Cão que ladra tem de começar a morder
Por Teresa Verde Pinho, Criativa sénior na AKQA de Portland
Entrevistador imaginário:
Os criativos estão sempre à procura de arriscar. Querem que o director criativo escolha a ideia mais ousada, que o cliente embarque na proposta mais diferente. Mas na hora de produzir, será que eles próprios se atrevem?
Eu, na realidade:
Tenho reparado que a maioria dos criativos escolhe os/as realizadores/as dos seus filmes com base nos seus trabalhos anteriores, ou seja, no que já consta no portefólio, guiando-se pelo que já provaram que conseguem fazer. Pessoalmente, não acho que essa seja a melhor maneira de decidir.
Salvo raras excepções, como em categorias que exigem habilidades técnicas específicas – por exemplo, filmar carros, comida ou cenas subaquáticas – não vejo o porquê de nos limitarmos dessa forma. Aliás, acho até que pode ser prejudicial para o filme, ou, pelo menos, que não nos permite explorar todo o potencial que o anúncio poderia ter.
Se todos pensássemos assim, Greta Gerwig – rainha dos dramas indie – jamais teria tido a oportunidade de fazer “Barbie”, nem George Miller teria saltado do “Porquinho Babe” para o “Mad Max”.
Sugiro que repensem no vosso critério de avaliação e dêem a mesma importância a outras qualidades, além do portefólio. Em primeiro lugar à visão criativa, depois ao entusiasmo, à química, à capacidade de desenrasco, e, por último – mas não menos importante –, às referências de outros.
Adoptando este critério, não só temos a oportunidade de trabalhar com alguém que traz uma perspectiva única, diferente do habitual da categoria, mas também abrimos portas para oportunidades que, de outra forma, talvez nunca surgissem. Isto também porque nenhum criativo que se preze gosta de ficar na mesmice. Um dia queremos fazer manifestos, no outro um filme à la Skittles.
Mas, claro, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Há que ter bom olho para se perceber se as expectativas criadas vão ser cumpridas.
Por isso, digo que, se um dia casar, vou querer alguém que seja especializado em documentários, não em vídeos de casamento.
Artigo publicado na edição n.º 332 de Março de 2024