Ao sabor das marés na Jangada da Ericeira

Sair dos grandes aglomerados de pessoas nunca nos soube tão bem como nestes estranhos tempos que vivemos. E a pouco mais de meia hora de Lisboa fomos descobrir um refúgio que muitos ainda desconhecem (e perdoem-nos aqueles com os quais estamos a cometer a inconfidência de revelar o segredo).

É na Ericeira, a meia dúzia de passos da praia do Sul, que nos aguardava o Jangada. O restaurante está inserido no hotel You and the Sea, mas tem porta aberta para a rua e faz questão de receber com o mesmo entusiasmo hóspedes e não-hóspedes.

O espaço estava bastante composto e deram-nos a escolher uma mesa no meio da sala ou uma outra, alta, paredes meias com a cozinha, aberta para o restaurante. Depois de uma pequena hesitação, percebemos que os sons da equipa de cozinha não seriam problema para a conversa à mesa. E apesar de mesas e cadeiras altas, a verdade é que eram tão confortáveis como se estivéssemos ao nível considerado normal.

Sabíamos de antemão que a casa apostava em paladares regionais e inspirados no mar. Mas se não for esse o seu mood, ou se se fizer acompanhar de crianças, há pizzas caseiras, feitas com massa de fermentação longa e cozinhadas em forno de lenha, que competem pela atenção dos comensais.

Entregámo-nos nas mãos do chef André Rebelo, depois de assegurarmos não ter qualquer intolerância alimentar.

Começou por nos chegar à mesa o couvert com uma foccacia de lamber os dedos (se não estivéssemos num local público). Logo lhe seguiu um croquete de pato suculento. Recomendamos que para sentir em pleno o pato comece por provar sem a mostarda que o acompanha que é deliciosa e talvez por isso abafa um pouco a grandiosidade do croquete.

Ainda na etapa entradas, o chefe brindou-nos com o camarão salteado que casa (e muito bem!) com as amêndoas torradas. Já o pesto que os acompanha, deliberadamente ou não, não sabemos, não se sente na união de todos. Mas nada se estraga e com o pãozinho escorrega que é uma maravilha.

E em terra com tanta costa o senhor que se seguiu foi o polvo. E era tal a suavidade que quase não precisava de ser mastigado. No mesmo prato encontramos um croquete que em tudo se revela diferente, indo buscar sabores às saladas de polvo tradicionais das zonas costeiras. A receita dos croquetes, conta-nos o chefe, tinha como objectivo aproveitar partes geralmente menos bonitas do polvo para ir para o prato (como a cabeça). Já o bulgur, uma estreia para mim, foi cozinhada, dizem-me, com romesco. Provado e aprovado.

Chegava, então, o ex-libris do restaurante, o arroz de sapateira e camarão tigre que leva o nome da terra: eRICEira. E foi sem palavras que ficámos, tal a perfeição de sabores e a cremosidade do arroz até ao último bago. Mas não se deixe enganar quando lhe disserem que o molho picante (que vem à parte) não é forte. Prove, mas a medo.

E como estamos em Portugal e uma refeição nem sequer acaba se não se comer um docinho, chegou a pavlova que se nos conquistou só com o olhar, haveria de nos arrebatar as papilas gustativas. Deve ser o que chamam de céu na terra.

Texto de Maria João Lima

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