Por Sandra Alvarez, directora-geral da PHD
O público já não olha para a publicidade da mesma forma. A geração mais jovem, habituada ao ritmo fragmentado do TikTok e ao imediatismo do Instagram, rejeita anúncios tradicionais, ignora pop-ups e instala bloqueadores. O cansaço em relação à publicidade invasiva é evidente. Mas, paradoxalmente, nunca se consumiu tanto conteúdo de marca como hoje. É nesse contexto que surge uma nova tendência: os social sitcoms, pequenas séries narrativas feitas para redes sociais, que se apresentam como entretenimento, mas são, na realidade, criadas e financiadas por marcas.
A lógica é simples: em vez de tentar interromper a atenção das pessoas com anúncios de 20 segundos, as marcas procuram conquistar minutos – ou mesmo episódios inteiros – através de histórias. São sitcoms no sentido clássico, com personagens fixos e situações do quotidiano, mas adaptadas ao consumo rápido das plataformas digitais. Um dos exemplos mais comentados é “Roomies”, produzido pela fintech Bilt, que lançou uma série no TikTok e no Instagram, onde o produto praticamente não aparece. Só um olhar atento descobre que, afinal, aquela sitcom é também publicidade.
À primeira vista, este modelo parece responder a uma exigência clara: autenticidade. O público não quer ser impactado por publicidade, quer ser entretido. Os social sitcoms oferecem isso mesmo: narrativas que criam hábito, personagens com quem se cria empatia e a sensação de que não estamos a ver um anúncio. Ao contrário de uma campanha isolada, este formato constrói uma relação de longo prazo com a audiência. Em vez de “vender”, conquista-se tempo e afinidade.
Mas há uma linha ténue que não pode ser ignorada: até que ponto isto não é apenas publicidade disfarçada? Se o consumidor não se aperceber que está perante branded content, será que não estamos a entrar em território de manipulação? Em Portugal, a lei obriga a identificar conteúdos patrocinados, mas a aplicação desta regra nem sempre é clara quando falamos de narrativas ficcionais. O risco é real: uma audiência que se sinta enganada pode rejeitar não só o conteúdo, mas a própria marca.
É aqui que reside o verdadeiro desafio. Os social sitcoms não são um truque para enganar consumidores, mas podem sê-lo se forem usados sem transparência. O seu valor está em representar a evolução natural do branded content: contar histórias que entretêm, que fazem sentido por si mesmas, mas que têm uma marca como motor criativo. O segredo não está em esconder a marca, mas em integrá-la de forma subtil e relevante, sem forçar a ligação.
Se bem executados, os social sitcoms podem ser uma poderosa ferramenta de construção de marca, capaz de gerar lealdade e de transformar audiências em comunidades. Se mal executados, tornam-se rapidamente naquilo que o público mais detesta: publicidade disfarçada.
Na era da atenção fragmentada, talvez o maior desafio das marcas já não seja vender um produto, mas escrever um guião que mereça ser seguido.
Artigo publicado na revista Marketeer n.º 351 de Outubro de 2025














