«Há muito mais riqueza no Mundo. As pessoas querem comprar coisas melhores e das suas marcas favoritas»

A crise está a instalar-se uma vez mais no panorama macroeconómico e as marcas preparam-se para uma nova realidade depois da pandemia e de uma guerra na Europa. Contudo, nunca o sector do luxo cresceu tanto como agora, com tantas vendas e com tantos consumidores mais jovens e mais fiéis.

O que pode justificar um quadro tão paradoxal quando a inflação alcança as maiores percentagens das últimas décadas e quando um em cada três europeus afirma que não terá dinheiro suficiente para pagar as suas contas de serviços essenciais nos próximos 12 meses? Para Helena Amaral Neto, Luxury executive coordinator no ISEG, a resposta está na própria riqueza acumulada do Mundo.

«Há um aumento do topo da pirâmide de valor, porque há muito mais riqueza no Mundo, que foi criada nos últimos 20 anos. Com esse valor adicional, as pessoas querem comprar coisas melhores e das suas marcas preferidas. As maiores marcas tornaram-se ainda maiores», afirma a coordenadora executiva na mesa-redonda da 19.ª Conferência Marketeer sobre o tema “Um Novo Luxo?”.

A recuperação em “V” do mercado de luxo muito acima do esperado levou a resultados globais que surpreenderam tudo e todos. O sector automóvel não foi excepção a esta procura. No caso da Volvo, representada por Aira de Mello, Consumer Experience & Marketing director da insígnia em Portugal, o cenário não é diferente. Porém, o factor premium e o ser considerada uma marca de luxo entram em acção de forma diferente.

«A Volvo é sueca e a Suécia tem uma forma muito peculiar de olhar para isto. Somos uma marca premium, mas não para ostentar. Para nós o verdadeiro luxo são as pessoas e a sua segurança. O sonho da Volvo é que todos possam estar seguros ao volante de um automóvel, independentemente da marca. Para nós o luxo é ter um interior feito de material reciclado e sermos a única marca automóvel que se multa a si própria por cada tonelada de CO2 que emite.»

Do luxo acessível ao superior

Lâncome, Armani, Yves Saint Laurent, Prada, Ralph Lauren são marcas que grande parte dos consumidores irão reconhecer, mas não associarão à L’Oréal. Fragrâncias, cuidados de pele e maquilhagem são os produtos que o grupo francês trabalha em conjunto com estas insígnias de luxo e que lhe permite manter um equilíbrio no negócio face às instabilidades que o mercado vai sentido.

«É a gestão de portefólio que nos tem permitido superar muito bem as crises, a juntar aos vários sectores em que estamos presentes», explica Nuno Saraiva, Market director da L’Oréal Luxe Portugal. O profissional salienta que o segmento da cosmética de luxo irá crescer 90 mil milhões de euros até 2026, justificado pelos mercados chinês, indiano, árabe e africano que se desenvolvem cada vez mais e procuram novos produtos.

O mercado é também fortemente influenciado pelos consumidores mais jovens, que se estão a tornar uma fatia cada vez maior de um segmento que tem, potencialmente, 500 milhões de clientes – das fragrâncias e cosmética, o chamado luxo acessível, até ao sector automóvel e imobiliário, que é a maior classe de activos do Mundo. A faixa etária dos clientes não é, naturalmente, igual para todos, mas, de acordo com Helena Amaral Neto, um em cada dois clientes dos produtos e serviços pessoais de luxo que vai chegar será de nacionalidade chinesa e abaixo dos 30 anos. «Isto coloca um enorme desafio às marcas, que têm de posicionar e definir o seu target para este cliente. O desafio é manter estes novos clientes interessados nestas marcas para alimentar o crescimento que se prevê.»

Na Europa, a região core da Volvo, a insígnia vê-se alheia a esta tendência, pelo facto de não ser uma marca de ostentação. Aira de Mello revela que há um shift, sim, mas ao contrário: «Uma evolução do consumidor com poder de compra para uma nova forma de estar na vida, na sociedade e no luxo.» O tempo pessoal é muito mais importante do que o status. Neste caso, a Volvo acaba por estar muito bem posicionada com a sua filosofia de marca e que «foi muito pouco sexy durante muitos anos».

Há muito para aprender com o luxo

É no luxo que se percebe se há crise ou não, costuma-se dizer. E embora actualmente este não seja bem o caso, o mercado tem de continuar a trabalhar. Neste sentido, os novos P’s no Marketing da Volvo evoluíram, mas mantêm-se, ainda assim, iguais à sua génese e passam sobretudo pelas pessoas. O objectivo será que as pessoas se identifiquem com a marca e com o automóvel que conduzem, levando a uma “vontade de comprar”.

Já no caso da L’Oréal, é o purpose, ou o propósito, que guiará a estratégia e que definirá o papel do grupo na sociedade. Com tantas marcas sob a sua alçada, uma imagem unânime da L’Oréal pode ser difícil de alcançar. Mas é na responsabilidade ambiental e social que procura ganhar valor nos quatro cantos do Mundo.

Helena Amaral Neto, por seu turno, sugere o “P” de poder, pelo impacto que as marcas, sobretudo as de luxo, têm na vida das pessoas. «A maior parte das marcas são aspiracionais e exemplares nos valores, nas acções que tomam a nível ambiental, social e corporativo. O seu poder vai muito além do que são os seus produtos ou serviços. São exemplos de seguirem e defenderem causas.»

Texto de Beatriz Caetano

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