Retenção de Talentos: um desafio ou uma necessidade?

Por Catarina Oliveira, directora da Canela Portugal

Segundo um estudo da International Public Relations Network (IPRN), este ano um dos principais desafios das agências de comunicação recai sobre a atracção e retenção de talentos. Portugal não foge à regra, sendo cada vez mais necessário oferecer condições diferenciadoras – que, por sua vez, nos fazem rever quão alinhados estamos com os valores que apregoamos.

Se criarmos estratégias e políticas empresariais que visem a retenção, estamos certamente a chamar a atenção de possíveis colaboradores – a melhor publicidade é feita pelos colaboradores. Quanto mais satisfeitas e felizes as pessoas estão nas suas empresas, mais as recomendam, quer seja em conversas informais ou partilhas nas redes sociais. Os números falam por si: segundo o estudo “Happiness Works 2021”, os trabalhadores felizes faltam menos (36%), têm menos vontade de mudar de empresa (45%) e sentem-se mais produtivos (9%).  Então, o que cabe à empresa fazer para que os seus colaboradores se sintam felizes no local de trabalho?

Se, por um lado, é essencial que o salário, condições de trabalho e segurança estejam assegurados, por outro, é muito importante que os factores motivacionais como a autonomia, reconhecimento e plano de carreira sejam diariamente trabalhados. A conjugação de ambos cria colaboradores realmente comprometidos com a empresa e acredito que este equilíbrio se consegue através da Humanização, Transparência e Comunicação.

Humanização

É essencial olhar para cada um dos colaboradores tendo em conta o seu contexto pessoal e familiar, necessidades, aspirações e valores. A pandemia veio expor de forma dramática esta necessidade, obrigando as empresas a (re)pensar o salário emocional e lidar com a falta de saúde mental à larga escala – segundo o site inglês Small Business Prices, Portugal é o país que cumpre mais horas de trabalho e apresenta os salários mais baixos, tornando-se assim o país com maior risco de burnout. A forma como as empresas gerem estes dois aspectos tem tido um impacto profundo na produtividade e retenção do talento, deixando clara a vontade (ou a falta dela) de dar às pessoas todas as condições possíveis para prosperarem e serem felizes. Por outro lado, a entrada em força da geração Z no mercado de trabalho trouxe toda uma mentalidade a que já se assistia mas ainda de forma envergonhada. Em resumo, as regras do jogo mudaram e a única solução para persistir é adaptarmo-nos a este novo puzzle humano.

O que antes de 2020 era considerado excentricidade típica de startups estrangeiras, felizmente nos dias que correm já é visto como um conjunto de ferramentas e soluções que ajudam a criar e consolidar não só a carreira profissional de cada colaborador como as relações humanas de qualidade dentro de portas:

–        Trabalho remoto e horários flexíveis: nos sectores e cargos em que é possível haver flexibilidade, ir ao escritório todos os dias e cumprir um horário rígido é hoje visto como uma imposição pouco animadora. Sistemas híbridos e adaptados às diferentes necessidades permitem a cada profissional ter um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, gerindo as responsabilidades da forma que mais lhe convier e com autonomia. Saber que o empregador tem confiança de que cada pessoa dá o melhor de si em quaisquer circunstâncias é crucial na hora de ponderar outras oportunidades de trabalho.

–        Dinâmicas enriquecedoras entre colegas: relacionado com o ponto anterior, percebemos que a ida ao escritório é vista como uma oportunidade para criar uma ligação emocional entre os colaboradores e a empresa. Dedicar tempo a fazer brainstorms, formações ou pequenos-almoços de equipas contribui decisivamente para reforçar os valores da empresa e assim criar laços que se  tornam mais  difíceis de quebrar.

–        Actividades de promoção da saúde física e mental: roubando a famosa expressão “mente sã em corpo são”, assistimos ao feedback bastante positivo quando se fala em aulas de exercício físico e sessões de psicologia, coaching ou mindfulness. Seja por logísticas familiares desafiantes ou por limitações financeiras, a possibilidade de dedicar tempo ao bem-estar físico e emocional dá um claro indício do quão comprometidas as organizações estão com as pessoas.

Transparência

Muitas são as empresas que apregoam a transparência como um dos valores corporativos. No entanto, quantas delas se dedicam à transparência interna? Tal como acontece com a reputação externa, basta um rumor sem esclarecimento ou uma informação mal explicada para causar instabilidade interna e, com ela, abalar a confiança dos colaboradores. Os líderes precisam de dedicar tempo e energia a garantir que são claros nas mensagens que passam e que partilham de forma convicta a missão, visão e objectivos. Destaco duas formas que têm sido essenciais para mim de o conseguir:

–        Cartas em cima da mesa desde o primeiro dia: um processo de onboarding adequado deve incluir temas técnicos e práticos, como também uma viagem imersiva pela história, valores e desafios pelos quais a pessoa está a dar a cara. Esta honestidade será profundamente apreciada e permite confirmar que ambas as partes fazem fit, aumentando em grande medida a possibilidade de se criar uma relação verdadeira e duradoura.

–       Literacia financeira precisa-se: tirando os quadros superiores, quantas pessoas dentro das organizações sabem os objectivos financeiros e acompanham a sua evolução? Sim, os colaboradores querem e precisam de saber noções de gestão e o estado financeiro da empresa! Ter pessoas empoderadas a este nível faz com que se sintam motivados em tempos de bonança e que tenham um ímpeto muito maior para vestir a camisola e arregaçar as mangas  em momentos de crise.

Comunicação

A comunicação dá forma à humanização e transparência e apostar na comunicação interna é tão ou mais importante quanto a externa. Os colaboradores devem ser os primeiros a saber o que se passa na empresa, sejam alterações de estratégia, lançamentos, incorporações ou campanhas criativas. O poder do reconhecimento sente-se, vê-se e mede-se. Por exemplo,  se uma empresa e respectivos colaboradores valorizarem bastante a sustentabilidade e conseguirem uma certificação que a valida como um exemplo nesta área, toda a campanha de comunicação (interna e externa) à volta deste anúncio contará com muito engagement da equipa. É, por isso, essencial investir numa equipa que se esforça para melhorar a forma de nos relacionarmos dentro de portas e assim aumentar a probabilidade do talento continuar na empresa. Alguns exemplos:

–        Plano de carreira mensurável e revisto ao longo do ano: os inícios do ano são normalmente marcados por reuniões de planos de carreira. Será que, no final, todos sabem para onde querem ir e como lá chegar? Sou defensora de que, tal como os planos dos clientes também os nossos pessoais devem ser medidos e a evolução deve ser registada de forma a fazer uma boa gestão de expectativas quanto à evolução. Muitas pessoas acabam por sair por se sentirem perdidas e mal acompanhadas quanto à progressão de carreira.

–        Feedback bidirecional com sugestão de soluções: se é expectável que um líder dê feedback a uma equipa ou colaborador em particular, já o contrário é muitas vezes visto como um acto de “suicídio corporativo”. Na medida em que todos erramos e precisamos de tirar aprendizagens das situações, é essencial que haja um ambiente seguro onde cada pessoa se sinta confiante em dar a sua opinião sobre qualquer colega e aponte soluções alternativas, independentemente da posição que ocupa. Tendo o respeito e empatia como base não negociável destes momentos, é possível e recomendável que se treine esta nova forma de interagir mais transparente onde todos crescem e reforçam o sentimento de pertença.

–        Partilha de boas notícias: seja no escritório, por email, skype ou qualquer outra plataforma, é essencial que os líderes das equipas dediquem tempo a reconhecer de forma pública o bom trabalho feito. “Obrigada” e “parabéns”, expressados de forma sentida, são a fórmula mais simples de chegar verdadeiramente ao outro.

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