«Pandemia fez ultrapassar várias barreiras de experimentação»
Apesar do impacto negativo na saúde e economia, a Covid-19 veio acelerar a adopção de comportamentos digitais por parte de muitos consumidores que, de outra forma, seria difícil de se concretizar.
Na 14.ª Conferência Marketeer, António Casanova, CEO da Unilever, refere que assistimos a uma fase de e-Everything, ou seja, um cenário em que a penetração do digital ganhou uma (ainda) maior preponderância. «Hoje, anda tudo à volta do digital. As entregas aumentaram substancialmente, chegando a novos grupos cuja penetração seria muito difícil sem este contexto. Ultrapassaram-se várias barreiras de experimentação e este é um mercado que ficará connosco durante muito tempo», afirma.
Outro dos impactos da pandemia foi o aumento considerável do consumo de produtos para o lar, uma vez que consumidor foi obrigado a basear a sua vida na casa e na família. «Temos uma vida familiar muito mais centrada que há seis meses. Há uma tendência enorme para uma vida limpa, no que respeita à higiene e limpeza, que se traduz num mercado de 10 milhões de euros que não existia há seis meses», destaca.
Este fenómeno deve-se ao clima de medo junto da população, que se reflecte no aumento da compra de produtos específicos. No entanto, António Casanova afirma que há segmentos de produto recentes que não irão durar mais do que um ano, como o das máscaras ou luvas de protecção.
António Casanova prevê ainda, com base neste incremento do mercado do consumo em casa, que o mercado fora de casa não deverá recuperar nos próximos dois ou três anos.
Outra das tendências que se acentuou e deverá permanecer é uma maior preocupação sustentável por parte das marcas. «Mesmo nos países mais afectados pela pandemia e em situações mais críticas, as marcas que seguiram o seu posicionamento e o seu propósito continuaram a vender bastante. Esta é uma lógica muito importante para várias indústrias, especialmente para o grande consumo, e não irá desaparecer», assegura.
Os desafios da recessão
António Casanova afirma que o segundo trimestre deste ano terá tido uma dimensão económica só conhecida em Portugal nos anos 90. «Estes últimos três meses provocaram uma recessão da economia equivalente aos últimos 20 anos de desenvolvimento. O que se espera é que tenhamos uma recessão massiva que fará as últimas parecerem “brincadeiras de crianças”», antevê o CEO da Unilever.
Assim, espera um 2021 e 2022 muito mais pequenos em dimensão económica face a 2019. E, em 2023, ainda que muito dificilmente, poderá ser possível igualar a performance de 2019. «Há economias que irão recuperar facilmente, como a Suécia e Alemanha, e no próximo ano já estarão como em 2019. Mas não será o nosso caso», realça.
Quanto ao grande consumo, relativamente ao último trimestre do ano, verifica-se que o preço médio das categorias está a baixar bastante, com o aumento da relevância das marcas próprias. «A dinâmica de promoção será mais forte e as marcas deverão focar-se em produtos mais adaptados a uma lógica recessiva», explica.
No caso da Unilever, a companhia tem vindo a proceder a várias alterações. Metade do escritório foi encerrado e não voltará a abrir. «A lógica do teletrabalho ganhará maior relevância no futuro», explica. Perante os desafios que se avizinham, António Casanova afirma que a Unilever irá focar-se nas grandes marcas e produtos, cortando as marcas de menor dimensão.
O CEO afirma que o mais importante é manter a flexibilidade, tendo várias alternativas em aberto para os próximos tempos, para que as marcas estejam preparadas para qualquer que seja a realidade com que se deparem.
Texto de Rafael Paiva Reis