Kia: O movimento que inspira novas ideias

Miguel Santos, director de Marketing da Kia Portugal, fala-nos, nesta entrevista à Marketeer, sobre o mercado de veículos eléctricos, aponta caminhos e estratégias para o crescimento deste sector, e adianta os planos para o sucesso da marca para os próximos anos. Actualmente, a Kia é uma das marcas preferidas dos portugueses no segmento de particulares, e o objectivo é manter o seu nível competitivo em todos os segmentos e continuar a desenvolver automóveis e soluções de mobilidade cada vez mais adaptadas ao estilo de vida dos portugueses.

Em que ponto se encontra o sector de automóveis eléctricos?

A electrificação automóvel em Portugal está a acontecer num ritmo muito elevado, em particular se comparado com outros mercados europeus. Em 2023, 18% dos automóveis ligeiros de passageiros matriculados em Portugal foram eléctricos (BEV), correspondendo em volume a 36 300 unidades, sendo que, no ano anterior, apenas se tinham registado 18 mil unidades. Tal representa um crescimento de mais de 100% relativo ao período homólogo! Para percebermos o ritmo acelerado que registamos em Portugal, basta dizer que no mesmo período a quota de vendas de eléctricos em Espanha foi bem mais tímida, não tendo chegado aos 5%, o que deixa entender que ainda não se verificou um verdadeiro despertar para a electrificação.

Podemos apontar alguns motivos para esta adesão crescente à electrificação automóvel no nosso mercado. O primeiro prende-se com a disponibilidade por parte das marcas, em particular nos últimos 24 meses, de lançarem novos modelos em vários segmentos de mercado, com autonomias e preços cada vez mais competitivos. O segundo está assente na sustentabilidade, aliada aos benefícios e incentivos governamentais concedidos à aquisição de automóveis eléctricos, embora os mesmos incidam maioritariamente sobre as empresas. Para 2024, esperamos que o mercado continue numa tendência de crescimento, embora mais moderado.

Referiram que a Kia tinha como objectivo lançar 11 novos veículos 100% eléctricos até 2030, à cadência de dois modelos por ano, a partir de 2023. Como está a correr este plano?

A Kia registou, em 2023, os melhores resultados de sempre em Portugal, com mais de 7000 unidades vendidas e 3,5% de quota de mercado. A electrificação tem vindo a ganhar cada vez mais relevância dentro do nosso line-up e, em 2024, já disponibilizamos uma gama com a oferta de três modelos BEV, 100% eléctricos, e cinco outros electrificados, entre PHEV e HEV.

Trata-se de uma das gamas ecológicas mais diversificadas no mercado nacional, com ofertas em quase todos os segmentos, da qual destaco o EV6, que alcançou um sucesso global, culminando com a atribuição do prémio COTY – Car of the Year, bem como a distinção de Carro Eléctrico do Ano em Portugal. O EV6 permitiu à Kia entrar em segmentos de mercado mais elevados e captar novos clientes que até aqui ainda não tinham considerado a marca, uma tendência que se acentuou com a introdução do EV9, um SUV eléctrico de grandes dimensões, com sete lugares, que compete no segmento superior. Desde que foi lançado, surpreendeu com atributos que o levaram a ser considerado, em simultâneo, Carro do Ano Mundial 2024 e Viatura Eléctrica Mundial 2024.

Mas este é apenas o início de um longo caminho que estamos a percorrer a grande velocidade e que vai acelerar nos próximos 18 meses. Ainda em 2024, vamos introduzir o Kia EV3, o nosso primeiro SUV 100% eléctrico do segmento B-SUV e que, pelo seu design, versatilidade e autonomia, será a referência no segmento de mercado que mais cresce actualmente. Depois, entraremos em 2025 com seis novos lançamentos.

A electrificação não se ficará pelos automóveis de passageiros. Em Janeiro, a Kia aproveitou a sua presença na CES, em Las Vegas, para apresentar a sua estratégia “Além da Mobilidade”, que consiste na introdução do conceito PBV – Platform Beyond Vehicle. A primeira fase deste projecto tem início em 2025, com a introdução do Kia PV5, um EV versátil optimizado para tarefas como o transporte individual de passageiros e mercadorias, que apresenta capacidades de conversão de acordo com diferentes necessidades dos clientes. Posteriormente, numa segunda fase, a marca introduzirá o PV7 e PV1.

Consideram que os portugueses estão mais confiantes na transição para os veículos eléctricos?

Portugal é um bom exemplo de um mercado em que a electrificação automóvel está numa tendência crescente. No entanto, e fruto de uma fiscalidade que privilegia essencialmente as empresas, ainda há um longo caminho a percorrer para atrair os clientes particulares que, em muitas ocasiões, se retraem no momento da decisão, devido à enorme diferença de preços que ainda existe entre um automóvel a combustão e um EV. Progressivamente, com o aumento da oferta EV dos fabricantes nos segmentos mais baixos, citadinos e utilitários é natural que seja possível mais portugueses aderirem à electrificação.

Que papel a motorização a combustão ainda tem na estratégia de marketing da marca?

A Kia em Portugal está no Top 10 do ranking de vendas, com uma penetração robusta no segmento de particulares e uma oferta de modelos EV e electrificados que lhe permitirá continuar a crescer no canal de empresas. À excepção das poucas marcas nativas na electrificação, para todas as outras os modelos a combustão ainda têm uma relevância importante nas vendas, porque muitos clientes não têm condições ou capacidade financeira para adquirir um automóvel eléctrico. Esta é uma realidade também na Kia e, como tal, continuamos a ter modelos a combustão de enorme relevância na marca, como o citadino Picanto, que este ano sofrerá uma profunda actualização, o Stonic, que é um dos best-sellers da marca, ou o XCeed, que compete no segmento C e, a par da motorização a combustão, apresenta também uma alternativa PHEV.

Nesse sentido, temos estratégias de marketing diferenciadas para a nossa oferta a combustão e gama electrificada, esta última com uma comunicação mais orientada para o canal empresas, em que privilegiamos soluções competitivas que enquadrem a nossa gama dentro da fiscalidade vigente e que vão ao encontro das necessidades das empresas em termos de utilização e autonomias.

No campo da sustentabilidade, que esforços a empresa está a aplicar para reduzir o impacto ambiental dos seus veículos?

A visão global da Kia é ser mais do que um fabricante de automóveis. Passa por posicionar-se como um provedor sustentável de soluções de mobilidade. Nesse sentido, os objectivos estão bem definidos: atingir a neutralidade carbónica em 2045; compromisso de utilização de 100% de energias renováveis em 2040; incorporação progressiva de materiais reciclados nos seus veículos; e aumentar o apoio a projectos “eco-friendly”.

Localmente, temos vindo não só a apoiar os projectos globais da marca, como o “The Ocean Cleanup Project” e, em simultâneo, temos desencadeado uma série de iniciativas locais que reforçam essa preocupação. Recentemente, oficializámos o nosso apoio a um projecto de conservação dos oceanos, que muito nos orgulha. A “SeaTheFuture” é uma plataforma de âmbito global que tem como propósito unir a sociedade civil, empresas e instituições pela conservação dos oceanos e da sua biodiversidade. Contando com milhares de membros, incluindo cientistas, voluntários e entusiastas, o movimento SeaTheFuture está dividido em diversos projectos, que incidem especificamente sobre uma determinada espécie marinha ou zona do globo. Para além de uma série de acções de sensibilização que vamos implementar ao longo de 2024 com a “SeaTheFuture”, vamos apoiar financeiramente o projecto com a atribuição de uma verba monetária na venda de cada um dos nossos modelos 100% eléctricos: Niro EV, EV6 e EV9.

Estamos, também, ligados a outro projecto extraordinário de âmbito local, em Cascais. O “Movimento Claro” surgiu pela mão de três jovens surfistas e empreendedoras que criaram, em 2021, um projecto de voluntariado que organiza limpezas subaquáticas na Baía de Cascais. Todo o plástico recolhido é reconvertido em skates que ficam disponíveis para a comunidade, jovens carenciados e frequentadores do skatepark da Torre.

Como é que a Kia está a integrar a tecnologia e inovação nos seus modelos?

Os dispositivos móveis, dos smartphones aos wearables, vieram introduzir um novo paradigma nas expectativas e modos de uso por parte do consumidor. O cliente já não se satisfaz com um produto “estático”. Antes ambiciona uma atenção permanente do fabricante através de, por exemplo, actualizações. A Kia está atenta a estas mutações, pelo que está a expandir o número de modelos com tecnologia remota (OTA) até 18, e a aumentar a taxa de instalação de sistemas avançados de assistência ao condutor (ADAS) para mais de 63% dos seus modelos até 2026. Esta abordagem será reforçada com melhorias na satisfação com o atendimento ao cliente, nomeadamente através de um aumento da capacidade de resposta nesta área, utilizando 6200 localizações globais e quase 34 mil técnicos qualificados, bem como recorrendo ao fornecimento de peças centradas no cliente e à expansão contínua dos serviços digitais da Kia. Este é apenas um exemplo do nosso esforço e da nossa sistemática atenção à transformação do perfil das novas gerações.

Como exploram a IA e conectividade nos vossos modelos?

A estratégia a médio e longo prazo da Kia assenta em quatro eixos essenciais no desenvolvimento de produto: conectividade, condução autónoma, desempenho e design. A marca está a expandir novos serviços baseados em conectividade, tais como OTA (Over-The-Air), FoD (Feature on Demand) e pagamento no veículo, ao mesmo tempo que está a reforçar a sua oferta em tecnologias de conectividade no padrão 5G – por exemplo, sistemas avançados de OTA e condução com eficiência de combustível utilizando IA.

A marca está, igualmente, focada na expansão dos denominados “veículos definidos por software” (SDV). Cumprir este objectivo passa pelo desenvolvimento de uma plataforma integrada que maximiza as sinergias entre hardware e software, e pela combinação de computadores de bordo de alto desempenho com a conectividade de alta velocidade, bem como pelo recurso às mais recentes tecnologias de IA para melhorar a comodidade e a segurança.

Quais as principais estratégias de marketing da Kia para chegar aos consumidores?

A relação dos consumidores com a tecnologia e a mobilidade é hoje vincadamente diferente do que era há uns anos e isso é sobretudo visível nas novas gerações, que têm expectativas e prioridades muito distintas.

A Kia compete, actualmente, em quase todos os segmentos de mercado. Somos uma marca generalista, com um foco enorme na inovação, design e tecnologia. Disponibilizamos uma gama de modelos que vai desde o pequeno citadino, até modelos de alta performance direccionados para um cliente muito exigente. A nossa estratégia tem passado por um reforço da presença da marca nos canais tradicionais, nomeadamente com uma aceleração dos investimentos em televisão, que continua a ser o meio dominante, apesar de o digital ser o meio que mais cresce volumetricamente. Desta forma, temos vindo a adoptar uma estratégia “always-on”, optando em alguns momentos por baixar a pressão, quando complementada com o suporte em patrocínios de determinados formatos de audiências elevadas, que nos permite maximizar o tempo on air. Em 2023, esta estratégia permitiu-nos um crescimento do nosso SOV, que pretendemos consolidar em 2024. Em simultâneo, os canais digitais são, também, uma ferramenta crítica para reforçar o posicionamento da Kia como marca integrante do pelotão que lidera a mobilidade eléctrica. Assim, uma presença fortíssima em Web e em Social Media, assente numa estratégia de “always-on”, que permite trabalhar segmentações mais específicas, nos canais de clientes particulares e empresas, com mensagens mais comerciais, que podem passar por atributos de produto ou condições comerciais mais agressivas e, ainda, campanhas de retargeting optimizadas em CPA e CTR, com o intuito de gerar leads. A estratégia que desenvolvemos em Social Media passa por maximizarmos todo o ecossistema da marca Kia. Temos uma forte associação a duas figuras públicas que, de formas diferentes, expressam os valores da Kia: a Carolina Patrocínio, com uma vida profissional muito activa que consegue conciliar com quatro filhos, muito desporto, viagens e família, e a Vera Kolodzig, com um foco muito vincado na criatividade e sustentabilidade.

Actualmente, quais os maiores desafios e oportunidades?

O mercado automóvel está muito instável e tem sido impactado por diversos factores desde o pico da pandemia, que originaram quebras na ordem dos 30% no mercado global. Após isso, veio a crise dos semicondutores, constrangimentos globais na logística e transporte de bens e mercadorias, guerra na Ucrânia e, por último, os ataques aos navios no Mar Vermelho, que estão a levar a importantes alterações no fluxo normal de matérias-primas. Ainda assim, no caso da Kia, temos vindo a ultrapassar as dificuldades, como aliás demonstram os nossos resultados de vendas em 2023, como o melhor ano de sempre em Portugal e ainda um fortíssimo crescimento de 58% no primeiro trimestre deste ano.

Para 2024, o plano é continuar a crescer, impulsionados pela electrificação, visto que vamos ter novos modelos e, por outro lado, cimentar a nossa posição competitiva com a actual gama SUV nos principais segmentos, em particular B-SUV e C-SUV. Actualmente, a Kia é uma das marcas preferidas dos portugueses no segmento de particulares, encontrando-se no Top 3 do ranking. Queremos manter a nossa posição competitiva neste canal e crescer no canal de frotas, aumentando a nossa penetração nas empresas. Também aqui, a oferta que temos está adaptada às necessidades das empresas portuguesas, quer no que diz respeito à definição de produto, quer na competitividade de preço e enquadramento fiscal para empresas.

Por fim, quais os objectivos e metas para os próximos anos?

Na Kia, acreditamos que o movimento inspira novas ideias! Estamos no processo de transformação enquanto construtor de automóveis, para sermos um “provedor de soluções de mobilidade sustentável”. Com esse objectivo muito claro, começámos a percorrer este caminho em 2021 com um rebranding global. Em 2023, tomámos a dianteira da electrificação, e, em 2025, esperamos ser a marca líder na Mobilidade Personalizada com os veículos PBV. Em 2028, vamos atingir a maturidade de uma marca aspiracional que se conecta com outras soluções de mobilidade, e, dois anos depois, queremos chegar aos 4,3 milhões de vendas globais, 1,6 milhões de veículos eléctricos (BEV), 250 mil unidades PBV, e foco total no ESG.

Como marca global, localmente, vamos adoptar estas metas no sentido de continuar a trilhar o caminho de crescimento em Portugal, o qual, devo sublinhar, só tem sido possível com o empenho e resiliência da nossa Rede de Concessionários, que tem vindo a fazer este caminho connosco e que acredita na ambição que temos de desenvolver automóveis e soluções de mobilidade cada vez mais adaptadas ao nosso estilo de vida.

Este artigo faz parte do Caderno Especial “O Mercado e o Marketing Automóvel”, publicado na edição de Maio (n.º 334) da Marketeer.