Opinião de Afonso Cruzeiro (L’Oréal Portugal): Tribos, não targets

Opinião CE
Marketeer
27/09/2025
11:12
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Por Afonso Cruzeiro, Go-to-Market director da L’Oréal em Portugal

As marcas que ainda pensam em “targets” arriscam-se a falar para ninguém. No futuro, quem não pertencer a uma tribo, desaparece do mapa.

Durante décadas, o marketing viveu obcecado com targets. Criávamos perfis-tipo, desenhávamos “personas” e acreditávamos que conhecíamos ao detalhe o nosso consumidor. Idade, género, localização, rendimento, tudo encaixado em gavetas bem definidas. Mas o mundo mudou. Hoje, o consumidor não quer ser “alvo” de nada. O consumidor quer pertencer.

Vivemos na era das tribos, dos grupos unidos por valores, interesses, causas e estilos de vida que transcendem geografias e demografias. Uma pessoa em Lisboa pode sentir-se mais próxima de alguém em Tóquio que partilha a mesma paixão pela sustentabilidade, pelo gaming ou pela cosmética vegan do que do vizinho do lado. É no seio destas tribos que nascem conversas, tendências e lealdades verdadeiras.

As redes sociais aceleraram esta transformação. Plataformas como o Discord, o TikTok ou o Reddit não se organizam por idade ou género, mas por afinidades e narrativas. E é dentro destas microcomunidades que o marketing mais eficaz acontece, não porque uma marca aparece, mas porque participa. A diferença é subtil, mas poderosa: estar com em vez de falar para.

No grande consumo e na beleza, vejo esta mudança todos os dias. Lançamentos bem sucedidos não se limitam a campanhas massivas; nascem de colaborações com comunidades específicas, da co-criação de produtos e de activações que dão voz aos membros dessa tribo. Um bom exemplo é a gama Curl Expression, da L’Oréal Professionnel, criada em parceria com hairstylists e influenciadores especialistas em cabelo encaracolado. Mais do que vender um produto, o objectivo foi falar a linguagem dessa comunidade, resolver as suas dores e amplificar as suas vozes – e foi a própria tribo que fez a mensagem chegar mais longe.

Esta abordagem exige humildade e consistência. Não basta criar uma acção pontual, é preciso investir no relacionamento, ouvir, adaptar e, acima de tudo, dar espaço para que a comunidade seja protagonista.

Como defende Seth Godin, em “This Is Marketing”, o futuro passa por servir a “smallest viable audience” com grupos pequenos, unidos por valores comuns, onde a relevância cria confiança e a própria tribo espalha a mensagem.

O futuro do marketing não é disparar mensagens para públicos amplos na esperança de acertar em alguns. É construir relações profundas com grupos mais pequenos, mas muito mais influentes no seu círculo. Porque, no fim, são estas tribos que definem tendências, defendem causas e amplificam mensagens.

Se a era do target nos ensinou a apontar, a era da tribo vai ensinar-nos a pertencer – e, para as marcas, a liderar pelo serviço, não pela afirmação. Essa é uma mudança que não é apenas estratégica, é cultural.

Artigo publicado na revista Marketeer n.º 350 de Setembro de 2025




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