«O propósito da marca revela-se nos momentos críticos»
É quase imperativo para as marcas terem um propósito nos dias que correm, assumindo uma posição que traduz os seus valores e gera (ou não) empatia com os clientes. Mas, nos momentos de crise (como a actual pandemia) esse propósito é colocado à prova, permitindo perceber qual a sua transparência e se, efectivamente, pratica o que prega.
Esta foi uma das principais conclusões numa das mesas redondas da 15.ª Conferência Marketeer “(Un)Fake – As Marcas, o Mundo e a Pandemia”, que decorreu, sem público, no Museu do Oriente, mas transmitida integralmente online.
Teresa Lameiras, directora de Marketing da SEAT, defende que este é um momento em que se permite averiguar os verdadeiros valores das marcas. «É mais óbvio perceber o propósito da marca, se é verdadeira e coerente, nos períodos mais críticos. A transparência da marca é mais evidente nestes momentos», explica.
À conversa com a responsável da marca estiveram também João Paulo Velez, director de Marketing Corporativo do Santander Portugal, Paulo Campos Costa, director global de Marca, Marketing e Comunicação da EDP, e Sérgio Carvalho, director de Marketing da Fidelidade, a discutir o tema “Como gerir Marcas num mundo de incerteza”. A moderação ficou a cargo de Maria João Vieira Pinto, directora de redacção da Marketeer.
No caso da SEAT, tratando-se de uma marca automóvel que preza pela segurança dos seus clientes, não podia promover a utilização das viaturas durante a fase de confinamento. «Foi necessária uma reinvenção. Sendo uma marca de mobilidade, não podemos dizer às pessoas para saírem de casa e conduzirem. O que dissemos foi para esperarem, que o momento de voltarmos a estar juntos viria mais tarde. E, quando fosse possível, poderiam contar com a SEAT para o fazerem, numa lógica de segurança adaptada à normalidade possível», afirma Teresa Lameiras.
Paulo Campos Costa defende que uma comunicação verdadeira, agora mais que nunca, é essencial para criar e manter ligações com os clientes. «Como se costuma dizer, a mentira tem perna curta pelo que o mais importante é a verdade. Mas, na EDP, nada mudou neste aspecto: sempre comunicámos com a verdade e vamos continuar assim», assegura.
No caso da marca de energia, não foi cancelada qualquer campanha, tendo apenas sido adiado o seu lançamento. Parar com a comunicação seria, de acordo com o responsável da EDP, ir ao desencontro de um dos valores da marca. «Não parámos nenhuma campanha, continuámos a comunicar para manter a proximidade com os clientes. Mas tudo estava preparado. O que fizemos foi alterar prazos, tudo o resto já estava planeado. Em Portugal há mais de 100 empresas prestadoras de energia. E se somos escolhidos e líderes é porque somos verdadeiros no que prestamos aos clientes», afirma. Paulo Campos Costa destaca ainda que a proximidade foi também assegurada pelo trabalho de campo. «A electricidade nunca parou. Mesmo em teletrabalho, 40% dos nossos colaboradores estava na rua para assegurar que nada parasse neste período», salienta.
No sector segurador, que vive da confiança depositada pelos clientes, perante o distanciamento causado pelo encerramento de pontos de atendimento ao público, era essencial disponibilizar novas formas de contacto. Até porque, para além da confiança, a proximidade é essencial, ainda para mais em situações de incerteza. «Devido às limitações físicas impostas, criámos novas formas de os clientes nos contactarem. E essas oportunidades de contacto foram valorizadas pelos mesmos. Aliás, actualmente, comunicamos mais que nunca com os nossos clientes. No passado não fazíamos tanto para não saturar a relação mas, agora, reforçámos essa comunicação e o cliente valorizou essa maior proximidade», explica Sérgio Carvalho.
O director de Marketing da Fidelidade explica que as mensagens que fogem ao normal são melhor articuladas pelos clientes, uma vez que os próprios também mudaram a forma como consomem informações. «Há mais exigência, pois os clientes querem que estejamos lá para eles nestas situações, mas também há mais tolerância quando sentem que há um esforço real para resolver os seus problemas», afirma.
Perante a incerteza vivida e a necessidade de dar uma resposta aos consumidores de forma eficaz e célere, João Paulo Velez questiona como se pode traçar a melhor estratégia de comunicação. «Como é que se comunica sem ferir as pessoas, isto é, com mensagens que respondam ao que querem receber? É um desafio para a área criativa e, neste caso, para o sector da banca», refere o director de Marketing Corporativo do Santander Portugal.
A demonstração de disponibilidade é essencial, bem como perceber de que forma é possível que os clientes mantenham a confiança nas instituições bancárias em contexto adverso. «Por isso criámos novos serviços para que os clientes pudessem estar em contacto com o Santander, tendo ainda acelerado um conjunto de medidas e eixos para responder às necessidades. É essencial inventar novas formas de contacto e relação com os clientes», vinca João Paulo Velez.
Por último, no meio de várias incertezas, há algumas certezas que visam tranquilizar os consumidores. «As marcas vão continuar a estar disponíveis para os clientes. Ainda vivemos uma primeira etapa da pandemia e as marcas têm de ter atenção e cuidados extremos com os clientes e com a sociedade. E, com esse mindset, serão marcas mais humanas, capazes de estarem atentas aos mais pequenos sinais», finaliza João Paulo Velez.
Texto de Rafael Paiva Reis