Para um Marketing (artificialmente) mais Inteligente
Por Gustavo Mendes, Director do programa Brand Management da Porto Business School
O uso da Inteligência Artificial no marketing deve ter como objectivo principal amplificar a inteligência actual, servindo para impulsionar (de forma relevante) a criação de valor para o negócio e para o cliente.
O sucesso desta utilização, e a sua consequente eficácia, está inteiramente dependente de vários factores críticos que temos de garantir, condições que temos de assegurar e dar antes, para podermos exigir e receber depois.
Dar para receber
O que temos de assegurar e dar?
A Inteligência Artificial não pode criar nada a partir do vazio, nem por “geração espontânea”.
Por isso, uma primeira condição “sine qua non” de mais inteligência é já existir (alguma) inteligência. No nosso caso em concreto, implica pelo menos já existir um (departamento de) marketing, qualificado, que se caracteriza (pelo menos): 1) por trazer para o negócio um pensamento sistémico; 2) pela integração de objectivos estratégicos claros que se traduzem num marketing-mix eficaz; 3) pela utilização de métricas que monitorizam o valor criado e dão pistas para oportunidades de melhoria; e 4) por último, mas não menos importante, por uma mentalidade centrada no cliente.
Garantido isto, uma segunda condição crítica de sucesso passa por assegurar toda a componente tecnológica e ter a certeza que existe: 1) uma infraestrutura robusta e escalável que suporta as aplicações de IA e permite uma integração perfeita com os sistemas existentes; 2) dados úteis e de qualidade, dados de negócio (que normalmente já existem) e principalmente dados de cliente que garantam uma visão compreensiva de quem é o cliente, o que faz e porque é que o faz; e 3) pessoas com a expertise necessária para garantir que tudo isto acontece, capazes da adaptação contínua ao contexto e às tecnologias em evolução.
Assim, sem (algum marketing), sem dados de cliente e sem tecnologia, como diria a inteligência popular (que de artificial tem pouco), será como “começar a casa pelo telhado”, só recomendável a quem quer parecer inteligente, sem na verdade nunca o ser.
O que devemos exigir e receber?
A partir deste ponto, onde devemos esperar ganhos relevantes no marketing pelo recurso à IA? Aqui, destacam-se três áreas em particular: 1) a automação de análises e processos; 2) a personalização da proposta de valor e da comunicação com o cliente; e 3) a possibilidade de interacção em tempo real.
A automação traz uma nova eficiência ao marketing, permite automatizar tarefas, processos e análises repetidas (que ao serem feitas pelo marketeer não acrescenta valor) e oferece a oportunidade de estudar grandes quantidades de dados e dar-lhes uma verdadeira utilidade, seja ela descritiva, preditiva, prescritiva ou explicativa (e que o marketeer sozinho não seria capaz de fazer).
Por outro lado, o recurso à IA permite ao Marketing um grau de personalização já imaginado, mas nunca conseguido. De repente, 30 anos depois, o conceito de “marketing one-to-one” (criado em 1994 por Don Peppers e Martha Rogers no livro “The One-to-One Future”) pode finalmente ser uma realidade. Falamos da possibilidade de personalização da proposta de valor, assim como do conteúdo da mensagem comunicada, literalmente pessoa a pessoa, uma pessoa de cada vez, mas aos milhares ao mesmo tempo.
Por último, a acção em tempo real permite ao profissional de marketing interagir “no momento certo, na hora certa, no sítio certo”. O eterno lema da omnicanalidade pode, de repente, ver a luz do dia, num mundo phygital que o exige cada vez mais. Torna-se, assim, possível integrar, de uma vez por todas, conteúdos, canais e momentum.
O maior impacto virá não da optimização independente de cada uma destas condições, mas da sua utilização combinada: a automação ao serviço da personalização, ao serviço da actuação em tempo real e ao serviço da criação de valor (para o negócio e para o cliente). Gosto!