Opinião de João Epifânio (Altice): Bem-vindo ao Mali…
Por João Epifânio, Chief Sales Officer B2C & Chief Marketing Officer da Altice
A bandeira do Mali é tricolor, com o verde à esquerda, o amarelo ao centro e o vermelho à direita. Este alinhamento são as cores do movimento Pan-Africano, o verde representa as florestas e a fertilidade da terra, o amarelo o sol e o vermelho a luta pela independência. Surpreendentemente, o Governo de Portugal, ainda em funções, decidiu-se por uma nova imagem implementada em final do ano, composta por um retângulo verde e outro vermelho, separados por um círculo amarelo.
Tendo em conta a bandeira do Mali, poderão os menos atentos perguntar se porventura haverá algum equívoco… infelizmente não, o Governo de Portugal decidiu retirar os elementos identitários de Portugal para “efeitos de simplificação… Foi projectada para ser mais dinâmica e operativa em ambiente digital”, ou seja, a esfera armilar manuelina, que evoca os feitos dos navegadores portugueses e a primeira idade da globalização, os sete castelos amarelos representando a unidade do território estabelecida por D. Afonso III e os cinco escudos azuis em forma de cruz, que remete para a base cristã do nosso País (sim, é um facto que não se alterou!…), que simboliza por sua vez a vitória de D. Afonso Henriques sobre os cinco reis mouros na batalha de Ourique, determinante para a afirmação da independência, por sua vez preenchidos por cinco “marcas”, ditas as “chagas de Cristo”.
Ora acontece que esta é a imagem, que, mais do que representar o Governo, vai representar Portugal e não quem governa. Aqui reside o pecado original, ou seja, o princípio de que o País é de quem o governa. Quem governa tem de entender que é apenas passageiro temporário de uma função atribuída pelos portugueses, não estando mandatado para abdicar da identidade do País em nenhuma circunstância. Defendo e sempre defendi que as “marcas” são entidades vivas, na definição de Philip Kotler, marcas são “nomes, termos, sinais, símbolos que, unidos, identificam produtos e serviços de uma empresa e os diferenciam dos seus concorrentes”. Ora limitar Portugal a uma combinação de blocos cromáticos, retirando em si elementos de diferenciação, é reduzir a dimensão do País, é reduzir a marca “Portugal”, é tornar pequeno o que é grande, não sendo por isso de estranhar a ampla controvérsia que tal movimento levantou. O Governo defendeu-se argumentando que “a nova imagem afirma-se, também, inclusiva, plural e laica”. O mais preocupante é que estes exercícios tendem cada vez mais a ser feitos por bloqueio ideológico de quem renega a sua História, o seu passado, os fundamentais da cultura e sociedade, para pretender refundar os alicerces do sistema educativo e social, sem noção das prioridades da vida dos portugueses. Assim nos perdermos na discussão dos WC das nossas escolas.
Portugal não é o Mali (!)
Artigo publicado na revista Marketeer n.º 330 de Janeiro de 2024