A paz tem um novo símbolo. Já conhece?

Dois traços que representam um abraço. É este o novo símbolo mundial da paz, desenvolvido pela Associação Give Peace a Voice que, tal como o nome indica, tem como missão dar voz a uma das palavras mais importantes do dicionário. Nuno Olim Marote, fundador desta associação portuguesa, conta à Marketeer como surgiu a ideia – que tem como ponto de partida a missão da associação de mapear a paz através de diferentes formas artísticas – e qual será o alcance do novo símbolo.

Desenhado pela Fuel, parceira deste projecto, o símbolo pretende humanizar a noção de paz. Uma ambição que Nuno Olim Marote considera arrojada, mas necessária.

Por que razão era necessário um novo símbolo mundial da paz?

Não tenho a menor dúvida, estava na altura de repensarmos o símbolo da paz. Mas esse não foi de todo o meu ponto de partida. Foi, aliás, um tema que apareceu enquanto escrevia as primeiras palavras sobre o “the world peace cartography project”, o mapa, a cartografia da paz. Este mapa edificaria um arquivo sem precedentes, inicialmente apenas de cinema (de vários tipos de filmes); actualmente, de todos os meios artísticos “necessários”. A determinada altura, e à medida que íamos avançando, comecei a questionar-me que símbolos da paz “existiam” e quais eram os seus significados. Rapidamente percebi que estavam altamente desactualizados e que em quase nada as suas narrativas se interligavam directamente com a paz.

Noto que a UNESCO refere enquanto missão “construir a paz nas mentes dos homens e das mulheres”. É claramente um acto humano. Percebi que podíamos e, acima de tudo, devíamos, era necessário, “humanizar” o símbolo da paz. Tinha a noção que era uma tarefa difícil e arriscada. Uma enorme responsabilidade. É “complicado” mexermos ou alterar símbolos desta natureza. Considerei que o importante seria que se actualizassem conceitos e se falasse deste tema com um olhar actual, no agora, com tudo o que isso possa significar.

A ideia de propor um novo símbolo da paz é apenas um dos propósitos da associação. A nossa missão global é desenvolver uma nova literacia visual baseada na paz. Isto porque temos actualmente a guerra como modo de ver, é urgente invertermos isso. O símbolo aparece assim durante a concepção do projecto, desta ideia, integrado numa estratégia global.

Sinto-me agora muito orgulhoso que todo este processo tenha acontecido, e em Portugal. Sou português e com esta minha ideia em execução somos pioneiros, líderes mundiais e incontornáveis. Não existe nenhuma organização que se dedique a “tratar” a paz através de todos os meios artísticos necessários, que a queira tornar um tema inspirador, que desafie à criação de uma nova ordem imagética. Que assuma a imagem como uma prática. E que tenha tido a ousadia de (re)pensar a simbologia associada à paz. Orgulho-me de nunca ter desistido. E lembro-me de em todo este meu processo criativo de me identificar com alguns pensamentos e dimensão de Fernando Pessoa: “A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos não é o que vemos, senão o que somos”. Decidi agir, sem nunca hesitar.

Foram testados outros símbolos além do abraço? Como foi este processo?

Sim. Foram desenvolvidas várias propostas que não me disseram absolutamente nada. Não estava confiante, não aprovei. O tempo voava. Qualquer processo criativo tem o seu tempo. No total foram cerca de dezoito meses até à aprovação final e duas grandes agências envolvidas. E muitos pareceres e opiniões de pessoas que de certa forma eram para mim uma referência.

O processo começou em 2015 e acompanhou os timings de desenvolvimento conceptual e estratégico do projecto. Este símbolo seria sempre e apenas uma “cereja no topo do bolo”. Tornou-se o logótipo, a identidade exclusivamente da associação, não do projecto como inicialmente tinha planeado. O do projecto será desenvolvido por uma agência internacional, em Londres.

Iniciámos os registos em Fevereiro de 2017. O abraço, ou melhor, o gesto de abraçar, fechava na perfeição a narrativa. Primeiro porque sempre considerei que uma “boa marca” é aquela que é desenhada para interagir com as pessoas, e vice-versa. A nossa, ao ter como génese um gesto humano, entendi que tinha um potencial gigante. O abraço enquanto o gesto mais poderoso de paz pareceu-me absolutamente genial, muito fácil de se perceber. Altamente inspirador e universal. Há explicações absolutamente extraordinárias sobre este tema pelo Tolentino de Mendonça. É incrível e uma grande referência para mim. Deu-me muita confiança ler as suas palavras sobre o abraço e a arte. Quase que uma validação científica da qualidade intrínseca deste símbolo, enquanto símbolo de paz, diga-se.

Quem assina este novo símbolo?

A Fuel. O desafio foi lançado no final de 2016 ao Miguel Barros, actual presidente do Havas Creative Group, a quem agradeço todo o trabalho pro bono considerado. A direcção criativa foi do Pedro Vilar que, entretanto, assumiu a direcção criativa de uma outra agência em Amesterdão. Tive muita sorte! Foi um privilégio trabalhar com aquela equipa, naquele momento. Revolveram de uma forma brilhante o meu “problema” em pouco mais de três meses.

Foi a segunda empresa a desenhar uma proposta. Estávamos “sem tempo”, precisávamos de avançar. Estava muito ansioso, tinha que dar certo! Arrisquei. Não tinha muito “espaço” para não correr bem.

Quando em Fevereiro de 2017 tivemos a audiência com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, percebemos que precisávamos rapidamente deste logótipo para iniciarmos “um qualquer” processo de registo da marca, da ideia essencialmente. O presidente achou a ideia extraordinária, não propriamente a questão do novo símbolo da paz, que ainda não estava decidido, mas de construirmos um arquivo de cinema, do desafio que seria feito a cineastas de todo o mundo. De tratarmos o tema da paz de uma forma tão única e original, sem precedentes.

Quem irá utilizar este símbolo? Será apenas a associação ou outras entidades/organizações também se juntam?

Este símbolo e a designação “Peace Cartography – Give Peace a Voice” são marca registada a nível europeu. Preocupa-me muito o tema da propriedade intelectual. O registo da marca está em meu nome, cedi a exploração da marca à associação. Tornou-se a nossa imagem de marca, a nossa identidade. A utilização deste símbolo para criação de merchadising e os demais efeitos comerciais estará apenas acessível a quem for cedido a exploração do uso deste símbolo. Neste campo, estamos a desenvolver vários projectos, onde exploramos de forma declarada a estética e a importante narrativa associada ao símbolo. Como marca, situamo-nos como uma verdadeira marca-manifesto. Temos uma “história” brutal para comunicar.

Noutra dimensão, estamos a desenvolver uma espécie de selo que vamos poder “atribuir” a várias organizações e instituições, desde empresas a escolas. Trata-se de pensarmos a paz como elemento central no globalismo. É o futuro. Aliar educação e cultura à paz, o desafio. Estamos muito orgulhosos em termos tido, entretanto, o apoio dos Ministérios da Educação e da Cultura. Em breve poderá ser visto de forma livre este nosso primeiro conteúdo.

De qualquer forma e de um modo informal, não comercial, sublinho, todos vão poder “usar” este símbolo. Assim o espero! Estou já há algum tempo a desenhar (a idealizar) uma “conversa perfeita” sobre este tema do novo símbolo da paz.

É ainda um símbolo que pode ser “reproduzido” com as mãos, edifica uma mensagem gigante. Até esse processo desta descoberta foi incrível. Puro acaso. Já temos vários embaixadores (amigos e pessoas de quem gosto muito) que aceitaram ser as “cobaias” neste ensaio.

Estamos neste momento à procura de parceiros para trabalhar ao nível tecnológico no desenvolvimento de uma app que ao identificar imagens de abraços (fixas ou em movimento) “impulsionem” um símbolo da paz, que será sempre único e irrepetível. Imaginem só, há infinitos modos de abraçar. Nenhum abraço é rigorosamente igual a um outro. Podemos ainda associar a este símbolo e à sua narrativa outros tantos algoritmos que nos ajudem a passar a nossa mensagem. Vamos desenvolver projectos artísticos a partir da dinâmica do símbolo. Queremos com isto massificar a discussão “o que é a paz? “, tornar a paz um trending topic.

Como tem sido a reacção ao novo símbolo?

Talvez seja a pergunta mais difícil. Há quem goste, há quem não goste. E quando algumas pessoas me dizem que não gostam do verde que utilizei, está quase tudo dito. Usámos o verde por nenhuma razão em especial. Vamos alterar isso agora em Setembro com a apresentação do novo site, talvez a preto e branco, bilingue, inglês e português. Este símbolo tem em si todas as línguas e todos os dialectos. E trata zero o tema da cor e do tamanho. Todas as cores serão possíveis e bem-vindas para “colorir” este símbolo. Tamanhos, idem.

Texto de Filipa Almeida

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