É essencial reorganizar a oferta turística
Teve lugar no Hotel Dom Pedro Palace, em Lisboa, mais um pequeno-almoço debate dedicado ao turismo. Em cima da
mesa alguns objectivos e desafios do sector.
Texto de Sandra M. Pinto
Fotos de Pedro Simões
Se existe um sector na economia nacional que se tem vindo a tornar decisivo com vista ao crescimento do PIB, do emprego e das exportações, é o sector do turismo. Essa crescente importância é revelada através dos dados mais recentes divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística e pelo Banco de Portugal, os quais confirmam a importância do turismo no crescimento económico do País. De facto, no primeiro trimestre do ano, o PIB registou um crescimento homólogo de 2,8%, o mais elevado dos últimos dois anos. Estes números reflectem a aceleração mais acentuada das exportações face às importações de bens e serviços, onde o sector do turismo é decisivo, tendo o saldo da balança turística registado um crescimento homólogo de 16,3%.
Mas será que está tudo bem no que diz respeito ao sector? Há quem defenda que temos por cá turistas a mais, outros afiançam que a qualidade do turismo desceu e que o crescimento é baseado num turismo “low cost”. Há ainda um longo caminho a percorrer, mas é preciso saber para onde queremos ir e aonde queremos chegar. É preciso definir o posicionamento de Portugal no que ao turismo diz respeito. Vejamos, por exemplo, o Relatório 2016 da ICCA – International Congress and Convention Association, no qual Portugal sobe duas posições e entra no top 10 mundial na organização de congressos e incentivos. Será este um dos caminhos a trilhar?
Este e outros temas serviram de base ao pequeno-almoço que teve lugar no Hotel Dom Pedro Palace, em Lisboa, e onde estiveram presentes: Pedro Ribeiro (director de Marketing e Comercial do grupo Dom Pedro Hotels), Nuno Ferreira Pires (administrador do grupo Pestana), Gonçalo Rebelo de Almeida (administrador do grupo Vila Galé), Rita Alves Machado, (directora de Marketing da Minor Hotels em Portugal), Paula Canada (directora de Marketing da TAP Portugal) e Álvaro Covões (director da Everything is New). Com a finalidade de se alcançar um debate mais aprofundado por parte de todos, foi decidido que nenhuma das intervenções seria atribuída directamente no texto.
A transversalidade do turismo
Uma grande parte dos planos de marketing de muitas empresas com produtos de grande consumo não contemplam o turismo, o que, de alguma forma, «se revela estranho, pois ele é já uma fatia importante dentro do nosso mercado de consumidores».
Assiste-se agora, na opinião dos intervenientes no debate, aos primeiros passos rumo a uma alteração desta situação, pois «há um investimento muito grande na comunicação para o cliente nacional, mas depois esquecem-se do enorme impacto que o consumo por parte dos turistas provoca junto dos respectivos negócios. É essencial que as empresas percebam isto, e que adaptem a sua comunicação também a este género de consumidores ». O impacto do turismo é cada vez maior e cada vez mais transversal a diferentes sectores da economia nacional, pelo que urge perceber que caminho dar a este entroncado de influências, «perante empresas muitas vezes completamente desfocadas. É necessário apelar à sua atenção, pois há muito ainda para retirar deste crescimento do turismo».
Todos concordam que as empresas têm de fazer um plano de activação, cujo enfoque seja no turismo, para poderem aproveitar as mais-valias dos 18 milhões de estrangeiros que nos visitam actualmente.
Qual a estratégia?
Este vai voltar a ser um ano em grande no que ao turismo diz respeito. Portugal tem já cinco grandes áreas turisticamente bem cimentadas, são elas Lisboa, Porto, Algarve, Açores e Madeira, todas bem estruturadas e com capacidade quase total no que respeita a números de turistas recebidos. Importa agora questionar qual o próximo passo? Devemos apostar no incremento de mais regiões ou devemos apostar em turismos temáticos? Ou seja, qual deverá ser a estratégia para o futuro e de que forma deverá ser implementada com o objectivo de fazer com que os turistas regressem ao nosso país?
A palavra-chave com a qual todos concordaram e que deverá ser a base da estratégia de futuro no sector é conteúdos. «Tudo deverá estar alavancado na criação de conteúdos e com isto quer dizer-se eventos, ou seja, motivos que façam com que as pessoas queiram voltar, e simultaneamente no incremento de novas áreas nos destinos que ainda não foram muito exploradas.»
As entidades responsáveis deviam dar mais atenção a determinados aspectos, pois, como o exemplo referido, «com a extensa costa que Portugal possui devia existir uma “route 66”, que levasse os turistas a descobrir de uma forma ordenada o melhor que esta parte de Portugal tem para oferecer, mas tal não acontece, não há uma linha condutora, turisticamente falando, que mostre aos turistas tudo o que podem ver». A inexistência de produtos foi algo com que todos concordaram, «como, por exemplo, o turismo equestre, algo que pura e simplesmente não existe, apesar de termos o famoso cavalo lusitano, mas nem sequer os criadores estão agrupados».
Mas esta afirmação gerou outra, quando um dos intervenientes referiu que «este não é um problema das autoridades oficiais, é sim uma questão das entidades privadas que não se organizam, o que revela que não sabem colocar o seu produto no mercado do turismo». Opinião contrária ouviu-se também quando alguém afirma que «as entidades públicas excluem os privados, pois não organizam a oferta, veja-se os números inacreditáveis do “Visit Lisboa”, que em Maio teve 57 mil visitantes e em Abril foi de 53 mil, isto diz muito do que se passa». O papel das entidades é exactamente esse, «organizar e promover a oferta incrementada pelos privados e mostrar ao consumidor: o que nós temos para oferecer é isto, agora escolham»!
Mas todos concordam que tal não acontece, «muito devido ao facto de não haver budget para isso, o Turismo de Portugal não tem orçamento para fazer e incrementar uma campanha desse género e com a envergadura que era desejável e necessária».
A repartição de Portugal em tantas regiões também não vem ajudar «à inexistente estratégia nacional para o turismo, apesar de o produto em muitas destas regiões até ser bom, mas não tem escala e não está estruturado». Falha e muito a comunicação, sendo que o que é bom não é comunicado aos consumidores, aos turistas, «talvez se fosse tudo concentrado numa única entidade a comunicação funcionasse, talvez fosse mais fácil» – esta a dúvida/ /questão que fica no ar. Conclusão «tem de haver alinhamento estratégico nacional, temos de estar todos juntos e focados nisso» e isto é uma decisão política.
E o futuro?
É inegável que o turismo é um dos principais responsáveis pelo crescimento económico que estamos a assistir em Portugal, mas é preciso fazer mais, ou, como alguém referiu, «é essencial reorganizar a oferta».
Para isso é necessária a existência e divulgação de dados concretos: «É preciso saber o que tem mais peso aquando da tomada de decisões: quem nos visita, por que nos visita, quais as razões por que regressa ou poderá regressar. Depois é necessário existir alguma concentração de budget para descentralizar a sua distribuição, de modo a ganharmos escala. Antes disso tudo, é imprescindível «mapear quem está a entrar nas nossas fronteiras».
Todos os anos entram 25 milhões de pessoas em Portugal que, quando saem, não deixam informações, «e essas são essenciais para que possamos voltar a contactá-las, criando nelas o desejo de visitar novamente Portugal». É necessário ter esses contactos (nome, email e país de origem) para fazer uma campanha de «repeat Portugal, algo que não acontece e é pena».
Sinais de alerta
Perante os bons resultados alcançados no sector, será que já se adivinham sinais de alerta para a mudança desta “boa onda” que atravessa o turismo nacional?
«A capacidade do Aeroporto de Lisboa pode tornar-se um forte sinal de alerta para uma situação que se pode vir a revelar muito complicada», podendo neste Verão acontecerem grandes constrangimentos, sendo esta uma opinião unânime dos presentes.
Uma solução é a abertura do aeroporto à noite, sendo que «esse alargamento do horário poderá, efectivamente, ajudar ao descongestionamento, mas levanta problemas ambientais ». Este é para já a grande questão quando se fala em sinais de alerta, no que diz respeito ao turismo, sendo um tremendo desafio para os players e as autoridades competentes.
Entretanto, devia ser incentivada pelas autoridades competentes a utilização das outras fronteiras, sejam elas terrestres ou marítimas. Outro sinal de alerta é o decréscimo de alguns mercados, «como o francês, que já se sente, e o britânico, num futuro próximo», especialmente os clientes “all inclusive”, que não encontram esta oferta no nosso país. Daí a necessidade de comunicar e de crescer ainda mais noutros mercados, como o norte-americano ou do Norte da Europa.
Artigo publicado na edição n.º 253 de Agosto de 2017.