Já não é preciso fila de espera: Ajitama tem novo templo do ramen em Lisboa

Ajitama. Mesmo que não esteja muito atento ao panorama gastronómico nacional, o mais provável é já ter lido ou ouvido acerca deste restaurante dedicado ao prato mais consumido no Japão, o ramen (não, não é o sushi). Não só porque foi um dos primeiros a abrir em território nacional, mas também pela incomum história deste projecto que começou como um clube exclusivo na casa de um dos fundadores e que entretanto chegou a ter milhares de pessoas em fila de espera. Mas já lá vamos.

Depois do primeiro Ajitama Ramen Bistro, inaugurado em 2019 na Av. Duque de Loulé, em Lisboa, recentemente o projecto cresceu para um segundo espaço na capital, desta feita na Rua do Alecrim, 47A. E se o primeiro é descrito como o “templo do ovo”, o novo espaço é apresentado pelos sócios António Carvalhão e João Azevedo Ferreira como o “templo do noodle”, em homenagem a esta massa que é originária da China, mas que os japoneses transformaram num best-seller mundial. E que aqui se tenta reproduzir da forma mais autêntica possível, até porque, se até agora os noodles eram importados do Japão, passaram também a ser feitos de forma artesanal no restaurante. Por isso, quando nos fizeram o convite, não podíamos recusar – mesmo, e deixamos já o disclamer, sendo iniciantes no que toca ao ramen.

Começámos a refeição por experimentar uma oferta variada de entradas, com destaque para uma novidade, os Padron Togorasgi (pimentos padrón confeccionados ao estilo nipónico), mas também alguns clássicos da casa, como o Supaishi Ajitama (ovo Ajitama com picante caseiro), o Nasu Dengaku (beringela no forno com miso) ou as Gyozas (dumplings de frango ou vegetais). Qualquer uma destas propostas serve como um bom aperitivo para a refeição, mas se tivéssemos de escolher apenas um, sugeríamos o Supaishi Ajitama, cuja descrição pode assustar os mais intolerantes ao picante, mas que na verdade atinge o delicado equilíbrio entre o doce e a acidez do picante.

Como prato principal, decidimo-nos pela especialidade da casa, o Hakata Tonkotsu, cujo caldo à base de porco é dos mais complexos de todo o menu, precisando de pelo menos 18 horas ao lume para atingir o sabor, cor e densidade desejadas. O resultado é um caldo de sabor intenso – prove-o com a colher de madeira, antes de explorar o resto do prato – sem ser demasiado gorduroso, que liga na perfeição todos os elementos (barriga de porco, ovo Ajitama, negi e cogumelos pretos Kikurage) e torna o prato tudo menos monótono. Destaque ainda para a barriga de porco (a proteína que está presente em todos os pratos não vegetarianos), cuja cozedura no ponto certo permite obter uma textura inesperada (num bom sentido), que facilita a ingestão da parte da gordura. Em suma, um prato de conforto que aconchega o estômago e a alma, em especial nos dias mais frios.

O menu do Ajitama contempla, no entanto, ramens para todos os gostos e com diferentes níveis de intensidade de sabor, desde o Shoyu – com caldo de galinha, mais claro e translúcido, ideal para os iniciantes no ramen – ao novíssimo Kashunattsu Tantanmen – o mais picante de todo menu, com uma base de caldo Pai Tan e sementes de sésamo torrada –, passando pelas propostas vegetarianas e até por outros pratos que vão “Além do Ramen”. O ideal, para quem não está habituado a esta iguaria nipónica, será começar pelos caldos mais simples e ir evoluindo gradualmente para os sabores mais complexos, em visitas futuras.

Para terminar, como sobremesa, experimentámos algumas variedades de Mochi, as bolinhas asiáticas que se têm tornado cada vez mais populares no mundo ocidental, e que, ao contrário do que pode encontrar noutros sítios, não são nem demasiado doces nem demasiado viscosas, o que é um ponto muito positivo; um bolo de matcha com chocolate, que convence mesmo quem, como é o nosso caso, ainda não se rendeu à matcha; e uma tarte de abóbora Hokkaido que, na nossa opinião, é a estrela da companhia, quer em termos de sabor quer de textura.

Nas bebidas, além da carta de vinhos bem portugueses, refrigerantes, sakes e cervejas (incluindo marcas japonesas), destacam-se os cocktails de assinatura do Ajitama. Provámos o Shiro Budo Gin, uma combinação refrescante de gin com Vinho do Porto branco que se revelou um complemento perfeito para apaziguar os sabores mais salgados ou picantes do menu.

Viajar ao Japão sem sair de Lisboa

«Queremos servir como um gateway para o Japão. Queremos que as pessoas entrem no Japão, mesmo estando em Lisboa». É desta forma que António Carvalhão e João Azevedo Ferreira resumem o projecto Ajitama.

E a verdade é que, a partir do momento em que pomos o pé dentro do Ajitama na Rua do Alecrim, somos levados para uma viagem pela cultura e pelos sabores japoneses. O cheiro dos caldos infunde-se pelo espaço, abre o apetite e vai-nos conduzindo pelas diferentes salas do restaurante, cujos nomes são inspirados em cidades nipónicas – Tokyo, Okinawa, Osaka, Sapporo e Kyoto – e que estão ligadas por uma estrutura de madeira composta por nada menos do que 267 peças que criam um efeito ondular e a ideia de movimento.

Num dos corredores, há toda uma parede decorada com placas de madeira Ema, idênticas às que podem ser vistas nos templos e santuários japoneses, e que aqui foram ilustradas por clientes do Ajitama com os seus desejos ou mensagens. Nas casas de banho, há sanitas inteligentes importadas directamente do Japão – e um manual de instruções que explica como funcionam – e até um aúdio que replica os sons da estações de comboio por onde passam os bullet trains, os comboios nipónicos de alta velocidade.

Já à mesa, e antes antes de consultar o menu, somos surpreendidos com uma consola portátil retro que replica os antigos sistemas de entretenimento da Atari – e que permite jogar alguns clássicos em 2D! De facto, cada elemento decorativo no Ajitama é feito para nos transportar à Terra do Sol Nascente.

Do Supper Club aos restaurantes

O Ajitama Ramen Bistro é o sonho tornado realidade de dois portugueses apaixonados pelo Japão e pela cultura nipónica. António Carvalhão, formado em Gestão, e João Azevedo Ferreira, em Economia, viveram ambos na Ásia, onde ficaram rendidos ao ramen. De regresso a Portugal, não conseguiam encontrar restaurantes dedicados a ramen. «Não percebíamos porquê, até que descobrimos que é muito complexo de confeccionar», recordam.

Em 2015, decidem pôr as mãos na massa e começar a produzir o seu próprio ramen, com base nas suas experiências passadas e em toda a informação que conseguiam encontrar. Passariam os 13 meses seguintes a aperfeiçoar a receita, temperos, técnica, tempos de cozedura, até que chegaram a uma receita que lhes fazia lembrar os pratos que comiam no Japão.

Em 2017, decidem começar a fazer ramen para amigos e familiares na casa de António, abrindo o que ficaria conhecido como o Supper Club. Com o passar do tempo, o conceito foi ficando conhecido para além do círculo de amigos e começaram a receber pedidos através das redes sociais de pessoas que queriam participar nestes jantares ao sábado à noite. O projecto começou a ganhar escala e quando deram por isso já tinham fila de espera.

Em 2019, e já depois de terem voltado ao Japão para ter formação com um dos principais mestres de ramen (Takeshi Koitani), abriram o primeiro Ajitama Ramen Bistro, que recebeu primeiro pessoas que estavam em lista de espera desde os tempos do Supper Club. O sucesso não se fez esperar: o restaurante, que foi pensado para servir 60 refeições num dia, chega hoje a servir 350 refeições/dia aos fins-de-semana.

Em Dezembro de 2021, em plena pandemia, iniciaram os planos para a abertura do segundo restaurante Ajitama, que haveria de ver a luz do dia cerca de um ano depois, numa localização que pretende servir também os turistas (que não passam na Av. Duque de Loulé) e as pessoas que vão sair para a noite lisboeta. Numa espécie de soft opening, o Ajitama na Rua do Alecrim, começou, ainda assim, por servir os seguidores de longa data do projecto, nomeadamente 856 pessoas que ainda estavam em fila de espera.

Texto de Daniel Almeida

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