Quão fidedignos são os testes de intolerância alimentar?
Por Isabel Pedroso Silva, nutricionista, formadora e criadora da Escola Ouve O Teu Corpo e do O Podcast Da Isabel
É do conhecimento geral que o que comemos tem um grande impacto na nossa saúde, bem como os alimentos que evitamos comer. As consequências de insistir em comer alimentos aos quais somos alérgicos podem ser fatais, mas ultimamente parece que se ouve falar, cada vez mais, sobre intolerâncias alimentares.
Será que certos alimentos que ingerimos poderão desencadear uma resposta imune tardia, levando à fadiga, enxaquecas, desconforto intestinal, eczema ou asma?
O que é uma intolerância alimentar?
Uma intolerância alimentar é qualquer reacção desagradável que possa aparecer após ingerir um determinado alimento. Um copo de leite pode desencadear distensão abdominal, enjoos, flatulência, cólicas, dor de cabeça ou indisposição.
Como se difere de uma alergia alimentar?
As alergias alimentares são reacções graves que surgem após o consumo de uma pequena quantidade de um determinado alimento (amendoim, milho, marisco, etc) e são o resultado de uma resposta imune muito intensa. O resultado vai desde a língua inchada, à constrição do esôfago e das vias aéreas, tonturas, desmaios, urticária, náuseas ou queda repentina da pressão arterial. Todos estes sintomas aparecem minutos depois de comer aquele alimento aparentemente inocente.
Por outro lado, as reacções das intolerâncias alimentares podem levar horas a aparecer e, se for ingerida apenas uma pequena porção do alimento, poderá não desencadear nenhum sintoma.
Quais são, então, as opções disponíveis para avaliar uma alergia alimentar?
– Testes caseiros: podemos encontrar kits que pretendem testar alergias alimentares online e em farmácias. Embora esses kits ofereçam conveniência, não são, de todo, confiáveis. São, muitas vezes, mais económicos do que uma consulta médica e o funcionamento é o seguinte: picar o dedo e enviar uma amostra de sangue para um laboratório, ou o envio de uma amostra de cabelo. Depois de analisar a amostra, a empresa enviará os resultados do teste.
Analisamos um teste de alergia alimentar confirmando se o sangue produz anticorpos imunoglobulina E (IgE) em resposta a certos alimentos. Contudo, alguns testes caseiros medem apenas os anticorpos de imunoglobulina G (IgG), não existindo evidências que possam ajudar a diagnosticar uma alergia alimentar. Além disso, as amostras de cabelo não contêm IgE.
– Testes cutâneos: depois de obter um histórico pessoal e familiar detalhado, os profissionais de saúde geralmente usam, em primeiro lugar, os testes cutâneos ao tentar diagnosticar uma alergia alimentar. Envolve colocar uma pequena quantidade de extractos líquidos de certos alimentos na pele, geralmente nas costas ou no braço.
Após 15 a 20 minutos, o profissional examinará a área em busca de sinais de reacção alérgica, como inchaços ou erupções cutâneas. Embora os testes cutâneos sejam mais confiáveis do que os kits de testes caseiros, poderão produzir falsos positivos. Isso significa que o teste mostra que poderá haver alergia a algo, mesmo que não exista nenhum sintoma quando exposto à substância. Ainda assim, fornecem informações úteis que podem ajudar o médico a decidir o que fazer de seguida.
– Exames de sangue: o médico poderá pedir um exame de sangue, especialmente se o paciente estiver a fazer alguma medicação que possa interferir nos resultados de um teste cutâneo.
É colectada uma pequena amostra de sangue para ser analisada em laboratório. De seguida, a amostra é exposta a diferentes alimentos: se libertar muitos anticorpos IgE em resposta a um determinado alimento e o paciente tiver sintomas ao comer esse alimento, provavelmente será um caso de alergia alimentar.
Os exames de sangue também são uma opção mais segura se existe suspeita de reacção muito grave a algum alimento. Ainda assim, como nos testes cutâneos, os exames de sangue podem produzir falsos positivos. É necessário um acompanhamento individual após as respostas.
– Provas de provocação oral: se os testes cutâneos e os exames de sangue não produzirem resultados claros, o profissional pode solicitar uma prova de provocação oral, sendo geralmente realizada em consultório médico, sob supervisão rigorosa.
O paciente recebe uma pequena quantidade de comida enquanto o médico verifica sinais de reacção. Não havendo reacção, há um aumento gradual da quantidade de alimento. Não existindo, de novo, reacção, descarta-se a possibilidade de alergia alimentar.
Estas provas são consideradas os testes de alergia alimentar mais fidedignos, por fornecerem resultados rápidos e fáceis de identificar. São igualmente úteis para adultos que procuram descobrir se ainda têm alergia alimentar desde a infância (alergias ao leite, ovos, trigo e soja podem desaparecer com a idade).
– Dietas de eliminação/ introdução: são usadas para ajudar a identificar alimentos específicos que podem estar na causa de uma reacção alérgica. Podem, inclusive, ajudar a confirmar os resultados dos testes cutâneos e exames de sangue. Por si só não podem ser usados para distinguir uma verdadeira alergia alimentar de uma intolerância.
Numa dieta de eliminação, são evitados certos alimentos por algumas semanas, sendo reintroduzidos mais tarde, gradualmente, um de cada vez, de forma a avaliar os alimentos que provocam sintomas, bem como a quantidade.
As dietas de eliminação podem ser realizadas com um nutricionista registado na Ordem dos Nutricionistas, com as devidas competências a nível gastrointestinal, de forma a evitar deficiências nutricionais, sendo ainda aconselhado ao cliente manter um diário alimentar sobre o que come e o que sente.
O que fazer se desconfiar de uma intolerância alimentar?
Poderá ser útil começar por escrever um diário alimentar, com os sintomas e as horas em que aparecem: isto poderá ajudar a perceber padrões para determinar se certos alimentos podem estar a causar problemas digestivos ou outros sintomas.
De seguida, é importante agendar uma consulta com um médico ou nutricionista: um profissional de saúde pode ajudar a descartar outras possíveis causas de sintomas e determinar se pode ter alergia ou intolerância alimentar.
Poderão existir outras razões para o aparecimento de sintomas?
Existem muitas condições que podem ser responsáveis por sintomas digestivos que podem não ser diagnosticados se os sintomas forem atribuídos incorrectamente a uma sensibilidade alimentar, como por exemplo a síndrome do intestino irritável, doença inflamatória intestinal ou cálculos biliares.
Outras possíveis causas seriam o stress excessivo (dores de cabeça, tonturas, dificuldade em concentrar), a desidratação (tonturas, vertigens, fadiga), a privação do sono, certos fármacos e hábitos alimentares desajustados.