“Os consumidores não compram apenas produtos. Compram valores e benefícios”, Kyryl Lakishyk, Professor da Católica-Lisbon

Notícias
Maria João Lima
14/08/2025
10:30
Notícias
Maria Joao Lima
14/08/2025
10:30


Partilhar

Depois de uma manhã a ouvir muitas ideias sobre ferramentas, personaliza-ção e gémeos digitais, era chegada a hora de Kyryl Lakishyk, Associate Dean and Marketing Professor da Católica-Lisbon, subir ao palco do Sagres Campo Pequeno salientando que, apesar da ansiedade que se sente entre marketeers, os profissionais da área estão sempre em busca de algo novo. «Estamos sempre entusiasmados com os novos brinquedos, quero dizer, ferramentas», disse arrancando sorrisos da plateia. Fazendo uma viagem a exemplos de anúncios do último século e comparando-os com anúncios actuais, gerados por IA, refere que se percebe que há algo que falta.

«O que falta é o suporte emocional que os outros tinham.» Isto porque havia um ser humano real por trás. Sendo honesto, Kyryl Lakishyk salienta que os anúncios gerados pela IA serão tão bons quanto os prompts de quem os cria. E ainda que seja rápido e relativamente fácil gerar “criatividades”, o professor da Católica é de opinião que, apesar de sugerirem ideias, «nem todas elas devem ver a luz do dia». É que, insiste, o anúncio será tão bom quanto a pessoa que está a fazer. E defende que será o ser humano por trás do prompt que vai fornecer a base emocional, ou seja, o significado.

«No mundo onde o conteúdo se torna obscenamente disponível, em segundos, o significado torna-se escasso.» Mas esta não é uma luta apenas deste sector. Lembrando a indústria cinematográfica, que viu um enorme aumento nas capacidades tecnológicas do que pode fazer (já depois dos ecrãs verdes e azuis), com experiências imersivas e câmaras a captar as performances dos actores, também aqui alguns deviam permanecer sem ver a luz do dia, notando-se «um cansaço de toda a automação, de todos os recursos visuais». Resultado: filmes que não são bons e dos quais nem sequer se ouve falar. Portanto, apesar de todas as possibilidades técnicas e com a facilidade de gerar conteúdo, importa que os criadores pensem no significado que estão a dar às suas peças. Kyryl Lakishyk faz notar que no mundo do marketing, automação e IA, o que se mantém constante são as marcas.

«Desde que não mexa muito no logótipo ou o desenvolva, será uma presença constante. O que os consumidores vivenciaram, aprenderam, viram e experimentaram sobre as marcas ficará nas suas mentes. E é esse o activo que continua a dar retorno.» O professor acrescenta que indo aos fundamentos, perce-be-se que, quando se posiciona, desenvolvem-se estratégias e foca-se nas características do produto. «Concentramo-nos nos benefícios que esses recursos oferecem. Concentramo-nos nos valores que esses benefícios estão a criar.» E isso consiste numa evolução no marketing na última década a partir da base em que se posicionavam as marcas em apenas uma afirmação, passando depois aos benefícios. Percebeu-se que os benefícios têm um poder mais duradouro.

«Podemos alterar produto, desde que ofereça os mesmos benefícios. É isso que se cria na mente do consumidor.» É nesse espaço que se criam marcas. Enquanto um produto se posiciona com base nas características, atributos e benefícios, as marcas assentam em benefícios e valores. E estes são duráveis.Kyryl Lakishyk lembra que, no contexto da IA, as capacidades tecnológicas vão mudar. «Mas aquilo a que precisamos de prestar atenção é ao que queremos que as nossas marcas digam aos consumidores. Porque os consumidores não com-pram apenas produtos. Compram valores e benefícios.» Trazendo para o palco da Conferência da Marketeer o modelo de Kano, o professor lembra que este foi inicialmente desenvolvido para compreender como os consumidores reagem às características do produto.

Por um lado, está o compromisso/desenvolvimento da marca com as características e, por outro, o entusiasmo dos consumidores com as mesmas. Pensando em qualquer produto, é possível analisar as suas características em comparação com os seus concorrentes e localizá-lo em um de três grupos: “basic tools”, “performance” e “delighter tools”. As “basic tools” são absolutamente inegociá-veis. «Se quer estar legitimamente nesta categoria, precisa de ter isto», explica o professor. São características básicas, por mais que ofereçam aos consumidores, não os vão entusiasmar. Esperam por isso e normalmente não falam com as marcas sobre isso, excepção feita a quando não as tiverem e aí vão queixar-se. «Imagine clicar na sua aplicação e esta não descarregar ou um link não funcionar. Isso vai gerar insatisfação.» Asseguradas as “basic tools”, há que avançar para factores de “performance”. É aí que a competição entre concorrentes decorre. Aí estão os atributos, os recursos que estão a entregar no momento aos consumidores e funciona a lógica do quanto mais, melhor.

No último nível da conquista pela satisfação dos consumidores estão as “delighter tools”. É algo inesperado, algo sobre o qual os consumidores não falaram porque não sa-biam que queriam. «Em qualquer categoria, temos estes três grupos. E, à medida que o tempo passa, os factores de “performance” tornam–se “basic tools”. Fazem a transição para se tornarem algo que todos têm. E as “delighter tools” tornam-se as de “performance”», explica Kyryl Lakishyk, salientando que isso nos mantém constantemente à procura de coisas novas. Esta transição de constante evolução é basicamente progresso e evolução.

Adaptando este modelo às novas ferramentas que o marketeer tem no contexto do consumidor, o professor da Católica explica que as basic tolls são, neste momento, a personalização, as recomendações preditivas, os chatbots e o retargeting. «Ninguém está entusiasmado com o Tobi, o chat da Vodafone, certo? Só recebe reclamações quando não funciona. Quando a Zalando sugere o par de sapatos que já comprou, fica chateado. Mas quando a recomendação funciona, fica-se bem, mas não muito entusiasmado com isso», dá como exemplos.

Quando falamos de “performance”, Kyryl Lakishyk lembra que a concorrência e a evolução estão a levar as marcas para ferramentas como smart segmentation, testes A/B em larga escala, inteligente media mix modeling. «Quando o Spotify oferece descobertas diárias, estas baseiam-se em microsseg-mentos de gostos semelhantes.» E depois existem ferramentas mais prazerosas para os con-sumidores, as “delighter tools”. São as narrativas em tempo real, as campanhas que evoluem com o feedback do público e os agentes de voz com personalidade.

Não apenas o chatbot, mas algo a interagir com os consumidores. O Associate Dean da Católica-Lisbon desafiou os marketeers presentes no evento (e aqueles que assistiam via streaming) a olhar para estas três categorias e perguntarem-se: Onde estamos? Quais são as ferramentas básicas actuais? Onde está a concorrência? E quais são as novidades que estamos a ver?

E a nunca esquecerem que «num espaço em constante evolução, onde a concorrência está a acontecer, onde as ferramentas estão a tornar-se disponíveis, a voz da marca importa. Precisa de ter alma. E a alma vem dos marketeers que são aqueles que criam significado».




Notícias Relacionadas

Ver Mais