Opinião de Miguel Costa, Head of Digital Transformation
Há um paradoxo curioso na adoção de Inteligência Artificial (IA): nunca houve tanta tecnologia disponível, porém nunca foi tão difícil transformá-la em impacto real. As ferramentas multiplicam-se. O ‘hype’ também. O que não se multiplica automaticamente é a disciplina, a clareza ou a organização.
Na era da IA, o crescimento das organizações deixou de ser linear. Escalar significa potenciar talento, integrar conhecimento e operar com mais inteligência. Transformar operações implica repensar processos, cultura e estratégia para adotar as tecnologias certas num ritmo de mudança acelerado.
A matemática das operações mudou e se já tínhamos passado das somas simples aos fatores multiplicativos, a IA pode permitir elevar recursos ao exponencial.
Mas por onde começar? A resposta começa longe dos algoritmos.
1. Integração de sistemas e dados
O impacto da IA começa pela qualidade da informação. As organizações precisam de um ecossistema integrado, onde os dados circulem sem barreiras. Montar arquiteturas robustas é um pré-requisito para aproveitar automação, análise e personalização. Com sistemas desconexos a capacidade para alavancar as potencialidades da IA fica limitada.
Nesta nova realidade, as empresas devem ser capazes de integrar sistemas – ferramentas como CRMs, ‘knowledge bases’ ou gestores de tarefas devem conseguir comunicar umas com as outras de forma a que o ecossistema tecnológico se torne num conjunto de bases de dados interligados entre si.
2. Documentação e digitalização de informação
O ativo mais subestimado das organizações sempre foi o conhecimento tácito: o que se diz nas reuniões, o que vive na cabeça das equipas, o que nunca chega a ser registado. Um dos fatores diferenciadores na adoção de IA é a capacidade para captar informação proprietária, dados únicos e diferenciadores que permitam trabalhar em cima de toda a informação já publicamente disponível. Neste contexto, torna-se fundamental capturar e gerir dados de forma consistente.
Um exemplo simples mas poderoso passa por digitalizar os conteúdos de reuniões através de ‘note takers’. As informações mais relevantes e valiosas circulam nas conversas internas e externas e criar processos para documentá-las e disponibilizá-las é outro dos alicerces para alavancar IA. O que só existe no papel ou na cabeça das pessoas, simplesmente não é alavancável.
3. Começar pelo problema
No meio de tantas ferramentas e ‘hype’ digital, com tantos “brinquedos novos” à disposição, a tentação para experimentar sem direção é grande. Mas os melhores resultados começam na identificação de problemas concretos – tarefas manuais e repetitivas, processos ineficazes ou congestionamentos operacionais. Desenhar soluções focadas à volta desses mesmos desafios e dos processos já existentes deve ser o ponto de partida. Começar pelo problema orienta o investimento e experimentação para onde a mudança é potencialmente real e transformadora.
4. Navegar o ritmo de mudança
A evolução da inteligência artificial é tão rápida que uma ferramenta que hoje parece revolucionária pode tornar-se irrelevante em poucas semanas ou meses. Para evitar a chamada “paralisia de decisão”, as empresas devem adotar ciclos curtos de experimentação: projetos-piloto de duração limitada, com objetivos claros e resultados mensuráveis.
Estes ciclos seguem três etapas simples: testar, aprender com o que corre bem e com o que corre mal, e ajustar o plano. Esta abordagem permite manter agilidade, reduzir riscos e progredir de forma sustentável num ambiente em constante mudança.
É também esta a abordagem que a Republica apoia nas PME: identificar oportunidades de automação, redesenhar processos e ajudar as equipas a adotar a tecnologia certa – sem vender software, apenas garantindo que este funciona realmente a favor do negócio. Num cenário tão volátil, ficar parado é perder terreno; esperar pelo momento perfeito pode significar ficar para trás.
5. Fomentar cultura de experimentação
A resistência à mudança sempre foi uma realidade mas agora é amplificada pelo (compreensível) medo de substituição que a IA gera nas mais variadas funções. Para serem bem sucedidas, as empresas devem conseguir que as suas equipas vejam a IA como aliado, e não como o inimigo.
É essencial promover esta mentalidade de ver a IA como potenciador do desenvolvimento, da produtividade e da criação de valor e investir em experimentação e formação, abrir canais para partilha de casos de sucesso e criar um ambiente que abrace a inovação.
6. Gestão de risco
A IA traz enormes oportunidades, mas também riscos e desafios. Quantas vezes vemos o Chat GPT mentir com a mesma convicção que diz verdades? Quantas vezes, ao experimentar novas ferramentas, vamos rapidamente do WOW ao OUCH, maravilhados pelas possibilidades mas assustados por falhas graves? Equilibrar as capacidades com a falta de controlo e previsibilidade é chave para uma
adoção de AI bem sucedida. Nesse sentido, começar por ‘use cases’ de baixo risco e escalar com segurança é prática recomendada para manter controlo e confiança.
Conclusão
O futuro da otimização de operações passa por integrar sistemas, capturar conhecimento, priorizar os problemas certos, aprender depressa, cultivar equipas preparadas e escalar com responsabilidade.
A tecnologia, por mais avançada que seja, é apenas o acelerador. Os processos são a estrutura e as pessoas são o motor.
Na era da IA, otimizar operações significa potenciar talento, transformar dados em vantagem competitiva e manter a organização ágil perante um ritmo acelerado de mudanças.
Este é o caminho para navegar com sucesso o futuro digital, onde tecnologia, pessoas e processos se reforçam mutuamente, gerando valor real e duradouro para organizações de todos os sectores e dimensões














