Marketeer desvenda “Como devolver o sorriso a Portugal”

A produtividade nacional é preocupante. Estamos a trabalhar muito mais do que devíamos e, mesmo assim, produzimos metade que um alemão, por exemplo. O problema foi salientado por Nadim Habib, administrador da Formação para Executivos e professor na Nova School of Business and Economics (Nova SBE), que teve a seu cargo a abertura da 4ª conferência Marketeer.

“Como devolver o sorriso a Portugal?” foi o tema que norteou o encontro que decorreu, uma vez mais, no Museu do Oriente, em Lisboa.

Ainda que no início o cenário traçado não tenha motivado sorrisos, o mesmo não aconteceu no decorrer da intervenção de Nadim Habib. O profissional considera que «temos motivos para sorrir porque, pela primeira vez, temos de mudar». Nos últimos 40 anos Portugal tem passado por mudanças contínuas, que têm mitigado o caminho com problemas estruturais, destacou. Existem «problemas na gestão de topo», em que o excesso de regras tem colocado entraves à produtividade das empresas, mas o contexto de crise tem levado à extinção daquelas que são «mal geridas», o que deixa às restantes companhias espaço para crescer, defendeu o administrador da Formação para Executivos e professor na Nova SBE.

Outro dos motivos pelo qual os portugueses devem sorrir passa pelo facto de que «hoje somos forçados a empreender», destacou Nadim Habib.

A simplicidade das estratégias traçadas, o foco e o questionar dos processos e a tomada de decisões claras, com vista a um horizonte globalizado, são algumas das chaves do sucesso, continuou o profissional.

«Não vale a pena olhar para cima, para os governos, como criadores de emprego. Devemos olhar para dentro das nossas organizações», defendeu, apontando já um caminho possível, no sentido de identificar «os futuros líderes». «A meritocracia está a chegar ao País. Vai ser doloroso, mas pela primeira vez em 20 anos quem trabalha e é positivo vai poder criar projectos excelentes», terminou.

A «economia das pequenas coisas»

Abertas as hostes da 4ª conferência da Marketeer, chegou a vez de subirem ao palco Carlos Coelho (presidente Ivity Brand Corp.), Guta Moura Guedes (co-fundadora “Experimenta – Associação para a Promoção do Design e Cultura de Projecto”), Miguel Stilwell de Andrade (administrador EDP) e Vítor da Conceição Gonçalves (professor catedrático do ISEG e pró-reitor UTL), para um painel moderado pelos jornalistas Maria João Vieira Pinto e Álvaro de Mendonça. “Como devolver o sorriso aos portugueses?” foi o tema que orientou as intervenções.

Ainda que tenha afirmado que os portugueses «têm vergonha de falar sobre o País e, normalmente, nem o vêem», Carlos Coelho acredita que «o mundo já descobriu que o que é feito em Portugal é bom». Daí que tenha apelado ao desenvolvimento de uma «agricultura de marcas», com vista ao seu crescimento. «Não somos um País pequeno. Temos de refazer a nossa mensagem», advogou o presidente da Ivity Brand Corp., reforçando que Portugal não é um território de «quantidade» mas devia, sim, atrair ao País o consumo daquilo que é exclusivamente nacional, ou «only available in Portugal», explicou.

Por seu lado, Guta Moura Guedes acredita que tanto as gerações mais novas como as mais velhas já ultrapassaram o sentimento de «inferioridade» face ao facto de serem portuguesas. «Estamos a assistir ao desmantelamento da estrutura social do séc. XX e à criação de uma nova estrutura. Os sistemas estão a ser redesenhados e a conferir poder aos mais “unexpected actors”», afirmou. Num contexto em que Portugal «tem uma network única desde os Descobrimentos, que se manteve activa e com um enorme potencial de desenvolvimento», continuou a co-fundadora da “Experimenta”, «não é preciso empreendedorismo», referiu. É preciso, sim, «coragem». «Há que agir. É só isso que falta, termos a capacidade de focar no essencial e rentabilizar o que nos torna únicos».

Perante a questão “Será que o facto de várias empresas portugueses estarem a ser compradas por investidores estrangeiros não nos tira um pouco a auto-estima”, Miguel Stilwell de Andrade, administrador da EDP, foi peremptório: «As empresas não têm de ter fronteiras. É a origem dos colaboradores que a define.»

E «haverá hoje uma geração capaz de fazer a revolução?», questionou o moderador Álvaro de Mendonça. Vítor da Conceição Gonçalves adiantou que «o empreendedorismo não é uma mera panaceia pregada nas universidades». «Deve haver uma maior difusão de competências na gestão da economia», completou. Opinião partilhada por Guta Moura Guedes, que afirmou que «a mudança e o sucesso requerem capacidade de acção e pragmatismo». «É de reforçar a dimensão internacional e cosmopolita da nossa cultura. Há que haver um “merge” entre a economia e a criatividade», asseverou.

Para Carlos Coelho «é preciso criar em Portugal a economia das pequenas coisas». O presidente da Ivity Brand Corp. acredita ainda que as competências do País deviam estar mais distribuídas e não tão concentradas. Num outro ponto, «Portugal não tem de ser um país low-cost», alertou. «Se é bom, tem de ser caro», garantiu.

Na assistência questionou-se se Portugal conseguirá ultrapassar um dia o espírito crítico destrutivo de que, muitas vezes, se faz envolver em relação ao que é nacional. Da mesma forma, será que não vão ficar sempre subjacentes à imagem do País, como que a assombrá-lo, os conceitos de tristeza, de saudosismo? Guta Moura Guedes não negou: «Temos uma espécie de tristeza, de saudade… so what?», perguntou, em tom provocatório. «Não é uma mancha. É hiper-romântico. A tristeza é um motor de criação tão forte como a alegria», continuou.

«A maior nota de positivismo que pode ser deixada é a de que o mercado deixou de estar circunscrito a si próprio, mas é um mercado global. Sendo daqui, somos de um sítio imenso. Há um esbatimento da geografia física, uma nova geografia digital», referiu a presidente da “Experimenta”, numa afirmação que foi, de certa forma, ao encontro da intervenção de Vítor da Conceição Gonçalves que acredita que a emigração, a par da colaboração com empresas de grande dimensão, além do empreendedorismo, são algumas das razões que os jovens licenciados têm, hoje em dia, para sorrir.

Perseverança e investimento

“Como devolver o brilho a Portugal?” foi o tema do 2º painel da conferência, que contou com a participação de João Roquette (CEO Grupo Esporão), Jorge de Mello (administrador Sovena), Luís Araújo (administrador Grupo Pestana), Rui Paiva (CEO WeDo Technologies) e Mariza (fadista e embaixadora do Fado – Património da Humanidade), em intervenções novamente moderadas por Maria João Vieira Pinto e Álvaro de Mendonça. «Falta uma opinião do mundo em relação a Portugal, o que é compreensível quando nem nós próprios temos uma opinião sobre o País», alertou João Roquette, do Grupo Esporão. Salientando as cartas fortes do País, da gastronomia ao calçado, passando pelo sector vitivinícola, o profissional destacou que, no entanto, Portugal tem de se assumir como «um país pequeno». «Não vale a pena jogar o mesmo jogo que os chineses e os indianos. Temos de colocar alma no que fazemos», apontou.

A falta de reconhecimento internacional não assola apenas o sector nacional dos vinhos. Também o dos azeites tem sentido obstáculos devido à «falta de notoriedade», afirmou Jorge de Mello, administrador do grupo Sovena. Daí que a internacionalização da empresa não se tenha baseado no conceito de portugalidade, confessou. A Sovena decidiu, antes, «focar-se na sua expertise e marcar a diferença», conta. Já a fadista e embaixadora do Fado – Património da Humanidade, Mariza, acredita que a língua portuguesa não é uma «barreira» e que, no caso específico do Fado, «gera uma música tão válida como outra qualquer, em que a língua portuguesa pode ser ouvida e sentida».

Noutros casos o “ser português” «não ajuda absolutamente nada», avançou Rui Paiva, CEO da WeDo Technologies, que destacou que, uma vez que Portugal não é visto como um país tecnológico, a origem acabou por «dificultar» trabalhos. Daí que, no caso da empresa que lidera, «a qualidade seja colocada à frente da portugalidade». Discordando de algumas das intervenções do 1º painel, Rui Paiva advogou mesmo que os portugueses «são muito bons executores» mas «muito maus organizadores».

Opinião partilhada por João Roquette, que aproveitou para defender que deve ser levado a cabo «um trabalho de alinhamento e colaboração entre sectores, que deve ser estendido a todas as fileiras».

«O que para nós é importante transmitir é a hospitalidade portuguesa, que é um dos trunfos que temos» afirmou, por seu lado, Luís Araújo, administrador do Grupo Pestana, ou não fosse o turismo – sector que se baseia, precisamente, na arte de “bem receber” – a sua área de actuação.

«Podemos devolver o brilho a Portugal se formos melhores a fazer pelo mundo. É bom para Portugal se os melhores portugueses emigrarem, porque eles são melhores embaixadores lá do que cá», defendeu o CEO da WeDo.

No fundo, completou Mariza, «o desconhecimento de nós próprios é um grande obstáculo. Temos de conhecer a nossa história, a nossa cultura, e a partir daí tudo é possível».

Partindo de alguns dos pontos debatidos no primeiro painel, no segundo foi destacada a necessidade de foco por parte das empresas, e da criação de ligações com outras companhias e culturas.

Numa conversa que acabou por se estender à plateia, discutiu-se no palco o papel da AICEP – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal na promoção de Portugal e dos seus produtos, e na atracção do investimento estrangeiro para o País. A este nível, foram apontadas algumas falhas, que se prendem sobretudo com a generalização das estratégias de promoção.

«Promover o todo não é nada», criticou Rui Paiva. «O País deve promover os seus produtos diferenciadores. Devíamos ter promotores especializados.»

Já Luís Araújo, do grupo Pestana, reconhece os obstáculos inerentes à versatilidade dos agentes. Ainda assim, continuou, «tudo o que seja vender o País e trazer pessoas ao País é motivo para sorrir, seja low-cost ou não. Temos é de saber vender coisas a quem cá vem».

Ponto assente é que a qualidade é um dos activos que Portugal deve transmitir fora de portas, e um dos motivos que lhe dá “brilho”.

A perseverança, o pegar nas bagagens e o investir em nós foram alguns dos caminhos apontados, desta feita pela fadista Mariza, em jeito de fecho de mais uma conferência assinada pela Marketeer.

Texto de Daniela Domingos

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