A vitamina do sol

Entrevista a Ana Filipa Mourão, Reumatologista no Hospital de Egas Moniz.

Por Sandra M. Pinto

O sol é essencial à vida do ser humano. Fonte de calor, luz e energia, o sol faz bem à saúde

Sabemos que grande parte das vitaminas e minerais são por nós adquiridos através da uma alimentação equilibrada e variada. Mas há uma em especial que o nosso corpo pode fabricar se apanharmos um pouco de sol por dia. Falamos da vitamina D.

Qual a importância do sol?

O sol faz-nos bem e deve ser aproveitado por todos, crianças e adultos. Em geral, as pessoas são mais activas e menos propensas à depressão nos meses de Verão, em que o sol é mais abundante. O sol é de facto essencial na nossa vida. É fonte de calor, luz e energia. Aproveitar o sol faz bem à saúde!

Quais os benefícios que o sol traz para o ser humano?

A exposição ao sol tem muitos benefícios, nomeadamente a produção de vitamina D e a estimulação da produção de algumas hormonas responsáveis pela sensação de bem-estar.

O que é a vitamina D?

A vitamina D, também chamada de calciferol, é um mineral essencial para o organismo humano, já que tem muitas funções em aspectos diferenciados. Além de ser fundamental para a fixação de cálcio nos ossos, níveis adequados de vitamina D aumentam a qualidade de vida, prevenindo doenças cardíacas, diabetes, demência, entre outras. A vitamina D é a única que só é activada por meio da exposição ao sol, ou mais precisamente aos raios ultravioletas do tipo B (UVB), que são responsáveis por 80 a 90% do total de vitamina D que o corpo recebe.

Ela é fornecida só pelo sol?

Não, apesar da principal fonte de produção da vitamina D se realizar através da exposição solar (sendo responsável por 80 a 90% da vitamina que o corpo recebe), alguns alimentos também são fontes de vitamina D.

Em que alimentos podemos encontrar a vitamina D?

Os alimentos mais ricos em vitamina D são o leite, manteiga, óleo de fígado de bacalhau, ovos, salmão cozido, sardinhas enlatadas, ostras cruas, arenque fresco, atum, peixes gordurosos em geral e frutos do mar. Quanto aos vegetais, caso das acelgas e espinafres, a quantidade de vitamina D é mínima.

Falando especificamente das crianças, que benefícios têm elas ao apanhar sol?

A exposição solar nas crianças tem os mesmos benefícios para os ossos que os adultos. Contudo, a saúde dos ossos dos adultos começa na infância. O sol é benéfico, conhecido que é o seu papel na síntese da vitamina D essencial ao crescimento saudável dos ossos. Mas, como referido anteriormente, este é um benefício que se obtém com uma exposição curta, para além da qual são maiores os prejuízos.

Há um fortalecimento dos ossos trazido pelo sol, é isso?

Sim, a exposição solar ajuda-nos à produção de vitamina D, que ajuda a fixar o cálcio nos ossos e é fundamental para o crescimento e manutenção da qualidade dos mesmos.

Qual a dose certa diária de sol e a que horas deverá ser tomada?

Para evitar a carência de vitamina D é importante a exposição solar, 15 a 20 minutos por dia. Braços e pernas devem estar expostos, pois a quantidade de vitamina D que será absorvida é proporcional à quantidade de pele que está exposta. O ideal é haver exposição solar no período antes das 10 horas da manhã. A exposição da criança deve ser feita diariamente, durante cinco a dez minutos, entre as 8 e as 10 horas da manhã e depois das 16 horas. Para a activação da vitamina D ser efectiva, a criança deve apanhar sol directamente na pele, numa área de cerca de 20 cm, sem que a absorção seja filtrada por protectores solares ou pelo vidro da janela. Só precisamos de cerca de 20 minutos por dia ao sol no Verão para garantir que, durante o Inverno, temos níveis suficientes de vitamina D no corpo.

Quais os efeitos da carência de sol?

A vitamina D é necessária para a absorção do cálcio pelos ossos. Pessoas com deficiência de vitamina D chegam a aproveitar 30% menos de cálcio proveniente da dieta. O cálcio é responsável por fortalecer ossos e dentes. A deficiência deste nutriente pode causar o raquitismo na infância e a osteoporose na vida adulta. Os ossos com raquitismo ou com osteoporose partem muito mais facilmente, aumentando a probabilidade das diversas complicações decorrentes das fracturas ósseas.

Temos o hábito de colocar muito protector solar. Há regras para o seu uso?

A criança deve ser exposta ao sol em horas que não sejam perigosas para a pele, idealmente antes das 10 horas da manhã. Utilizar protector solar é muito importante após os 15 a 20 minutos recomendados para obter a vitamina D e em momentos do dia, em que o sol é muito forte, como é o caso do meio-dia, por exemplo.

Podemos afirmar que o protector solar impede os benefícios da vitamina D?

Sim, para existir activação da vitamina D pelo sol, é necessário que seja feita sem utilização de protectores solares. Para se ter uma ideia, o protector com factor de protecção 8 inibe a retenção de vitamina D em 95% e um factor maior do que isso praticamente anula a sua produção. As janelas também atrapalham a absorção da vitamina D, porque os raios ultravioletas do tipo B (UVB), capazes de activar a síntese da vitamina D, não conseguem atravessar os vidros.

De que forma devem os pais actuar de forma a retirarem o melhor dos benefícios do sol, protegendo simultaneamente os seus filhos dos malefícios do astro rei?

No que diz respeito à produção de vitamina D, o principal conselho para as crianças poderem aproveitar o sol com segurança é igual ao dos adultos, que é evitar as horas de maior intensidade de radiação ultravioleta (entre as 11h da manhã e as 16 horas), mas aproveitar o sol nas primeiras horas do dia ou ao fim da tarde.

A mudança de hábitos das nossas crianças veio ajudar à ocorrência desta falha de vitamina D?

Sim, as crianças praticam cada vez menos exercício ao ar livre, o que diminui a taxa de exposição solar e consequente produção de vitamina D. Além disso, os pais chegam com os filhos à praia cada vez mais tarde, o que implica a utilização contínua de protectores solares para protecção do cancro da pele, e, como mencionado, estes filtros solares impedem a activação da vitamina D na pele, impedindo o efeito benéfico do sol no crescimento e manutenção da saúde dos ossos. É imperativo passar mais tempo ao ar livre (com a devida protecção nas horas críticas) e menos em salas de aula o dia inteiro, em casa a jogar videojogos ou a navegar pela internet a tarde toda.

Há a ideia de que só na praia devemos ter cuidados com o chamamos excesso de sol, ou seja, de que o sol só é nocivo na praia. Será mesmo assim?

Não, o sol não queima só na praia. A pele não precisa apenas de protecção contra o sol na praia, durante os meses de Verão, em dias em que o céu está limpo. É importante utilizar protector solar mesmo nos dias mais frescos e nublados. As queimaduras solares devem-se sobretudo à radiação ultravioleta, que é pouco afectada pelas nuvens. Por isso é importante que se proteja sempre quando sai para a rua, na cidade, no campo ou na praia, por períodos prolongados e principalmente nas horas críticas (das 11 da manhã até às 16 horas). A prevenção de cancro de pele deve ser sempre prioritária na atitude dos pais e crianças, e os protectores solares apenas podem ser dispensados nas fases iniciais e finais do dia nas crianças acima dos dois anos.

Quais as doenças e sintomas associados à falta de vitamina D?

As crianças com deficiência de vitamina D podem desenvolver raquitismo, que é uma doença caracterizada por fraqueza e perda óssea: os ossos das crianças ficam finos e podem partir. Além disso, a vitamina D mantém o equilíbrio, evita quedas e dá mais vigor aos músculos.

Que efeitos podem elas ter no médio/ /longo prazo relativamente ao desenvolvimento das crianças?

A falta de vitamina D comporta um elevado risco na saúde óssea, uma vez que dois terços da massa óssea são formados na adolescência. Uma criança com um défice prolongado de vitamina D pode tornar-se num adulto com osteoporose. Existem ainda estudos que demonstram uma associação entre a deficiência de vitamina D e o aumento do risco de doenças crónicas na idade adulta, como as cardiovasculares, cancro, doenças auto-imunes e diabetes tipo 1.

Artigo publicado na revista Kids Marketeer nº4 de Junho de 2018.

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