Como está a evoluir o turismo em Portugal
Para onde caminha o turismo? Esta e outras questões estiveram em debate no pequeno-almoço dedicado ao universo do sector, que teve lugar no Hotel Dom Pedro Lisboa.
Texto de Sandra M. Pinto
Fotos de Paulo Alexandrino
De acordo com os dados revelados no relatório World Travel & Tourism Council (WTTC), relativo ao ano de 2018, o sector do turismo teve um impacto directo estimado de 14,3 mil milhões de euros na economia portuguesa, sendo que a projecção é a de que este ano esse valor chegue aos 15 mil milhões de euros. No mesmo relatório pode ler-se que o sector cresceu 8,1% em 2018, obtendo assim a maior taxa entre os países da União Europeia.
Os valores revelados incluem os impactos directos, indirectos e induzidos que o turismo tem na economia nacional. Nos impactos efectuados no sector, enquanto os induzidos referem-se às despesas dos trabalhadores. Relativamente à economia, o contributo total estimado das actividades turísticas foi de 19,1%. Simultaneamente, a Organização Mundial de Turismo estima que o número de turistas internacionais tenha chegado aos 1,4 mil milhões em 2018, superando as previsões para 2020, dois anos mais cedo. Como encaram os players todos estes números e que implicações têm eles no desenvolvimento dos respectivos negócios?
Este e outros temas serviram de base ao pequeno-almoço que teve lugar no Hotel Dom Pedro Lisboa, e onde estiveram presentes: Albertina Martins (Head of Brand Activation & Licensing da TAP Air Portugal), Francisco Paixão (Regional Marketing Representative Turkish Airlines), Gilda Luís (Marketing, CRM & Loyalty director Pestana Hotel Group), João Pinto Coelho (director de Vendas e Marketing do Grupo Onyria Golf Resorts), Margarida Blattmann (directora de Marketing da Wamos Portugal), Paulo Monge (director de Vendas da Sana Hotels), Pedro Capitão (CEO do negócio de hotelaria da Sonae Capital) e Pedro Ribeiro (director Comercial – Portugal e Brasil – Dom Pedro Hotels & Golf Collection). Com a finalidade de se alcançar um debate mais aprofundado por parte de todos, foi decidido que nenhuma das intervenções seria atribuída directamente no texto.
Importância da BTL
Encarada como todas as outras feiras de turismo, a Bolsa de Turismo de Lisboa tem vindo a apostar nos últimos anos no incoming, estratégia muito alavancada na parceria com a TAP e com as unidades hoteleiras e que todos concordam ser o caminho a seguir. «Temos de promover ainda mais Portugal nos mercados internacionais, trazendo até nós, através da BTL, os potenciais buyers que depois possam levar o nome do nosso país até outros mercados», foi a opinião expressa com a qual todos concordaram. Ao mesmo tempo, alguém referiu que «há na BTL um gastar de recursos sem grande interesse, sem que depois se vejam grandes resultados, percebendo-se, acima de tudo, que existe ali um forte interesse político. Ou seja, há stands que gastam 200 ou 300 mil euros para marcar presença na feira, investimento esse que não se repercute em número de turistas, pois estes permanecem os mesmos, pois uma vez indirectos, incluem-se os investimentos que as infra-estruturas para os receber são as mesmas». Todos concordam que os três dias da feira dedicados em exclusivo aos profissionais são, de facto, importantes. «Numa óptica de negócio, esses dias são importantes, pelo que, nessa mesma óptica, seria importante que a BTL ganhasse uma projecção semelhante a outras feiras internacionais e que trouxesse, de facto, interesse externo de disposição e de visita». Para os retalhistas, distribuidores e público em geral a feira traz outro interesse, «pois nos dias abertos ao público em geral, não só as entidades e os municípios se dão ali a conhecer, como se processam as vendas directamente aos clientes». Assim, numa óptica de venda, a BTL tem, efectivamente, uma importância acrescida. «Nesta vertente a BTL é, efectivamente, relevante, pois é o início da época de venda onde operadores e as agências apresentam os seus produtos, pois há a perfeita noção de que há muitas pessoas que vêm à feira para efectuar a compra das suas férias».
Mas a importância da BTL não se resume a estes dois aspectos, pois, no que diz respeito às relações “b2b”, o evento também revela a sua importância, «é ali que são debatidas estratégias e delineadas acções em conjunto com os turismos. É ali que percebemos o que fazer e que caminho tomar em cada mercado. Nessa vertente a BTL funciona muito bem». O que leva a uma questão sobre a qual todos concordaram, que é «cada vez mais se nota uma diminuição da presença de turismos e mercados estrangeiros. A representatividade dos mercados internacionais é hoje quase inexistente, pois quase se contam pelos dedos das mãos os stands presentes no Pavilhão 4. Isso diferencia-nos da FITUR e de outras feiras de turismo internacionais». Será que, se a feira voltasse a mudar de data, “colando-se” à FITUR, esta situação mudava? «Para os mercados intercontinentais é mais interessante a feira estar junto à FITUR, porque assim os profissionais brasileiros e os norte-americanos faziam um dois em um. Era importante reflectir sobre isto, como é igualmente importante perceber o motivo do aumento exponencial dos bilhetes, tanto para os visitantes como para os expositores.» Marcas e empresas que nos outros anos investiam bastante em bilhetes para oferecer a clientes e a colaboradores, este ano não tiveram capacidade para o fazer devido ao aumento do preço. «Isso reflectiu-se, obviamente, na fraca presença dos profissionais do sector que lidam directamente com o público, bem como na descida de visitantes, realidade bem visível através dos números revelados pela organização da feira.» Uma inovação que recebeu de todos um forte aplauso é a bolsa de emprego, «as empresas ali representadas foram bastante procuradas pelos inúmeros jovens que se deslocaram à feira com o intuito de ali tentarem procurar o seu emprego. Esta é uma boa aposta que deve ser, de futuro, ainda mais incentivada e incrementada, tanto junto das empresas, como junto das escolas e do público que procura trabalho no sector».
A necessidade da existência de uma feira de turismo nacional emblemática é algo com o qual todos concordam, pois a presença de buyers internacionais é importante, assim como o é a troca de contactos entre profissionais, nacionais e estrangeiros. Por isso, «é preciso que todos façam a sua parte, de modo a fomentar e a incrementar a importância da feira no calendário internacional de eventos de turismo».
O que esperar de 2019?
Dado já estarmos no início do segundo trimestre, importa perceber como será que os players perspectivam o resto de 2019. «Este não é de todo um ano fácil, entre o aeroporto e outras questões esperamos conseguir os melhores resultados possíveis.» Há entre todos os participantes neste debate um certo cepticismo relativamente ao ano de 2019, «se este Verão acontecer o mesmo que no ano passado, vai ser mesmo muito complicado, pois não há milagres». Todos partilham a expectativa de ver as melhorias a nível operacional que as obras no Aeroporto Humberto Delgado vão trazer, «mas é um risco, pois as companhias estão a incrementar rotas e frotas para o Verão e se o aeroporto volta a falhar, a situação pode revelar-se bastante complicada».
A juntar às dificuldades logísticas, todos juntam outra, o SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras). «Não podemos esquecer que é cada vez mais complicado passar a fronteira, com situações diárias verdadeiramente caóticas de entrada no país. É preciso mais elementos do SEF, sendo que para isso é preciso rapidez, pois esta é uma contratação pública que leva sempre bastante tempo a concluir.» E aqui entra outra questão preocupante, o Brexit. «Na verdade, o Brexit não vai ajudar nada a esta situação, já de si complicada», ouve-se em comentário, «pois ainda vai concentrar mais toda a zona das chegadas de espaços fora da Europa». De facto, há quem já sinta de alguma forma determinadas repercussões, «temos os grupos de MICE cada vez mais pequenos, ou seja, com menos participantes e a razão que nos dão é pelo facto de não terem avião, seja porque os preços dos bilhetes estão muito mais caros, seja porque não conseguem lugar, pois não há capacidade aérea». Relativamente ao primeiro trimestre, os resultados do MICE até podem estar acima do ano passado, mas com grupos muito mais pequenos. Mas o problema não se cinge ao aeroporto de Lisboa, pois o da Madeira também gera grandes constrangimentos, «se a situação se revelar como no ano passado vamos ter dias complicados, com mais irregularidades do que ver clientes a chegar».
Apesar de, para todos, os resultados estarem em linha com o expectável e sempre positivos, a verdade é que são hoje mais difíceis de alcançar do que o eram, por exemplo, no ano passado. «Este está a revelar-se um ano muito mais desafiante, pelo que estamos muito expectantes para perceber como se vai desenrolar até ao final do ano.» A verdade é que, enquanto a economia estiver favorável e não der indícios de recuo ou abrandamento, o outgoing vai continuar a funcionar bem, «estão a surgir novos mercados, assistimos ao regresso de mercados de “mass market” que tinham deixado de funcionar, como o Egipto, pelo que tudo isso ajuda ao consumo, nomeadamente da viagem massificada».
Relativamente ao Norte, mais concretamente ao Porto, o problema do aeroporto ainda não se coloca, pelo que, «sobretudo em lazer, foi um mercado que cresceu bastante ». Outro dos segmentos que também tem trazido bons resultados à Invicta é o MICE e o corporate, «com os grupos a descobrirem a cidade e a escolherem-na para as suas viagens de incentivos e negócios». Já o Algarve tem-se revelado um mercado consistente, com resultados positivos em linha com o esperado. Mas, é preciso cuidado e atenção, pois «vemos os dois principais mercados da região a alterar comportamentos, pois o mercado alemão está de regresso a destinos como a Turquia e o Egipto, e o mercado inglês sofre com a indecisão do Brexit». Não será solução ir buscar clientes a outros mercados emissores? «Não será nunca a solução, porque, para o fazer, teríamos de baixar preços, não só nos hotéis como no golfe, algo que não é viável em termos de resultados. Talvez o mercado asiático pudesse ajudar a colmatar esta situação, mas teríamos de lhe prestar mais atenção, algo que ainda não acontece.»
A realidade é que os mercados alternativos não estão na Europa, «não são estes que vão compensar as perdas que estamos a sofrer com os mercados alemão e inglês, por isso talvez seja, efectivamente, importante olharmos, em conjunto, para os diferentes mercados asiáticos».
Olhando para 2019, a conclusão é «se conseguirmos fazer os mesmos resultados que em 2018, ficamos todos contentes, pois será um ano razoável».
Artigo publicado na edição n.º 274 de Maio de 2019.