Um anúncio de uma marca automóvel no supermercado ao lado de bananas? O retail media é para todos

Forum Retail MediaNotícias
Daniel Almeida
15/10/2025
19:36
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15/10/2025
19:36


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Ao contrário do que se possa pensar, o retail media não é apenas direccionado para as marcas FMCG (bens de grande consumo), mas sim um canal que pode gerar um alcance incremental para todos os anunciantes – mesmo os que não têm produtos nos lineares dos supermercados. A garantia foi dada por Maurits Priem, VP Monetization Europe & Indonesia da Ahold Delhaize: «Por que não pode haver um anúncio de uma marca automóvel ao lado das bananas num supermercado? Temos de mudar o paradigma. Não há nenhuma razão para as marcas não endémicas não usarem o retail media.»

O gestor, que representa um dos maiores grupos internacionais de retalho alimentar, marcou presença no Fórum Retail Media, promovido pela Marketeer, ao lado de Carlos Paulo, managing director da Endless. No palco do Vila Galé Ópera, os dois responsáveis mostraram as vantagens do retail media para anunciantes dos mais variados sectores de actividade.

De resto, este é um trabalho que a Ahold Delhaize tem vindo a desenvolver ao longo da última década. Com mais de 150 anos de existência e 11 mil lojas distribuídas pelos EUA, Europa e Ásia, o grupo de retalho alimentar começou há cerca de 10 anos a criar a sua rede de retail media. «Quando começámos, não encontrámos ferramentas tecnológicas avançadas de retail media e fomos arrogantes o suficiente para pensar que talvez pudéssemos fazê-lo por nós próprios. E assim o fizemos: comprámos uma empresa de adtech e construímos as nossas próprias soluções de retail media», recorda Maurits Priem. Hoje, o grupo tem cerca de 400 pessoas alocadas a esta área e «uma base de dados muito extensa que permite testar» novas campanhas e soluções, sejam em ambiente de loja, canais digitais (como website, app, CRM e emailing) ou até mesmo offsite (fora das suas plataformas próprias).

Pegando na analogia da marca automóvel que coloca um anúncio ou cria uma activação na secção dos frescos, Maurits Priem – que, antes de integrar a Ahold Delhaize, esteve mais de 20 anos no lado das marcas – explanou que o desafio tem sido mesmo o de mostrar, com resultados práticos, os benefícios do retail media, mesmo para as marcas que não têm qualquer relação, neste caso, com o ramo do retalho alimentar. «Temos marcas não endémicas na nossa rede de retail media. E voltam sempre. Porquê? Porque resulta.»

Então, quais os benefícios que as marcas têm em promover-se nos canais publicitários das retalhistas? O VP Monetization Europe & Indonesia da Ahold Delhaize destacou três grandes vantagens. A primeira está relacionada com o alcance. Um estudo realizado pela multinacional em mais de mil lojas nos Países Baixos, e que envolveu mais de 15 mil consumidores e 120 campanhas, permitiu concluir que o retail media gera um alcance incremental entre 7 e 8% para os anunciantes. «O alcance único aumentou. E vimos um impacto não apenas no ROAS (retorno sobre o investimento publicitário), mas também no branding, na marca. O retail media desempenha um papel em toda a jornada do consumidor», explanou o responsável. Nesse sentido, defendeu, é preciso mudar este paradigma cultural de que «o spot televisivo tem o maior alcance e a publicidade em loja é menos relevante. Isso está simplesmente errado.»

Em segundo lugar, há vantagens relacionadas com brand safety. «O retail media, por definição, é um ambiente seguro para as marcas. Numa rede de retail media não há imagens sangrentas de Gaza, não há fake news nem discurso de ódio. Isto deve ser muito relevante para os marketeers», sublinhou Maurits Priem.

Por fim, vários estudos mostram que quando as pessoas estão a comprar algo (ou seja, quando estão num “shopping state of mind”), seja em lojas físicas ou online, estão mais abertas e susceptíveis a assistir a anúncios publicitários. Ora, isto torna o retail media um canal mais atractivo do que muitos canais tradicionais.

«Temos um negócio muito interessante para os anunciantes não endémicos. Então, experimentem. Testem. E garantam que têm as métricas certas», desafiou.

Quebrar os silos corporativos

Mas, como podem as marcas construir uma boa estratégia de retail media? Para Maurits Priem, se o retail media tem impacto ao longo de todo o funil de marketing (notoriedade, consideração, conversão e lealdade) – como foi reforçado ao longo de toda a manhã –, então essa estratégia deve envolver vários departamentos, desde o Marketing às Vendas, passando pelo e-Commerce, o Trade, entre outros. É importante «mandar abaixo os silos» que possam existir dentro da organização e garantir que todas as pessoas tenham um pensamento centrado no consumidor (consumer-centric).

No entanto, na maioria das vezes, a estratégia acaba por estar compartimentada e a publicidade no retalho é desconsiderada – mesmo sabendo-se a posição estratégica e o profundo conhecimento que as retalhistas têm sobre o consumidor. «Se alguém está no autocarro a navegar nas redes sociais com o seu telemóvel, o trabalho das equipas de social media é captar a sua atenção. Depois, essa pessoa sai do autocarro para a rua e as mensagens que vê nos outdoors estão também dentro do eixo de actuação dos marketeers. Então, por que é que, a partir do momento em que entra numa loja, já não querem saber dele? De repente, passa a ser responsabilidade da equipa de Vendas?», questionou. E foi mais longe, apontando que «muitas vezes, a criatividade que vemos em ambiente de loja não é assinada por profissionais seniores, mas por estagiários.»

Assim, defendeu, urge mudar a estrutura corporativa e, para isso, as marcas devem disponibilizar as ferramentas para que os mais variados departamentos possam trabalhar em conjunto. Porque numa estrutura organizada por silos, cada departamento tem as suas próprias ferramentas, dados, métricas, até linguagem. «Mas há um truque de gestão: se querem ter duas equipas a funcionar em conjunto, dêem-lhes um objectivo comum», aconselhou.

Além disso, Maurits Priem incentivou as marcas, de FMCG e não só, a exigirem às agências com as quais trabalham que tenham um conhecimento mais profundo sobre o funcionamento do retalho, porque só assim podem aconselhá-las a investirem o seu dinheiro da melhor forma. «Há, sem dúvida, trabalho de casa a fazer por parte das agências e das retalhistas, que também têm silos. Mas é uma decisão superdifícil, porque sabemos que as “negociações” entre as equipas de Marketing e Vendas em torno do budget são sempre complicadas.»

Por fim, o VP Monetization Europe & Indonesia da Ahold Delhaize esclareceu que, do lado dos retalhistas, desenvolver uma boa rede de retail media não é sinónimo de encher as lojas de ecrãs digitais, como se fossem “árvores de Natal”. Para o responsável, este erro tem sido cometido por alguns players no mercado, provavelmente porque as equipas comerciais são pressionadas a ganhar mais dinheiro e aceitam negociar investimentos publicitários em troca de mais espaço dentro das lojas. «O truque para que a vossa loja não se pareça com Times Square é a disciplina e o trabalho colaborativo entre os departamentos de trade e retail media. Se não conseguirem juntar forças, devem pelo menos partilhar os mesmos planos», concluiu.

Texto de Daniel Almeida

Foto de Paulo Alexandrino

*O jornalista escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico




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