Álvaro Covões: «Não podemos estar à espera que seja o Estado a resolver tudo. Mas tem de nos dar os instrumentos»

Sagres Campo Pequeno. É este o novo nome do espaço de espectáculos no coração das Avenidas Novas de Lisboa e que uniu, uma vez mais, os destinos da Central de Cervejas e de Álvaro Covões, gestor do Campo Pequeno e, também, fundador da Everything is New.

Ao longo da vida o promotor já teve outros projectos que o ligaram à Central de Cervejas de que são exemplo o Palco Heineken, no Nos Alive, e – num passado diferente – o naming sponsor da Sagres no Festival Sudoeste, na primeira edição. «São, talvez dois dos projectos mais marcantes.»

O lançamento oficial do novo naming do Campo Pequeno deu o mote para uma pequena conversa com Álvaro Covões sobre a importância do mecenato. Acompanhe.

Esta parceria com a Sagres será apenas para o Campo Pequeno ou vai estender-se a outros projectos da Everything is New?

O Campo Pequeno é um projecto que nada tem a ver com a Everything is New (EiN). É um projecto próprio que tem uma empresa que é a Plateia Colossal e nada tem a ver com a Everything is New. A EiN é um bom cliente do Sagres Campo Pequeno.

Pessoalmente, há muitos anos, tenho muitos e bons projectos com a Central de Cervejas e mais especificamente com a Cerveja Sagres. É muito importante trazer as empresas e as marcas para investirem mais na cultura porque temos que mudar o País. Temos que inverter esta tendência de sermos o País com os hábitos culturais mais baixos. Portanto é muito importante que as marcas se envolvam com a literatura, com o teatro, com a música, com o ballet… e acima de tudo com aquilo que parece que está em vias de extinção que são as salas de espectáculo.

Pensando bem, acho que nos últimos 50 anos não se construiu uma sala de espectáculos privada em Portugal. Isto quer dizer muito. Porque a cultura não pode ser só pública, tem de ser pública e privada como é em todo o mundo. Temos meia dúzia de teatros na cidade de Lisboa, o Porto tem três ou quatro… além das salas pequeninas. Temos de inverter isso. O melhor apoio que as salas de espectáculo podem ter é o naming das salas. Este é um fenómeno mundial e é isso que tem dado muita força por exemplo no caso de Madrid. As empresas associaram-se muito ao teatro, tem uma lei do Mecenato muito mais favorável do que aqui em Portugal…

O que é que está a ser feito cá, ao nível de lobbying, para mudar a lei do Mecenato?

Em primeiro lugar o sector da Cultura tinha que ter um Ministério que às vezes parece que não tem. Basta olhar para o Orçamento de Estado e perceber que o sector privado não conta para o campeonato. Acho que o desejável era ter uma lei do Mecenato como em Espanha ou como no Brasil. Ontem foi anunciado um bilião de reais na Lei Rouanet no Brasil. O que é a Lei Rouanet? Os políticos gostam muito de falar na vitória do Lula e de parabenizar o Brasil por ter regressado a uma democracia mais democrata… vemos isso escrito em todo o lado. Então copiem a Lei Rouanet. Porque a Lei Rouanet é a possibilidade que as empresas têm de apoiar projectos culturais. Ou seja, uma parte do IRC que seria pago ao Estado é entregue à Cultura. O Estado define o limite anual dessa lei e é também o Estado que, através do Ministério da Cultura, define se os projectos são ou não culturais. Isso permite democracia. Não é o Estado a impor o gosto, mas sim a sociedade civil e as empresas a participarem na oferta cultural.

Em Espanha temos uma lei diferente em que no caso dos espectáculos e das salas, até 20% de cada projecto – no máximo de 500 mil euros – a empresa pode decidir se usa esse dinheiro para pagar ao Estado ou patrocinar um projecto ou vários. No caso do cinema nem existe o limite dos 500 mil euros. O sucesso do cinema espanhol – que não vive do correspondente ao nosso ICA – vive também, obviamente, do mecenato das empresas.

Há muito para fazer em Portugal…

Há. Mas acima de tudo, também tem que ser a sociedade civil. Não podemos estar à espera que seja o Estado e o Ministério da Cultura a resolver tudo. O que eles nos têm de dar são os instrumentos para que nós possamos, enquanto sociedade civil, investir mais na Cultura. O mecenato é fundamental. Não pode ser como com o PRR que é tudo para a Cultura pública. Os teatros e salas de espectáculos privados têm zero do PRR.

Este apoio impacta o preço dos bilhetes para os consumidores?

Não. Ajuda a tornar a sala viável. Por alguma razão não se constroem salas privadas há 50 anos. As salas têm que ter receitas suficientes para cumprir todas as despesas incluindo manutenção e melhoramentos. Portanto ajuda muito a isso. Não influencia no preço dos bilhetes. Isto [Sagres Campo Pequeno] é uma sala de acolhimento. Significa que é uma sala aberta a todos a que apresentem aqui os seus projectos. Acima de tudo tem que ter condições e um preço acessível para que isso seja realizável.

Nós temos um preçário no Sagres Campo Pequeno de aluguer de sala que é proporcional à ocupação da sala. Ou seja, se por acaso o projecto não vender tanto, recebemos menos precisamente para sermos parceiros. Mas precisamos de suporte por trás porque depois não podemos chegar ao fornecedor de electricidade e dizer “este mês só pago uma parte…”

Texto de Maria João Lima

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