Texto de Margarida Cruz, Head of Digital da Republica.
Vivemos numa era em que os algoritmos moldam silenciosamente a forma como consumimos informação. Desde as redes sociais às plataformas de streaming, passando pelos motores de busca, os algoritmos mostram-nos exatamente aquilo que queremos ver. Esta personalização é confortável, eficiente e, para muitos, indispensável. Mas a que custo?
A promessa da relevância
Os algoritmos funcionam, essencialmente, como filtros inteligentes. Através da análise do nosso comportamento online, como cliques, gostos e tempo de visualização são criados perfis detalhados que permitem mostrar-nos conteúdos alinhados com os nossos interesses e preferências.
Este sistema melhora a experiência do utilizador, poupa tempo e torna mais fácil encontrar informação relevante. Se estamos interessados em ciência, por exemplo, rapidamente somos rodeados por vídeos, artigos e recomendações sobre o tema.
Se gostamos de determinado estilo musical, as sugestões tornam-se cada vez mais afinadas. À primeira vista, trata-se de uma experiência mais rica e personalizada.
A armadilha da redundância
Contudo, há um reverso da moeda.
Quando somos repetidamente expostos a conteúdos semelhantes aos que já consumimos, começamos, sem nos aperceber, a isolar-nos numa bolha informativa. A diversidade de ideias, opiniões e referências culturais vai-se esbatendo, substituída por versões diferentes do mesmo. Este ambiente fechado pode dar origem ao chamado fenómeno da câmara de eco, onde ouvimos apenas vozes que confirmam aquilo em que já acreditamos.
Com o tempo, esta exposição limitada pode também comprometer a criatividade, que precisa de contraste, surpresa e confronto com o desconhecido para florescer. Também o pensamento crítico sai prejudicado, já que deixa de ser desafiado por visões alternativas.
Gradualmente, e quase sem darmos por isso, deixamos de procurar o que é novo para nos refugiarmos no que já conhecemos. A criatividade cresce muitas vezes quando somos expostos ao diferente, ao inesperado, ao contraditório. Os algoritmos, ao privilegiarem a previsibilidade e a afinidade, reduzem o potencial de confronto saudável entre perspetivas distintas. E sem essa fricção, o pensamento tende a estagnar.
Como recuperar o espaço para o novo?
Será possível coexistir com os algoritmos sem cair numa rotina de pensamento previsível e repetitivo? A resposta não passa por rejeitar a tecnologia, mas sim por usá-la de forma mais consciente e intencional. É necessário cultivar uma atitude crítica face à forma como interagimos com o conteúdo digital e, ao mesmo tempo, adotar estratégias que reintroduzam diversidade e surpresa no nosso quotidiano informativo.
Algumas práticas simples, mas eficazes, podem ajudar a contrariar o efeito da bolha algorítmica:
• Diversificar deliberadamente as fontes de informação: sair da zona de conforto e procurar meios de comunicação com abordagens editoriais distintas das que consumimos habitualmente;
• Seguir vozes diferentes: acompanhar pessoas, páginas ou canais com perspetivas diferentes das nossas, não para concordar, mas para compreender;
• Explorar o inesperado: permitir-nos clicar em conteúdos que à partida não escolheríamos, seja por curiosidade ou por puro acaso, quebrando o ciclo da previsibilidade;
• Privilegiar plataformas que favorecem a descoberta: optar por ambientes digitais que valorizam a diversidade e a experimentação em vez de nos fecharem em padrões de consumo repetitivos.
Os algoritmos são ferramentas poderosas mas, como todas as ferramentas, dependem do uso que lhes damos.
Quando utilizados de forma acrítica podem reduzir a nossa visão do mundo. Mas se os enfrentarmos com curiosidade e intenção, podem tornar-se pontes para a descoberta. Em última análise, cabe-nos a nós decidir se queremos viver numa casa de espelhos ou numa galeria de janelas abertas. Afinal, é na mistura improvável de referências que muitas vezes surgem as melhores ideias