáticas, a desigualdade, o racismo e a xenofobia, a violência sobre as mulheres ou… os abusos sexuais de menores. Onde fica o propósito quando isto não acontece? E o que fazemos com a “orfandade” que se instala quando o propósito passa a despropósito?
Artigo publicado na revista Marketeer n.º 321 de Abril de 2023