E depois do algoritmo?

“What is very unique about this new type of data is that it is very behavioural. It is very rich in texture, and gives us a huge opportunity to unlock the strategic insights. As an industry, we have focused more on the tactical application of data, but the data has the richness to be able to drive those strategic and transformational ideas for our clientes.” Slavi Samardzija, global chief executive officer of Annalect – Omnicom Media Group

É sem dúvida maravilhoso, este maravilhoso novo mundo de algoritmos. E isto sem ironia. Talvez uma pontinha de inveja, um saquinho de cinismo e a certeza de que, como se dizia no Jurassic Park, “nature will find a way”. Tão maravilhoso que o CCP decidiu este ano dedicar-lhe o tema do seu XIX Festival, em Maio. A verdade é que no meio de tudo de bom, o entusiasmo tem vindo a distrair muita gente da única coisa que é relevante não perder em tudo o que estamos a substituir – a “informatável” natureza da criação.

E essa distracção estende-se à história, como de costume. No início de todas as “revoluções” tecnológicas, existe uma predominância dos hard skills face aos considerados soft skills, da “máquina” face ao homem. Provavelmente desde a descoberta do fogo. Definitivamente depois de Guttenberg.

Em todas elas, muitos parecem esquecer-se que, uma vez normalizada a inovação, a única coisa que acrescenta valor de forma sustentada ao longo de milénios a qualquer indústria é só uma – a infinita capacidade de termos ideias. Originais.

Esse é um dos problemas do algoritmo. Será a sua perfeição a verdadeira morte do artista? E poderá esta evolução, afinal, ser um eventual retrocesso em direcção a uma sociedade e a um mercado menos livre, menos diverso, e menos capaz de continuar a gerar ideias novas?

O crescente aperfeiçoamento do profiling, do Big Data, do cruzamento de dados, do behavioural tracking, SEO, e todas as outras novas técnicas que nos vão levar a conseguir vender exactamente aquilo que alguém gosta, à hora que ele gosta, podem aparentemente levar-nos também a um progressivo afunilar do que conseguiremos criar e consequentemente vender.

Um loop de condicionamentos de preferências e comportamentos, sem garantias de precisão, que poderá criar um sistema de alimentação de conteúdos que irá tentar replicar aquilo que já foi feito e não aquilo que “é possível que eu queira fazer, mas não sei porque ainda não pensei nisso”.

Um conjunto de novas condicionantes, como anúncios sem som, a multiplicação de touchpoints que exigem especificidade nas execuções, a realidade aumentada e 3D, bots e IA, que poderão mudar radicalmente a forma como contamos uma história. Ou não?

Qual o impacto disto na criatividade? Uma maior padronização, uma sobrevalorização do meio face ao conteúdo, uma maior tendência para privilegiar o funcional face ao envolvimento emocional? O criativo pode ser substituído pelo cruzamento automático de um conjunto infinito de variáveis? O algoritmo sobrepõe-se à criatividade e cria fórmulas? Podemos continuar a deixar a emoção e a razão criativa talhar os caminhos da criatividade? Será o algoritmo a mais óbvia ameaça ao nosso negócio/indústria?

De certeza que também já há um algoritmo com resposta para isso.

Num artigo publicado no “The Guardian”, Sir John Hegarty esclarece-nos que acredita que o amanhã será ainda mais criativo do que hoje, e deixa-nos uma pérola que parece ter sido escrita de propósito para o tema deste ano do XIX Festival do CCP: “It is important to understand that technology creates opportunity, but it’s creativity that creates value”, John Hegarty.

“E depois do algoritmo?” é uma celebração e uma anticelebração. Uma celebração dos novos tempos digitais, do brilhantismo de uma indústria que está a mudar o mundo, mas também um reminder de que não há código que substitua um sorriso. Ainda.

Discutiremos tudo isto entre 17 e 21 de Maio no Convento da Trindade e na ETIC no XIX Festival do CCP.

Mais leitura aqui :
http://mandmglobal.com/creative-tensions-in-cannes-marketing-is-changing-and-not-to-everyones-liking/

https://www.theguardian.com/media-network/2016/mar/11/sir-john-hegarty-future-more-creative-technologynotbig-data-algorithm

https://www.theguardian.com/politics/2017/feb/26/robert-mercer-breitbart-war-on-media-steve-bannon-donaldtrump-nigel-farage

https://www.semetis.com/en/resources/publications/dynamic-creative-optimization-changing-the-focus-of-theadvertising-business-from-creative-master-minds-to-data-algorithms

http://www.thedrum.com/opinion/2016/06/21/creativity-vs-algorithms-adland-and-new-breed-collide-cannes-lions

https://www.theguardian.com/media-network/2015/oct/15/algorithms-destructor-saviour-advertising-agencies

Texto: Pedro Pires

CEO/CCO Solid Dogma
Presidente do CCP

Artigo publicado na edição n.º 248, de Março de 2017, da revista Marketeer.

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